O fato de o ex-ministro José Dirceu ter deixado a prisão para ir trabalhar no escritório de advocacia do amigo José Gerardo Grossi numa caminhonete Hilux, com motorista e ter duas horas de almoço, entre outras benesses, dividiu opiniões entre cientistas políticos ouvidos ontem pelo GLOBO. Enquanto alguns classificaram as mordomias como “deboche” à sociedade, outros entenderam que ele está exercendo seu direito de trabalhar fora da prisão, com autorização judicial.
Para Bolivar Lamounier, nunca os presos tiveram tantas regalias como as que está tendo Dirceu.
— É um deboche claro. A maioria dos presos brasileiros vive em condições subhumanas. O próprio ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que as prisões brasileiras mais parecem masmorras medievais, muito longe da situação vivida por Dirceu. Não podemos esquecer que o ex-ministro foi condenado por corrupção, o que é um crime grave, e teria que estar recebendo a punição de forma exemplar, sem privilégios — disse Lamounier.
Para o cientista político Humberto Dantas, do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), Dirceu está exercendo seus direitos.
— Quando ele foi autorizado a trabalhar fora, não se imaginou que o ex-ministro fosse quebrar pedras no deserto ou trabalhar carregando saco de areia nas costas. Ele ainda é uma pessoa que conhece muita gente e tem grande influência. De qualquer forma, o cenário de Dirceu é o espelho fiel da sociedade e suas desigualdades. Pelo que ele sabe, ele sempre encontrará um bom emprego — disse Dantas.
Após destacar que o ex-ministro obteve na Justiça o direito de trabalhar fora da prisão, Galdêncio Torquato disse que o próprio condenado tem de assumir uma postura regrada pelo bom senso, sem ostentação.
— Ele não pode ter regalias que outros condenados não têm. Afinal, isso pode prejudicar ainda mais sua imagem, já execrada pela opinião pública. Ele não pode ultrapassar os limites do bom senso. A isonomia para os demais condenados tem que ser observada — disse Torquato.
Fonte: O Globo – RJ – 04/07/2014