19/12/2014
2014 foi um ano de eleições presidenciais particularmente polarizadas, ou seja, um ano de muitas emoções. A polarização refletiu em grande medida o fato de que o governo vai bem na área social, mas mal na parte macroeconômica, enquanto a oposição tinha uma melhor proposta econômica, mas não conseguiu convencer a população de que iria manter as conquistas sociais. O que podemos aprender com as eleições deste ano?
Vale lembrar que a sociedade brasileira evoluiu muito nos últimos 20 anos, em vários aspectos. A democracia vai bem, as eleições, mesmo polarizadas, transcorrem sem maiores problemas, e os casos sérios de corrupção têm sido apurado sem maiores transtornos, pelo menos por enquanto. Políticos e empresários culpados estão indo para a cadeia. Ou seja, evoluímos.
Mas ainda falta muito para chegarmos ao clube dos países desenvolvidos. Temos grandes problemas institucionais e de gestão pública. Em termos institucionais, os casos de corrupção deixam claro que ainda temos no Brasil o que o economista Daron Acemoglu chama de padrões viciados que se repetem ao longo do tempo. Isso fica claro desde os casos de corrupção para tirar carteira de motorista, que persistem há 30 anos, até os casos maiores de corrupção nas grandes empresas públicas. Enquanto a nossa elite política e econômica não se recusar a tomar parte nesses esquemas viciados, as coisas ainda vão demorar muito para melhorar no Brasil.
Precisamos enfrentar os interesses corporativistas de todas as classes, que tanto atrapalham nosso país
Na economia, o fracasso da chamada “nova matriz macroeconômica” foi retumbante. Muitas pessoas bem intencionadas não entendem que a boa gestão macroeconômica não atrapalha a boa gestão social, mas a ajuda. Há uma linha de pensamento que ainda acredita que o governo pode gastar à vontade, que é necessário subsidiar a indústria, que é possível conviver com taxas de inflação elevadas, que temos que apoiar a formação de grandes grupos nacionais monopolistas e que a lei de responsabilidade fiscal não é necessária.
Impressiona ver que um governo pode trabalhar seriamente para melhorar a situação dos mais pobres, ao mesmo tempo em que beneficia as elites com proteção tarifária, subsídios, etc. Ao mesmo tempo em que se recusa a permitir uma taxa de retorno justa para o setor privado, que quer participar de projetos de investimentos em infraestrutura tão necessários hoje em dia, o governo mantem uma política de desoneração fiscal para setores específicos que custa bilhões de reais e serve para incentivar a contratação de trabalhadores numa época em que há pleno emprego. O que está em falta hoje em dia é capital e não trabalho.
Por outro lado, os partidos de oposição falam para um público restrito, primordialmente preocupado com a gestão macroeconômica e têm dificuldades para se comunicar com a maior parte da população. Enquanto a oposição não levar realmente a sério a questão da desigualdade de oportunidades, que persiste de forma clara no Brasil, ainda terá muitas dificuldades para conseguir alcançar o poder, mesmo com os seguidos erros de política econômica que são cometidos pelos que estão governando o país atualmente.
A solução, obviamente, está em manter as conquistas sociais ao mesmo tempo em que se trabalha pela gestão macroeconômica. Como fazê-lo? Grande parte das medidas tomadas nos últimos anos, como as transferências de recursos para o BNDES para fornecer empréstimos subsidiados para os grandes grupos nacionais ou as desonerações da indústria, por exemplo, teriam que ser revertidas.
Adicionalmente, para continuar reduzindo a desigualdade é necessário aumentar a carga tributária da parcela mais rica da população, aumentando a alíquota marginal do imposto de renda (que é muito mais baixa do que em outros países) e tributando os dividendos e os juros sobre o capital próprio pagos pelas empresas. É necessário aliviar, por outro lado, a tributação da parcela dos lucros que são retidos para investimentos. Mas isso não está na agenda nem da situação nem da oposição.
Mas o fator mais importante para que possamos crescer mais e continuamente é aumentar nossa produtividade. Para isso, temos que melhorar a qualidade da educação e tornar nossas empresas mais produtivas. Para melhorar a educação é necessário deixarmos de lado a ideia de que basta aumentar os gastos e remunerar melhor os professores para que o aprendizado dos alunos aumente. Nada mais equivocado. É essencial melhorar a gestão da educação. Para que isso ocorra os políticos devem ter coragem para enfrentar os movimentos corporativistas sem temer os resultados das greves nas próximas eleições.
Com relação às nossas empresas, temos que parar de protegê-las. As empresas não são como as pessoas, elas podem falir e quebrar, e é necessário que isso ocorra para que a produção e o emprego se transfiram para novas empresas com novas ideias que consigam espalhar os aumentos de eficiência pela economia. Nossos empresários têm que melhorar suas práticas gerenciais e ter condições de competir em condições de igualdade com os empresários chineses e coreanos.
Para isso é necessário que tenhamos a mesma determinação que os empresários nesses países têm, que tenhamos mais concorrência na economia e que melhoremos nossa infraestrutura, carga tributária e legislação trabalhista. Precisamos, principalmente, enfrentar os interesses corporativistas de todas as classes, que tanto atrapalham nosso país. Feliz 2015 para todos!
Fonte: Valor Econômico – 19/12/2014