O professor Breno Ferreira Martins Vasconcelos, que leciona na graduação em Direito do Insper, além de ser pesquisador do Núcleo de Tributação, foi escolhido como representante do ensino superior da Rede Nacional de Tratamento Adequado da Alta Litigiosidade do Contencioso Tributário. A participação e a parceria se dão por meio do Núcleo de Tributação, liderado pela professora Vanessa Canado.
A Rede Nacional, instituída pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tem como propósito trazer soluções que evitem o alto volume de judicialização observado na esfera tributária. Para isso, o grupo promoverá, entre outras ações, a cooperação entre os ambientes tributários administrativo e judicial para que sejam aplicadas, de forma uniforme, a legislação tributária, a observância aos precedentes em matéria tributária e a solução adequada de conflitos tributários. Além disso, vai propor protocolos institucionais para intercâmbio de informações, de provas e diligências e de ações de assistência e orientação aos contribuintes, priorizando a transparência ativa e a cooperação nas relações tributárias.
“Já fizemos em março a primeira reunião, que foi presencial na sede do CNJ em Brasília. Cada um dos nomeados se apresentou e deu alguma sugestão. Minha proposta foi que todos da Rede tivessem conhecimento dos dados empíricos e achados do Diagnóstico do Contencioso Judicial Tributário Brasileiro, elaborado pelo Insper em parceria com o CNJ”, destaca Breno. Esse estudo, publicado em 2022, trouxe recomendações para que os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário combatam a alta litigiosidade tributária.
“Depois de entregarmos para o CNJ esse diagnóstico, que, com auxílio da inteligência artificial, analisou mais de 750 milhões de decisões judiciais e mais de 70 perguntas de pesquisa relativas a 12 grandes hipóteses sobre a formação do contencioso tributário, o Conselho Nacional de Justiça criou a Rede Nacional de Tratamento Adequado da Alta Litigiosidade do Contencioso Tributário, o que demonstra que essa iniciativa está intrinsecamente ligada ao estudo desenvolvido pelo Insper”, completa. Na mesma época foi instituída uma Comissão de Juristas, no Senado Federal, com o objetivo de elaborar anteprojetos de proposições legislativas para modernizar o processo tributário.
No total, a Rede conta com 26 integrantes, sendo dois da sociedade civil — um representante do Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e outro das instituições de ensino superior (vaga ocupada pelo Breno). “Os 24 integrantes que não são da sociedade civil formam o sistema de justiça tributária brasileira, bem como representam as administrações tributárias dos entes federativos”, diz o professor. Isso demonstra, na avaliação dele, o comprometimento da Justiça e da administração tributária para diminuir os conflitos entre os contribuintes e o Fisco.
“Faz parte desse processo a integração do contencioso administrativo e judicial tributário porque eles caminham hoje quase de forma independente, sem diálogo, com os julgadores do administrativo raramente observando em suas decisões os precedentes em matéria judicial”, observa Breno. Outra necessidade premente é priorizar a orientação aos contribuintes por meio da transparência ativa, permitindo assim que saibam ao certo a interpretação dada pela administração tributária à legislação. “Atualmente, os contribuintes precisam solicitar essa interpretação, o que é demorado, fazendo com que eles fiquem sujeitos a autuações fiscais nesse período em que aguardam o retorno. Isso gera insegurança jurídica”, explica.
Essas situações foram relatadas pelo diagnóstico produzido pelo Insper. “Muitos dos motivos que explicam o contencioso judicial estão antes do processo judicial. Temos um enorme contencioso, não apenas em razão de problemas no processo judicial, mas porque está havendo falha anterior ao Judiciário e que, se corrigidas, podem evitá-lo”, diz. Nesse contexto, é relevante investir na racionalização e na simplificação da legislação tributária, em instrumentos de resolução de conflitos extrajudicialmente e na governança tributária (como reestruturação dos processos de elaboração, aplicação e interpretação das normas).
Na primeira reunião realizada pela Rede, alguns dos seus membros, incluindo o professor Breno, manifestaram preocupação com as questões que surgirão a partir do próximo ano, que marca o começo da implementação da reforma dos tributos indiretos. “Da forma como estamos hoje, de acordo com a emenda constitucional e a legislação complementar da reforma, não é possível operacionalizar no Poder Judiciário discussões judiciais sobre cobrança do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). Isso porque não temos ainda um rito processual previsto para resolver questionamentos ligados a esses dois tributos. Como a reforma faz alterações nas competências tributárias dos entes federativos, há inquietação quanto à estrutura do Judiciário para acolher essas demandas”, explica.
Segundo o professor, no sistema atual, o Brasil tributa na origem, na produção, mas, com a reforma, passará a tributar no destino. No sistema de hoje, se uma empresa quiser discutir tema tributário, ajuíza ação no local onde está. Se estiver em São Paulo, ajuíza na cidade de São Paulo, por exemplo. Com a cobrança no destino, as empresas precisariam ajuizar ação em cada local onde houver a venda para o consumidor final, por exemplo. “Isso criaria uma situação muito complicada e custosa para as empresas, dificultando seu direito constitucional de acesso à Justiça”, afirma. “O foco da Rede vai ser sobre os problemas atuais, mas acredito que também vamos nos debruçar sobre a possível formação futura de contencioso sob a ótica da reforma tributária.”