01/09/2022
Curso ensina os negociadores a analisar os termos já combinados para chegar ao chamado “pós-acordo”. O objetivo é evitar perda de dinheiro para ambas as partes
Bruno Toranzo
A expressão “arte de negociar” é muito utilizada em artigos a respeito, mas se engana quem pensa que uma boa negociação se resume a talento. Há habilidades específicas que podem ser desenvolvidas com base em metodologias testadas pela ciência. No curso de curta duração Negociação: Razão e Emoção, oferecido pelo Insper, o professor Predrag Pancevski aborda as técnicas mais modernas, entre elas a PSS (Post-Settlement Settlement, ou, em português, Acordo do Pós-Acordo), para que os negociadores fechem, de fato, o melhor acordo possível para ambas as partes. As inscrições no curso podem ser feitas até 16 de setembro. As aulas começam no dia 19 – todas as segundas e quartas-feiras, das 19h às 21h30.
Na entrevista a seguir, Pancevski dá detalhes sobre a metodologia PSS.
O que é Post-Settlement Settlement, ou PSS, um dos destaques do curso?
Essa é uma das metodologias mais recentes de desenvolvimento em técnicas de negociação. Ela se originou na Universidade Harvard, na esteira da metodologia de mutual gain, ramificando-se em estudos orientados para a área empresarial. A PSS permite agregar valor para ambas as partes de uma negociação, por meio de ajustes em um acordo já fechado, aplicando-se a praticamente todos os casos em que, além do preço, é negociado pelo menos outro fator.
Geralmente, o comprador prefere estender o prazo de pagamento e reduzir o de entrega do produto ou serviço que está sendo adquirido. Já o vendedor negocia na direção oposta. O resultado é que fecham o acordo em algum ponto intermediário, e o combinado em termos de prazo de pagamento e de entrega do produto ou serviço se refletirá no preço estipulado.
Suponhamos que o acordo alcançado preveja preço de R$ 100; prazo de pagamento de 30 dias; e prazo de entrega do produto ou serviço de três semanas. Um acordo diferente, com outros prazos e preço, não seria mais vantajoso para ambas as partes? O preço em R$ 140, com prazo de pagamento de 60 dias e de entrega de duas semanas, por exemplo?
Para a maioria das negociações, a resposta é afirmativa, com uma estrutura de prazos/preço que otimiza a agregação de valor. O problema é que os negociadores não percebem isso, ficando supostamente satisfeitos com o acordo obtido. E, mesmo se percebessem, teriam dificuldades para encontrar a estrutura de acordo ideal se não utilizassem uma metodologia analítica. Na maioria dos casos, portanto, muito dinheiro é perdido por ambas as partes na negociação.
Mas como funciona então essa metodologia?
A abordagem analítica de PSS otimiza as condições do acordo final, por meio de ajustes no preço e nas estruturas acordados, com o objetivo de maximizar o retorno para os negociadores. As propostas de PSS costumam ser aceitas por ambas as partes envolvidas na negociação, pois o benefício obtido pode ser perfeitamente quantificado.
Essa metodologia se aplica a fatores dos mais diversos que podem acompanhar uma negociação de preço, como prazo de pagamento e/ou de entrega do produto ou serviço; nível de estoque; garantias; nível de qualidade; assistência técnica; e prazo de exclusividade. O domínio do conceito de PSS pode trazer para as empresas retornos substanciais em vendas ou compras, tendo como único investimento a qualificação das equipes comerciais.
O senhor tem algum exemplo que demonstre a PSS na prática?
Sim, vamos abordar cases no curso de curta duração. Há empresas grandes que só pagam seus fornecedores em 90 dias. Ou seja, quem está vendendo já sabe que só vai receber depois desse período de três meses. Para os fornecedores menores, que não podem aguardar por causa do capital de giro menor, um dos caminhos é descontar a duplicata no banco para receber antes, pagando naturalmente os juros dessa operação. A empresa grande, em um olhar descuidado, pode achar que isso faz sentido. Afinal de contas, obtém a mercadoria, com a possibilidade de pagar em 90 dias. Mas, na realidade, é um tiro no pé.
Pela metodologia PSS, a empresa grande poderia chegar com a seguinte proposta para o fornecedor menor: sei que você é muito sensível ao prazo de pagamento, motivo pelo qual podemos combinar o pagamento em 30 dias, com a contrapartida de redução do preço do produto ou serviço. Para ambos os negociadores, isso fará sentido — para a empresa grande, que pagará menos, e para o fornecedor menor, que não precisará fazer a operação bancária, arcando com custos que são provavelmente maiores do que a redução do preço praticada. A metodologia PSS permite quantificar o preço e a estrutura de acordo que otimizariam o ganho para ambas as partes em comparação com o acordo inicial.
Note que esse raciocínio não é geralmente adotado. No contexto abordado, a empresa maior costuma se impor, achando que está na vantagem, sem perceber que há outro caminho melhor. É justamente esse valor agregado perdido para ambas as partes que a metodologia PSS captura.
A emoção deve ficar de lado nas negociações?
Essa visão de que a emoção turva a razão vem dos gregos antigos. O filósofo Aristóteles dividia a negociação em quatro pilares, o que continua válido até hoje. Um deles é o racional, chamado de logos, e o outro é o emocional, denominado pathos. Naquela época, acreditava-se que o pilar emocional deveria ser reduzido ao máximo, pensamento que ainda hoje prevalece. Só que, na realidade, é justamente o contrário. Isso porque a emoção é impossível de eliminar e porque ela é tão importante quanto a razão para chegar ao melhor acordo possível.
Nas negociações de hoje, há uma preocupação voltada para a gestão da parte emocional. O negociador reconhece sua emoção e a dos outros que estão presentes. No curso, abordaremos a relevância nesse processo das microexpressões faciais, que revelam, em fração de segundos, as emoções que surgem durante a negociação. São insumos valiosos que podem contribuir para o sucesso da negociação. As empresas estão procurando obter esses insumos por meio do conhecimento das microexpressões para melhorar o desempenho dos seus negociadores na área comercial e dos seus gestores no reconhecimento dos conflitos internos.
Ensinamos, ainda, como reconhecer táticas de intimidação e se proteger delas, por meio da criação de uma blindagem contra pessoas agressivas, analisando casos reais de mercado.
Qual é o principal erro cometido nas negociações?
É considerar que, se o outro lado está se dando bem de alguma forma na negociação, isso significa automaticamente que estou perdendo algo, o que justifica uma postura defensiva ou até mesmo destrutiva minha, bloqueando a qualquer custo os interesses do outro.
Em uma negociação, você não deve se posicionar de forma contrária à outra parte. Isso porque os objetivos não precisam ser antagônicos. Deve ser perseguida a seguinte lógica: você vai me dar aquilo que mais valorizo e que para você é menos custoso, e eu farei a mesma coisa.