Saída líquida de recursos alcançou R$ 5,53 bi no mês
A caderneta de poupança começou 2015 com a maior perda mensal de recursos já registrada. De acordo com dados do Banco Central (BC), os saques superaram as entradas em R$ 5,528 bilhões, maior saída líquida mensal da série histórica, iniciada em janeiro de 1995. Essa também foi a primeira retirada líquida após oito meses seguidos de captação.
Em janeiro do ano passado, a captação ficou em R$ 1,743 bilhão. Em 2014 como um todo, a poupança captou R$ 24,034 bilhões, menor captação líquida desde os R$ 14,186 bilhões vistos em 2011.
Um importante fator que retira a atratividade da caderneta é a continuidade do movimento de alta da Selic, que favorece outras alternativas de investimento. Na primeira reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) deste ano, a Selic passou a 12,25%, após uma alta de 0,5 ponto percentual.
Desde o fim de agosto de 2013, a poupança voltou a ser remunerada pela “fórmula antiga” de 0,5% ao mês mais a Taxa Referencial (TR). Pela regra atual, se a Selic voltar a ficar abaixo de 8,5% ao ano, o rendimento será equivalente a 70% da taxa básica de juros.
Dados da Anbima mostram que houve entrada de recursos em janeiro, de R$ 1,7 bilhão, nos fundos referenciados DI. Os fundos de renda fixa também viram entrada de recursos no mês, de R$ 277 milhões.
Outras modalidades de investimento, como Certificados de Depósito Bancário (CDBs), também mostram fuga de recursos, o que pode indicar que os investidores estão resgatando suas reservas para consumir.
Inflação elevada, crescimento menor da renda e mesmo queda na renda disponível, conforme tarifas e combustíveis sobem, também devem influenciar o comportamento da poupança neste ano.
Como o saque das cadernetas ultrapassou o rendimento de R$ 3,578 bilhões, o patrimônio total da poupança caiu de R$ 662,727 bilhões em dezembro para R$ 660,776 bilhões no mês passado — queda de patrimônio não ocorria desde abril de 2008.
Os bancos que aplicam recursos da caderneta em crédito imobiliário mostraram resgate líquido de R$ 4,453 bilhões no mês passado (SBPE). E as instituições que destinam os recursos para o crédito rural registraram saída líquida de R$ 1,074 bilhão (SBPR).
Segundo o economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), Nicola Tingas, o aumento das tarifas, dos combustíveis e os reajustes no IPTU têm efeito instantâneo sobre a renda. “É um momento de ajuste com efeito sobre as expectativas e um impacto caixa imediato.” Para ele, a percepção de que o Brasil terá um ajuste na economia vinha sendo construída desde o fim do ano passado, mas agora começa a ser percebido que há necessidade de um ajuste adicional, principalmente depois do reajuste da energia.
Segundo o professor de finanças do Insper, Ricardo Humberto Rocha, os dados de janeiro mostram que o “cobertor ficou curto”. Faltou renda para fazer frente às despesas sazonalmente mais elevadas em um quadro de elevado endividamento das famílias.
Para o professor, a alta da Selic pode manter a tendência de migração de recursos. “Se a taxa básica de juros continuar subindo, a poupança vai continuar sofrendo concorrência”, disse.
Para executivos de bancos, a captação líquida ainda deve ser revertida ao longo do ano. O movimento histórico de saques da poupança no mês de janeiro não preocupa o Santander, segundo Christiano Ehlers, superintendente executivo de investimentos do banco. Para ele, o movimento foi pontual e a percepção é de que os recursos foram direcionados essencialmente para o consumo das família.
“As famílias têm gastos elevados em janeiro com IPVA, IPTU, material escolar e fatura de cartão de crédito”, disse. Além disso, neste ano, em especial, os gastos podem ter pesado mais no orçamento já que a inflação está elevada.
O executivo de um outro banco de varejo ouvido pela reportagem também avaliou que a poupança voltará a ter uma captação positiva, principalmente pelo esforço comercial que as instituições financeiras devem fazer para reverter esse cenário.
Fonte: Valor Econômico – 06/02/2015