23/02/2017
Fonte: Nexo – 23/2/2017
Ministro das Relações Exteriores é o 8º a deixar o gabinete do presidente em 9 meses de governo. Segundo carta de exoneração, tucano enfrenta problemas de saúde.
A saída do ministro das Relações Exteriores, José Serra (PSDB), publicada nesta quinta-feira (23) no “Diário Oficial” da União, é a oitava baixa no primeiro escalão do governo desde que o mandato do presidente Michel Temer teve início, em maio de 2016.
Serra entregou carta com pedido de exoneração a Temer na quarta-feira (22), alegando problemas de saúde que, segundo ele, o impedem de cumprir compromissos internacionais – com voos de várias horas -, próprios do cargo de chanceler. Em dezembro, Serra passou por uma cirurgia na coluna cervical.
Na quinta-feira (5) e no sábado (7), ele havia requisitado o transporte em aviões da Força Aérea a São Paulo, indicando no formulário “emergência médica” como motivo da solicitação.
Em sua carta, o agora ex-ministro diz que “o tempo para restabelecimento adequado é de pelo menos quatro meses”. Ele anunciou que voltará ao Senado, onde vinha sendo substituído por seu suplente, José Aníbal (PSDB-SP). Temer não indicou o novo ministro, mas deve manter a pasta sob influência do PSDB.
A saída de Serra tem um componente simbólico. O ex-ministro foi um dos principais articuladores do impeachment de Dilma Rousseff dentro do PSDB. Foi também o primeiro tucano a declarar apoio a Temer caso o afastamento de Dilma se confirmasse. Em troca, foi contemplado com o ministério.
Carta de exoneração. E o que vem agora
Saúde: a razão oficial da saída
Na carta de demissão enviada a Temer, Serra aponta uma única razão para sua saída: “problemas de saúde” que, segundo afirma, o impedem tanto de viajar quanto e de cumprir as funções cotidianas do cargo. Serra fala de um prazo de quatro meses, estimado pelos médicos para sua recuperação. Embora não mencione textualmente os problemas nas costas, essa era a razão do tratamento que ele vinha fazendo em São Paulo.
Política: possibilidades futuras
Serra reassumiu o mandato de senador nesta quinta-feira (23). A volta dele coincide com o momento em o governo discute no Congresso reformas importantes, como a da Previdência e das leis trabalhistas. Serra será mais um aliado dentro de um parlamento em que Temer já conta com maioria, tanto na Câmara quanto no Senado. Na Casa, o tucano voltará a dividir espaço com Aécio Neves (MG), com quem vinha disputando protagonismo com vistas a ser o candidato do partido em 2018.
Lava Jato: as citações
Serra não é investigado, mas delatores citaram seu nome, relatando doações irregulares à campanha do tucano de 2010 e fraudes em obras referentes ao período em que ele governou São Paulo (2007-2010). O tucano negou irregularidades e disse que as finanças eram de responsabilidade do partido. No fim de janeiro, delações de 77 executivos e ex-executivos da Odebrecht foram homologadas. Os depoimentos têm potencial para atingir dezenas de políticos de diversos partidos, entre eles o PMDB e o PSDB. Até agora a Procuradoria não solicitou a abertura de inquéritos com base nesses depoimentos. Em 13 de fevereiro, Temer declarou que demitirá ministros que venham a se tornar réus na Lava Jato.
Quem já deixou a Esplanada
Romero Jucá
Era ministro do Planejamento, filiado ao PMDB. Saiu em maio de 2016 quando vieram à tona gravações em que falava sobre “estancar a sangria” provocada pela Lava Jato. Voltou para o Senado e hoje é líder do governo.
Fabiano Silveira
Era ministro da Transparência, sem filiação partidária. Saiu em maio de 2016 em consequência de gravações em que dava estratégias de defesa na Lava Jato para os senador Renan Calheiros (de quem era próximo dentro do PMDB).
Henrique Alves
Era titular do Turismo, filiado ao PMDB. Pediu demissão em junho de 2016 após informações de que um delator falaria sobre propinas e contas no exterior ligadas a ele.
Fábio Medina Osório
Era titular da Advocacia-Geral da União. Não era filiado, mas foi indicado por integrantes do PMDB. Foi demitido em setembro de 2016 em razão de divergências entre ele e outros integrantes do primeiro escalão.
Marcelo Calero
Era ministro da Cultura, sem filiação partidária. Pediu demissão em novembro de 2016 alegando sofrer pressão política para beneficiar o então ministro Geddel Vieira Lima.
Geddel Vieira Lima
Era titular da Secretaria de Governo da Presidência, filiado ao PMDB. Pediu demissão em novembro de 2016 em razão dos desgastes causados pelas declarações do ex-ministro da Cultura.
Alexandre de Moraes
Era ministro da Justiça e então filiado ao PSDB. Em fevereiro de 2017, foi indicado por Temer para a vaga de Teori Zavascki no Supremo Tribunal Federal.
Um movimento com pouco efeito prático
As saídas desses ministros tiveram características diferentes quando comparadas à demissão de Serra. Em primeiro lugar, parte das baixas significou a perda de importantes aliados para Temer, em especial nos casos de Jucá e Geddel, políticos do círculo mais próximo de Temer.
Em segundo lugar, com exceção de Alexandre de Moraes, todas as demissões ocorrem em meio a denúncias de corrupção ou em decorrência da Lava Jato.
Serra, embora citado na Lava Jato, no presente momento não dava sinais de que pudesse causar desgastes imediatos para Temer. Considerando essas diferenças e a pasta ocupada por Serra, de menor visibilidade, saída do tucano causa poucos efeitos ao governo federal, na avaliação do cientista político Carlos Melo, professor do Insper.
“No atual momento, é uma perda relevante para Temer por se tratar de de um político com histórico importante e conhecido por sua pró-atividade. Mas não é uma perda comparável a de um titular da Fazenda, por exemplo”, afirma Melo.
No Itamaraty, um legado tímido
Serra assumiu o Ministério das Relações Exteriores no dia 12 de maio de 2016. Até a exoneração, foram 287 dias no cargo.
O tucano estreou rebatendo presidentes de países vizinhos que criticavam o impeachment de Dilma Rousseff. Os comentários dos governos de Cuba, Equador, Bolívia, Nicarágua e Venezuela foram chamados de “falsidades” pelo Itamaraty sob Serra. Nas palavras do professor Guilherme Casarões, doutor em ciência política e professor de relações internacionais na FGV e na ESPM, Serra “defendeu com unhas e dentes a legalidade do processo de impeachment”.
Em seguida, o novo ministro prometeu revisar todos os gastos do ministério, fechando embaixadas que haviam sido abertas pelos governos do PT em países da África e do Caribe. A justificativa era apostar em representações que trouxessem benefícios econômicos mais claros ao país. Na opinião de Casarões, Serra “buscou, acertadamente, redefinir o papel da diplomacia comercial, mas os resultados ainda estão por vir”.
A medida tinha o efeito prático de cortar gastos em período de crise, mas também apontava para um desejo de mudar o eixo da política externa. Numa crítica indireta aos governos petistas, Serra prometeu fazer uma política livre de “preferências ideológicas”. A promessa – feita por um político que sempre teve pretensões eleitorais – foi recebida com críticas e desconfiança.
“Em nove meses no cargo, [Serra] fez muito pouco”, avalia Casarões. “Sua política externa resumiu-se ao ajuste da narrativa política. “Depois de um longo período de chanceleres-diplomatas, o Itamaraty de Temer, ainda que diga recusar as ideologias, é assumidamente partidário”, diz o professor.
Carlos Melo – Ministro das Relações Exteriores é o 8º a deixar o gabinete do presidente em 9 meses de governo. Segundo carta de exoneração, tucano enfrenta problemas de saúde.