19/12/2014
A disparada do dólar justamente em uma época na qual muitos se preparam para viajar para fora acendeu uma luz de alerta nos turistas brasileiros com planos de visitar outros países. Qual a melhor estratégia para comprar moeda americana e se proteger da oscilação?
Quem vai viajar nas próximas semanas e ainda não comprou dólares ou euros a única saída é adquirir a divisa o quanto antes. “No curto prazo é praticamente impossível prever se o dólar vai subir ou descer”, afirma o professor da escola de economia da FGVem São Paulo (EESP-FGV), Bernardo Guimarães.
No médio e longo prazos, entretanto, especialistas apontam três opções como as melhores estratégias: comprar papel moeda ou fazer recargas em cartões pré-pagos mensalmente, aplicar em fundos cambiais ou enviar recursos para o exterior, possibilidade válida apenas para quem tem conta nos Estados Unidos ou em outra nação estrangeira.
A volatilidade em 2014 se acentuou no último trimestre, após um período de calmaria. Ao longo de dois terços do ano, o dólar oscilou muito pouco. O real se segurou no patamar de R$ 2,20 de abril a setembro. Com o acirramento das tensões eleitorais um mês antes do primeiro turno a divisa americana passou a subir com força.
Após as eleições, a volatilidade continuou por conta do aumento da aversão ao risco por parte de investidores estrangeiros, alimentada pela queda dos preços internacionais do petróleo e a desvalorização acentuada do rublo russo. A instabilidade no exterior colocou ainda mais calor na panela de pressão cambial em dezembro. Resultado: na terça-feira (16) a cotação comercial da moeda americana ultrapassou a barreira dos R$ 2,70 e, com isso, acumula uma valorização de 6,38% em apenas 16 dias no último mês do ano. Em 2014, a alta alcança 16% até 16 de dezembro.
Essa forte variação do dólar significa na prática que, em reais, a viagem aos EUA ficou automaticamente 6,38% mais cara em apenas duas semanas. Mas o impacto da subida das cotações é ainda maior se for comparados os períodos de férias no meio e no fim do ano. Desde julho, quando a cotação da divisa americana se mantinha no patamar de R$ 2,20, para cá, o custo, em moeda brasileira, de uma viagem aos Estados Unidos subiu mais de 20%.
Para se proteger dessa oscilação e da imprevisibilidade do câmbio, o viajante tem de planejar minuciosamente a compra da divisa estrangeira. Para a diretora de operações da corretora Graco, Carolina Gomes, comprar dólar aos poucos é sempre a melhor opção. “Se você compra de maneira fracionada, com parcelas distribuídas ao longo dos meses até o momento de embarcar, vai conseguir uma taxa média de câmbio muito interessante”, afirma.
Conforme Carolina, a estratégia permite também ajustes durante o período de aquisição da moeda estrangeira. “A pessoa pode comprar mais ou menos divisas de acordo com as janelas de oportunidade, se a cotação for favorável ou haver a perspectiva clara de uma melhora”, explica.
A especialista acrescenta que o viajante pode negociar descontos para obter uma cotação melhor. “Dependendo do volume de aquisição, o comprador, em geral, consegue barganhar um desconto de cerca de 2 centavos, mas que pode chegar até a 4 centavos por dólar para compras acima de US$ 2 mil”, explica a diretora da Graco.
Além de pechinchar, é importante que o viajante pesquise as melhores taxas de conversão. As cotações variam consideravelmente de uma instituição para outra, como mostra o ranking do Banco Central de valor efetivo total (VET) para negociações de câmbio. Em outubro, o VET, que inclui taxa de câmbio, tarifas e tributos incidentes sobre a operação, variou de R$ 2,47 a R$ 2,68 por dólar para compras na faixa de US$ 500 a US$ 1 mil em 94 corretoras pesquisadas, ou seja, uma diferença de 8,5% entre a maior e a menor. Quando se consideram volumes maiores de negociação, na faixa de US$ 3 mil a US$ 10 mil, as cotações caem para uma mínima de R$ 2,40 e uma máxima de R$ 2,60, segundo o BC.
A variação ocorre porque a taxa usada pelas corretoras e bancos na conversão de reais em moeda americana é o chamado dólar turismo, que embute um “spread” – margem de ganho da instituição vendedora – em relação à cotação comercial. Essa diferença aumenta ou diminui conforme a demanda pela moeda. “Perto da alta temporada, o spread tende a ser mais cheio”, confirma Carolina, da Graco.
No acumulado do ano, o dólar turismo mostra spread médio em elevação. Enquanto o dólar comercial apresenta valorização de 16% até 16 de dezembro, cotado a R$ 2,73, o turismo alcança 19% no mesmo período, a R$ 2,94. Nesse patamar, o custo a mais para os viajantes em relação à taxa oficial alcança 7,69%. Em 2014, o menor spread ocorreu no fim de junho, quando caiu para 2,7%, segundo a diretora da Graco, em um momento no qual o mercado estava quase parado às vésperas da Copa do Mundo.
Após pesquisar as melhores taxas e negociar descontos, o viajante pode fazer as compras periódicas em papel moeda ou por meio de recargas em cartões pré-pagos internacionais. O dinheiro físico conta com uma vantagem tributária sobre o cartão: na aquisição de moeda estrangeira em espécie há a incidência de uma alíquota de 0,38% do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), ante 6,38% que recaem sobre pré-pagos e valores gastos em cartões de crédito. Como riscos, guardar dinheiro físico expõe o dono a perda ou roubo. Os cartões, embora também possam ser extraviados, são substituídos sem a perda dos valores poupados.
Na experiência do diretor de vendas da agência de intercâmbio CI, Jan Wrede, mesmo para quem já tem o dinheiro para a compra dos dólares necessários, mas conta com um horizonte de alguns meses antes da viagem, ainda vale a estratégia de compras mensais ou quinzenais. “Prever câmbio é um exercício de futurologia em geral frustrante. Por isso, aquirir a moeda estrangeira aos poucos ajuda a diluir o risco e ter um câmbio mais equilibrado até a data da viagem”, afirma. Segundo o especialista, a pessoa pode deixar o valor investido em uma aplicação de liquidez diária e sacar as parcelas conforme sua programação.
O diretor da CI lembra ainda que é preciso verificar se o custo em dólar da viagem cabe no orçamento. Segundo Wreder, é importante manter em reais os gastos que puderem ser feitos. “Embora seja um custo medido em dólares, muitas agências oferecem passagens aéreas com parcelamento em reais”, exemplifica.
O professor de finanças do Insper, Michel Viritato, também vê a aquisição parcelada de divisa estrangeira como a melhor estratégia para viagens no médio e longo prazos. “Não vale a pena apostar em qualquer movimento do dólar“, afirma. Viriato ressalta que o principal objetivo do turista em relação ao câmbio deve ser sempre procurar se proteger contra altas e não “se martirizar” em busca de ganhos com a variação da moeda. “Para turistas, não compensa de forma alguma operar o câmbio. O ganho é pequeno frente ao estresse. Por exemplo, se o dólar variar 3% são apenas R$ 90 sobre US$ 3 mil“, calcula.
De acordo com Viriato, o mesmo princípio de não apostar ou tentar operar o câmbio se aplica aos gastos no exterior com cartão de crédito. “Não vale a pena deixar para comprar com cartão de crédito lá fora porque não dá para prever se o dólar vai subir ou cair. O risco é muito alto“, alerta.
Como alternativa às compras mensais, Viriato cita a remessa de valores ao exterior. Mas só aqueles com contas bancárias abertas em instituições financeiras lá fora podem usufruir desse benefício. A taxa de conversão, em geral, é mais vantajosa nesse caso. “Quando se compra moeda para remessa ao exterior normalmente paga-se o valor do dólar comercial [mais barato que a cotação turismo]. E mesmo com as tarifas da operação, o valor efetivo total é melhor que o da compra direta ou recarga de cartões“, explica. Outra vantagem: o IOF nessa opção é o mesmo da aquisição de papel moeda, de 0,38%.
Uma outra possibilidade de se precaver ante a oscilação da moeda é o fundo cambial, aponta Bernardo Guimarães, da FGV. “O fundo cambial, além de proteger das variações [da moeda], tem um ganho de juro que é pequeno, mas é certo”, explica. O ganho com juro ocorre, porque as carteiras atreladas às moedas estrangeiras não investem diretamente em divisa, mas em cupom cambial e outros derivativos, como swap. Na avaliação de Guimarães, como “a taxa de juros do Brasil é relativamente alta então [o fundo] consegue uma taxa melhor de juros em dólar. Para a viagem no médio prazo é o instrumento ideal”.
O turista, no entanto, tem de estar atento aos custos dos fundos cambiais, considera Viriato, do Insper. Além da taxa de administração, há imposto de renda, que varia de 22,5% a 15% sobre o ganho de capital. Se houver alta da moeda estrangeira, os descontos vão diminuir o retorno líquido.
Fonte: Valor Econômico – 18/12/2014