25/04/2017
Fonte: Nexo Jornal – 25/4/2017
Temer em encontro com deputados da base aliada, no Planalto
Michel Temer assumiu a Presidência da República em maio de 2016 prometendo retomar o crescimento da economia. Para isso, apostou num pacote de reformas que dependem do aval da Câmara e do Senado.
O início de mandato mostrou que Temer contava com um amplo apoio: aprovou, por exemplo, uma mudança importante na Constituição, que impôs um limite de gastos para o governo federal por um período de até 20 anos.
De lá para cá, porém, o cenário vem mudando, inclusive dentro do seu próprio partido, o PMDB, do qual foi presidente nacional por 15 anos.
Embora o número de parlamentares que se dizem aliados ainda seja alto, a instabilidade da base acende um alerta para o governo. Para aprovar a reforma da Previdência, cujo conteúdo é impopular porque mexe na aposentadoria dos trabalhadores brasileiros, são necessários votos de 308 dos 513 deputados (ou três quintos do plenário).
A votação que estabelece uma reforma trabalhista, prevista para ter início nesta quarta-feira (26), portanto, será um teste importante para o Planalto. Por ser um PL (projeto de Lei), e não uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) como a reforma da Previdência, a aprovação exige um apoio de menos deputados: 257 votos favoráveis (maioria simples).
Fidelidade em tendência de baixa
O índice de fidelidade dos deputados ao governo federal caiu de 91%, em julho de 2016, para 79% em abril de 2017, de acordo com levantamento feito pelo Estadão Dados, núcleo do jornal “O Estado de S. Paulo”, a partir do registro das votações na Câmara. Isso quer dizer que em 79% das vezes parlamentares votaram de acordo com as orientações do Palácio do Planalto.
Quando se observa o comportamento de cada partido, foi o PSDB, e não o PMDB, a sigla que se manteve mais fiel a Temer. A fidelidade de todas as legendas diminuiu, mas a queda entre os tucanos foi menor: eles votaram com o governo 94% das vezes em abril de 2017, ante 98% em dezembro de 2016. Já o PMDB, diminuiu de 98% para 92%.
Na atual configuração da Câmara, o partido de Temer tem a maior bancada (64 deputados), seguido pelo PT (58) e pelo PSDB (47). Os tucanos, que tiveram papel fundamental ao lado dos peemedebistas na articulação do impeachment de Dilma Rousseff, representam hoje a principal sigla da base do presidente e chefiam três ministérios. Em troca dos votos de sua bancada, o PSDB também espera que o PMDB apoie um eventual candidato tucano nas eleições presidenciais de 2018.
Dentro do PMDB, há integrantes contrários às reformas do governo, dado o alto grau de impopularidade das medidas. Em resposta ao comportamento de integrantes do partido, já há algum tempo outras legendas da base têm cobrado de Temer que ele faça a bancada do seu partido fechar voto em favor das propostas.
Ao Nexo, dois cientistas políticos analisam a fidelidade dessas legendas na Câmara. São eles:
Carlos Melo, cientista político e professor do Insper
Manoel Santos, cientista político e professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais)
Por que o PSDB tem sido mais fiel que o PMDB na Câmara?
Carlos Melo O PSDB tem alguma conexão ideológica com as reformas, muito em razão da sua experiência de governo, com Fernando Henrique, e também pelo ideário econômico da legenda. O eleitor médio deles talvez tenha concordância com essa agenda de reformas. Além disso, o PSDB, acreditando que o próximo governo será seu [se vencer as eleições em 2018], sabe que será melhor e mais fácil se o ambiente econômico for saneado agora.
O PMDB, por sua vez, já é todo guiado pelo pragmatismo eleitoral, sem ideologia. O pensamento deles é “quantos votos isso dá e quantos pode tirar”. E, claro, as reformas têm um componente complicado por ferir interesses de grupos mobilizados e que pode ter consequências eleitorais. O PMDB, pragmático que é, não se compromete.
Tenho impressão que no Senado (em que pese a figura do senador Renan Calheiros, que recentemente se opôs a Temer), o partido atua de forma mais coesa. É uma bancada formada por políticos com mais experientes, com mais estatura e que têm mais consciência do papel desempenhado ali.
Manoel Santos A postura do PSDB está relacionada à sua sobrevivência. O partido teve papel de protagonista no impeachment de Dilma e acho que os tucanos estão sendo mais racionais agora. A agenda de reformas também é compatível com a agenda do PSDB. Em tese, aprovar as reformas reverbera positivamente em toda a coalizão, já que pode trazer certo dinamismo para a economia. Mas a questão é o custo das reformas a certos segmentos.
O PMDB tem um complicador pelo fato de não haver um só PMDB. Ele é dividido, é um partido que não marcha unido. O próprio Temer nunca foi uma liderança unânime. Seus integrantes são mais orientados à sua própria sobrevivência eleitoral, daí a dificuldade de administrar os parlamentares.
Toda essa instabilidade política acaba afetando o ambiente como um todo e o PMDB está no epicentro de toda essa crise, com lideranças envolvidas na Lava Jato, por exemplo. Fica mais difícil administrar as expectativas de todo mundo que compõe a coalizão.
Para Temer, quais os reflexos do comportamento do PMDB?
Carlos Melo Complica muito a vida dele. Aliás, ocorre agora o que o próprio PMDB falava do PT, quando a Dilma Rousseff era presidente e queria votar seu pacote econômico [que enfrentava resistência entre os petistas]. “A gente vai lá, vota e o PT faz manifestação contra?” Ou seja, é um mau exemplo para os demais partidos da base, que vão se sentir desobrigados a votar com o governo.
Se a agenda é impopular e inevitável, quem tem que arcar com o ônus é sobretudo o partido do presidente da República, até para que ele possa pedir sacrifícios para os outros aliados. Sem a própria legenda, a negociação se desloca do campo dos partidos para uma negociação individualizada, deputado a deputado. Isso sai muito caro.
Manoel Santos O PMDB é sempre mais difícil de lidar e isso tem um peso na administração da coalizão, já que pode contaminar os demais partidos. Nesse contexto de fragmentação partidária e de individualismo parlamentar, essa dificuldade se acentua e exige uma barganha ainda mais complexa para conseguir apoio em votações.
A despeito de agora o presidente da República ser um correligionário, o fato é que partidos não mudam da noite para o dia, eles têm um certo DNA. Mas acho que aquelas características do PMDB se agravaram nos últimos anos, em parte em função desse cenário de instabilidade atual.
Expresso Quais são os pontos de conflito entre a CUT e o governo na reforma trabalhista
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