02/02/2022
Leilões devem atrair mais de 8 bilhões de reais em investimentos. O Ministério da Infraestrutura mexeu na composição de blocos para reduzir a pressão do governo do Rio de Janeiro
Leandro Steiw
Os aeroportos de Congonhas, em São Paulo, e Santos Dumont, no Rio de Janeiro, são as duas pérolas das concessões previstas para o setor em 2022. No dia 31 de janeiro, o Ministério da Infraestrutura mexeu nos blocos da sétima rodada de concessões, para tentar aliviar a pressão do governo do estado do Rio de Janeiro. Assim, o aeroporto Santos Dumont, que inicialmente estava no lote que incluía também os terminais de Jacarepaguá (RJ), Uberlândia (MG), Monte Claros (MG) e Uberaba (MG), será leiloado isoladamente. Na alegação de autoridades e empresários, o contrato de concessão também deveria restringir a ampliação de voos no Santos Dumont para evitar a concorrência com o aeroporto do Galeão, o maior do Rio de Janeiro em movimentação de passageiros. Ou seja, outras mudanças podem ocorrer nos editais.
O pacote de Congonhas recebeu os três terminais de Minas Gerais e inclui ainda os de Campo Grande (MS), Corumbá (MS), Ponta Porã (MS), Santarém (PA), Marabá (PA), Parauapebas (PA) e Altamira (PA). Na recomposição, os aeroportos de Jacarepaguá (RJ) e Campo de Marte (SP) formaram um novo bloco, o da Aviação Geral. A previsão do governo é realizar o leilão no terceiro trimestre de 2022, junto com um terceiro lote composto pelos aeroportos internacionais de Belém, no Pará, e de Macapá, no Amapá. Tudo somado, as concessões podem atrair 8,6 bilhões de reais em investimentos. Mas o calendário começou a ficar apertado para uma rodada completa de concessões.
Segundo Sandro Cabral, professor titular do Insper na área de Estratégia e Gestão Pública e coordenador do Insper Metricis, a indefinição na composição dos blocos traz insegurança aos investidores, porque sinaliza que o governo pode ceder a outras pressões futuras, políticas ou não, como ocorreu agora. A composição anterior de aeroportos seguiu estudos técnicos (como demanda e viabilidade econômico-financeira) e falta saber quais foram os critérios da redistribuição.
Pelas informações anteriores do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), os três lotes de aeroportos que o governo queria licitar estavam sob análise do Tribunal de Contas da União, acompanhados da relicitação de Viracopos, em Campinas (SP), o segundo mais importante em transporte de cargas do país, com movimentação anual de 260 mil toneladas em voos domésticos e internacionais. As alterações dos blocos atrasam esse processo. A outra relicitação, do aeroporto de São Gonçalo do Amarante, no Rio Grande do Norte, já passou por apreciação do TCU.
De 2019 a 2021, foram licitados 34 terminais aeroportuários com investimentos de cerca de 9,6 bilhões de reais, segundo o Livro Azul da Infraestrutura, publicado pela Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib). Para Sandro Cabral, a saída da Infraero da administração atraiu players internacionais que sabem, de fato, fazer gestão de aeroportos. Isso reduziu a possibilidade de a infraestrutura ser entregue a empresas que não são do setor ¾ e, habitualmente, estão mais interessadas nos valores do contrato ou não terão saúde financeira para cumprir o acordo. Além disso, comenta Cabral, a não participação de alguns players nacionais implicados em escândalos de corrupção contribuiu para o maior apetite de empresas internacionais de competência comprovada.
O Índice Abdib-Vallya de Infraestrutura, que estima a utilização de rodovias, ferrovias, aeroportos, portos, energia elétrica e telecomunicações, caiu por meses seguidos em 2021. Uma das leituras é que, no pós-pandemia, o uso da infraestrutura brasileira pode ficar em um nível mais baixo do que o histórico. Consequentemente, alguns investimentos seriam mais arriscados. A literatura especializada cita retração econômica, demanda, disponibilidade de recursos e incerteza regulatória, entre outros, como riscos comuns às concessões de serviços públicos. O setor aeroportuário foi o único com crescimento no período, principalmente por causa do transporte de passageiros ¾ no índice são considerados também carga, correio e bagagem. Porém, a movimentação total dos aeroportos ainda é metade da registrada no início de 2020.
Na sexta rodada de concessões de aeroportos, realizada em 2021, o ágio médio em relação à oferta mínima foi alto, de 3.822%, mas o número de participantes foi menor que nos leilões anteriores. Sete empresas fizeram ofertas pelos três blocos de 22 aeroportos, mas os lances entre a vencedora e a segunda colocada ficaram distantes. No caso do Bloco Sul, por exemplo, o segundo lance foi metade dos 2,1 bilhões de reais oferecido pela CCR. Conforme o professor Cabral, o maior número de concorrentes de fôlego financeiro possivelmente está associado ao ágio observado.
A instabilidade econômica reduz a atratividade das privatizações, tanto que as próximas licitações seguirão o modelo adotado na sexta rodada. O valor da outorga agora é pago antes da assinatura do contrato, e não mais parcelado ao longo do contrato e reajustado pela inflação. Também foram criadas outorgas variáveis conforme o local do aeroporto e investimentos proporcionais à receita e à demanda, dando mais liberdade de planejamento aos investidores. Como se sabe, a demanda no Brasil está em queda, inclusive em terminais de alta movimentação. Em 2021, foi criado um pacote de revisões de outorgas devido às perdas causadas pela redução do fluxo durante a pandemia da covid-19.
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