03/12/2014
O consumidor que compra a prazo, na maioria das vezes, não tem meios para saber o percentual de juros que está pagando pelas mercadorias que adquire. Até porque não basta conhecer aritmética. O cálculo requer uma máquina moderna para computar juros sobre juros a cada mês e, pelo menos, algum conhecimento de matemática financeira. Só para ilustrar, 3% ao mês não correspondem a 36% ao ano (3 vezes 12) e sim a 42,58%. Da mesma forma, uma taxa de 10% mensais equivalem a 213,84% em 12 meses. Para auxiliar o leitor, o Correio publica nesta edição, com exclusividade, uma tabela concebida pelo site Vida Econômica (www.vidaeconomica.com.br), que mostra passo a passo, de forma fácil e objetiva, como apurar a taxa de juros nos financiamentos. Verifique os anúncios das promoções e preste atenção se as contas estão corretas para não ser enganado.
É importante destacar que dinheiro fácil é caro, lembrou Miguel Ribeiro Oliveira, vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). Quanto menor for o número de parcelas, menores os juros cobrados. Isso significa que, se um artigo está anunciado por determinado valor, em 10 prestações, por exemplo, e você deu uma entrada, o restante a pagar tem, obrigatoriamente, que ficar mais barato.
No exemplo de uma tevê de R$ 874,00, compra em 12 vezes de R$ 99,90, sem entrada, os juros embutidos, conforme o exemplo abaixo, são de 5% ao mês. Porém, se o consumidor fizer um pagamento inicial de R$ 99,90, as parcelas seguintes caem para R$ 94,93, uma economia de R$ 4,97 por mês ou de R$ 54,67, se consideradas as 11 prestações a vencer. Caso as parcelas continuem em R$ 99,90, o comprador estará arcando, na verdade, com juros muito mais altos, de 6,5% mensais.
Normalmente, quando vai às compras, as pessoas querem saber apenas se o valor da prestação cabe no bolso. É uma estratégia perigosa, que pode fazer você perder dinheiro. A doméstica Luzia de Souza Miranda, 37 anos, que ganha R$ 1 mil por mês, admite que compra por impulso. Recentemente, saiu do shopping com três edredons, que serão pagos em três parcelas— sem entrada—de R$ 39,90, sendo que já tem dois outros compromissos mensais anteriores a pagar, que perfazem R$ 100. “Não tenho dinheiro. Mas vejo e quero comprar. A única análise que fiz foi a do desconto. Já vi esses artigos, na mesma loja, por R$ 69,90. Então, estou pagando menos R$ 30 em cada um”, afirma Luzia.
Nilcéia Alves, 25 anos, secretária, disse que costuma comprar à vista. Não resistiu, no entanto, a um belo grill de R$ 210 em duas parcelas. “Eu multiplico as prestações pela quantidade de meses que tenho a pagar. Se sobra alguma coisa, deduzo que são os juros”, explicou.
Já o casal Ianni Nunes, 18 anos, secretária, e Wemerson Dias, 20, garçom, desconfia de tudo e pechincha muito. “Estamos aqui discutindo se compramos ou não uma sandália”, disse ela, quando abordada à frente de uma loja de calçados. “Não podemos nos empolgar.”. A cautela, afirmam, é porque já sabem que, se compram a longo prazo, estão levando um produto, mas podem até pagar por dois. “O pior é que o vendedor não explica e a gente também não pergunta quais são as condições. Quando vemos o contrato, depois, é que constatamos o tamanho do rombo. Aí, não adianta chorar, já está feito”, diz Ianni.
Atenção
Quem compra à vista sem desconto está perdendo dinheiro. O alerta é do educador financeiro Reinaldo Domingos. Ele destaca que é fundamental negociar o preço com o comerciante. “Não existe milagre. O que existe é cálculo. Quando a compra é por meio de cartão de crédito, por exemplo, o custo para o vendedor, que só vai receber em 30 dias, é de pelo menos 3%. E isso já está embutido naquele valor que ele diz que é o mesmo à vista ou a prazo”, explica Domingos.
O ideal é o consumidor fazer uma pesquisa detalhada nos concorrentes e até no site da empresa, aponta Ricardo Humberto Rocha, professor do Insper – Instituto de Ensino e Pesquisa. “Veja o preço médio e nunca aceite menos de 5% de desconto. E, se disserem que é o mesmo valor à vista e a prazo, não acredite. Pergunte a você mesmo: em um país com juros básicos de 11,25%ao ano, alguém emprestaria dinheiro a uma pessoa que não conhece para receber bem depois, sem esse percentual embutido? Então, por que dariam um benefício tão grande a você? A grande questão, que precisa ser destacada, é que o brasileiro ainda tem vergonha de negociar preço”, provoca Rocha.
Poupança
Reduzir a ansiedade e poupar para não precisar lançar mão do dinheiro alheio também é uma boa alternativa, indica Miguel Ribeiro Oliveira, da Anefac. Ele defende seu ponto de vista com alguns exemplos. Por uma geladeira de R$ 1,5 mil, financiada em 12 meses, explica Oliveira, o consumidor pagaria R$ 164,50 mensais, ou um total de R$ 1.974,00. “Se guardasse os R$ 164,50 todo mês na poupança, em 9 meses ele teria o suficiente para comprar a geladeira à vista, evitando pagar mais três parcelas”, destaca Oliveira.
Se o financiamento fosse de 24 meses, as prestações seriam de R$ 103,48 (total de R$ 2.483,52). Coma poupança, teria o valor necessário em 14 meses, livrando-se de 10 parcelas. Num plano de 36 mensalidades de R$ 84,91 (R$ 3.056,76 no total), o consumidor compraria uma geladeira e pagaria duas. “Colocando R$ 84,91 por mês na poupança, a pessoa teria o valor total em 17 meses, economizando 19 desembolsos”, alertou o vice-presidente da Anefac.
Quando se trata de um automóvel, um bem de maior valor, as diferenças são ainda mais gritantes. “Quanto mais extenso o prazo do financiamento, menor será a parcela mensal a pagar. Normalmente é assim que o consumidor decide. O que ele não percebe, porém, é que, desse modo, a compra, na verdade, ficará mais cara, uma vez que o valor de juros embutido é muito elevado”, lembra Oliveira.
Preço dobrado
Para facilitar o entendimento, o economista tomou como exemplo um veículo de R$ 30 mil e fez cálculos para prazos de financiamento de 12 a 72 meses, usando a mesma taxa de juros, de 1,8% ao mês. “Normalmente, os bancos cobram taxas mais elevadas conforme o prazo aumenta, já que o risco da operação também cresce”, ressalvou Oliveira. “Ou seja, na vida real, o carro fica bem mais caro do que em nossa simulação.”
Pelas contas de Oliveira, se o automóvel for financiado em 12 meses, o consumidor pagará um valor mensal de R$ 2.802,06, ou R$ 33.624,72 no fim de um ano. Todavia, se guardasse os R$ 2.802,06 todo mês na poupança, em 10 meses teria o montante necessário para comprar o carro.
Num crédito de 24 meses, as mensalidades seriam de R$ 1.550,43 (R$ 37.210,32 no total). Usando a poupança, seria possível acumular o dinheiro necessário em 18 meses, quitar o carro à vista e deixar 6 parcelas de lado.
Se o plano for de 36 meses, a prestação fica em R$ 1.139,51, e o carro sai por R$ 41.022,36. Com a aplicação, seria possível liquidar a conta em 24 meses. Diante de um financiamento em 72 meses, com parcelas de R$ 746,68 (R$ 53.760,96 no total), é melhor guardar o valor mensal por 36 meses e fazer a compra à vista. “Do contrário, pagam-se dois carros para levar apenas um”, lembra Oliveira.
Fonte: Correio Braziliense – 30/11/2014