A disputa presidencial mais acirrada dos últimos 12 anos detonou uma onda de especulação com ações de estatais. O mercado aposta que, quanto piores forem as pesquisas eleitorais para a presidente Dilma Rousseff, mais as ações dessas empresas sobem na Bolsa de Valores.
Os investidores têm o pé atrás com a presidente porque avaliam que as intervenções do governo nas estatais prejudicam sua rentabilidade. Na visão do mercado, Brasília sacrifica o ganho dessas empresas para controlar preços e estimular o consumo.
Esse “efeito Dilma” foi medido num levantamento sobre o desempenho dos papéis de cinco estatais nos dias da divulgação das últimas 19 pesquisas Ibope e Datafolha. Segundo o estudo, cada ponto da popularidade da presidente vale US$ 801 milhões (cerca de R$ 1,7 bilhão).
Esse foi o ganho de Petrobras , Banco do Brasil, Eletrobras, Cemig e Cesp a cada ponto de aprovação que Dilma perdeu. A conta foi feita pelos economistas do Insper Sérgio Lazzarini, Bruna Bettinelli Alves e João Manoel Pinho de Mello, também analista da gestora Pacífico.
A cada ponto que a aprovação de Dilma perdeu nas pesquisas, as ações dessas empresas subiram em média 0,5 ponto percentual acima da média do mercado, calculada pelo índice Ibovespa.
Neste ano, somente o “efeito Dilma” produziu um ganho, médio, de US$ 4,8 bilhões (R$ 10,6 bilhões) no valor dessas cinco estatais. Segundo o estudo, isso ocorreu porque de fevereiro a julho, a aprovação da presidente caiu de 41% para 35%.
A ansiedade do mercado com o resultado das eleições não era tão evidente desde 2002, quando Lula despontou como favorito na disputa pela Presidência.
Na época, bancos criaram indicadores para estimar como a vantagem de Lula afetaria aplicações atreladas ao dólar e à taxa de juros. O mais famoso foi o lulômetro, do banco Goldman Sachs.
“Na eleição do Lula, a dúvida era se o sistema econômico seria alterado. Já o governo Dilma foi marcado pelas intervenções pesadas nas empresas estatais. Com a reeleição, o mercado acredita que isso vai continuar”, afirma Lazzarini, do Insper.
Essa diferença faz com que a especulação se concentre, desta vez, na Bolsa de Valores. Outro fator que desencoraja apostas com o dólar é que o Banco Central tem reservas muito maiores que em 2002.
PESQUISAS E BOATOS
O mercado financeiro é um terreno nervoso por natureza, com profissionais que se dedicam a saltar sobre informações relevantes antes dos outros para ganhar dinheiro. Nesse ambiente, a eleição virou motivo para apostas, movidas a pesquisas eleitorais, consultorias e boatos.
“É especulação pura e da pior qualidade. Ao fazer essa aposta, o investidor busca um ganho de curtíssimo prazo e subestima a capacidade do atual governo de fazer as pazes com o mercado num segundo mandato”, afirma Ricardo Lacerda, do banco de investimentos BR Partners.
Na última quarta-feira, a especulação sobre números positivos para Dilma no Datafolha fez a ação da Petrobras cair 1,1% em 45 minutos. “Os preços das ações estão sendo ditados pelas eleições. Os fundamentos econômicos ficaram de lado”, diz Daniel Cunha, da XP Investimentos.
O cenário político passou a interferir mais intensamente na Bolsa do começo do ano para cá. Se a corrida pela Presidência continuar disputada, será assim até outubro.
A agitação no cenário eleitoral esquentou o mercado de consultoria.
A agitação no cenário eleitoral esquentou o mercado de consultoria política e a venda de pesquisas que tentam reproduzir o resultado de Datafolha e Ibope antes que sejam divulgados.
Com essas sondagens em mãos, os operadores compram ou vendem ações antes que a pesquisa oficial venha a público, o que lhes daria vantagem sobre os demais investidores. As pesquisas mais elaboradas custam de R$ 150 mil a R$ 170 mil.
Corretoras e gestoras menores também tentam antecipar os movimentos com o serviço de consultores, que cobram de R$ 7 mil a R$ 9 mil por pacotes mensais de assessoria política.
O cientista político Alberto Almeida seria um dos principais fornecedores de levantamentos que prometem antecipar a tendência das pesquisas eleitorais. Procurado, ele não quis dar entrevista.
A especulação com ações chamou a atenção da CVM (Comissão de Valores Mobiliários).
No começo do mês passado, a entidade começou a monitorar o mercado para checar se investidores estão tendo acesso a vazamentos de pesquisas eleitorais.
Fonte: Folha de S. Paulo – SP – 06/07/2014