FALIR É PRECISO, EMPREENDER É IMPRECISO
Marcelo Nakagawa
Professor de empreendedorismo do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper)
Por que as empresas quebram? Não é pelas crises, falta de planejamento ou mesmo pela queda na demanda. Tudo isto contribui, mas as empresas quebram pela mais básica das razões: não conseguem manter o fluxo de caixa positivo, ou seja, as saídas ficam recorrentemente maiores do que as entradas. Falir, neste caso, é um resultado exato, matemático, preciso.
E o ano de 2015 tem sido milimetricamente sufocante, angustiante e muitas vezes agonizante para muitos empreendedores que, de repente, se tornaram financistas diante do preocupante aumento dos custos, combinado com uma desesperadora queda nas vendas.
Apenas reduzir os custos, em muitos casos, não é o suficiente, pois os que restam continuam a subir. A loja de bolos caseiros da minha rua demitiu dois dos seus quatro funcionários, mas a energia elétrica, seu principal custo, subiu mais de 50% este ano.
E como a inflação corrói parte dos poucos ganhos obtidos com muito esforço pelos empreendedores, estes tentam repassar o impacto do aumento dos custos para seus consumidores via aumento dos preços (o que, pelos menos, fica nítido para o consumidor) ou, pior, muito pior, por meio de alguma esperteza mesquinha. Parece que a loja de bolos reduziu os tamanhos. Outro restaurante trocou seu tradicional risoto de muçarela de búfala com castanha do Pará por queijo branco e, pasmem, soja torrada.
Enquanto que estas soluções têm algum impacto positivo nas grandes empresas, as micro e pequenas não conseguem os mesmos resultados. Uma grande empresa de bens de consumo pode lançar uma embalagem de iogurte semelhante ao do seu concorrente com 10 gramas a menos, cobrar o mesmo preço e ainda continuar no mercado. Mas se a pequena loja de bolos e o restaurante fizerem o mesmo, o cliente reclama na hora e impacta outros ao redor. E, neste momento de aperto, se perderem 20% da sua clientela, matematicamente, já entram em situação de pânico financeiro.
Mas o que é possível fazer diante da perspectiva de queda na demanda e aumento dos custos? Financeiramente, é essencial gerir o negócio também de forma matemática. É necessário separar definitivamente a pessoa jurídica da pessoa física do empreendedor e utilizar técnicas de planejamento de custos como a Orçamento Base Zero (OBZ), que permite a separação dos custos básicos e estratégicos daqueles que são dispensáveis.
Internamente, é indispensável ser transparente com a equipe, pedindo sua ajuda com ideias. E também pensar em parcerias com outras empresas, inclusive concorrentes. Para o mercado, é importante manter o compromisso com a melhor experiência de consumo. E para o empreendedor, é essencial saber (sobre) viver este momento de queda de entradas de caixa e aumento das saídas. Pois falir é uma ciência precisa: basta não ter mais caixa para pagar as obrigações financeiras da empresa. Mas empreender é impreciso, nunca foi uma ciência exata. Se não há uma fórmula para se fazer melhor em tempo de inflação, o momento é de usar a criatividade.
Fonte: Estadão.com – 11/12/2015