08/12/2014
No último encontro da série Fóruns Estadão Brasil 2018, palestrantes advertem que o equilíbrio das contas públicas será penoso, mas essencial para o controle da inflação e a retomada do crescimento
Crescimento econômico pífio, aumento da dívida pública, descontrole fiscal, desconfiança dos mercados, represamento de preços e uso político das empresas estatais.
Esse é o cenário no final do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff. O que é preciso para que nos próximos quatro anos a economia encontre o rumo e volte a crescer?
Para discutir o futuro da economia brasileira, o Estado, em parceria com o Insper, Instituto de Ensino e Pesquisa, reuniu especialistas na manhã do último 3 de dezembro, encerramento do ciclo Fóruns Estadão Brasil 2018.
Entre os temas dos debates, a nomeação do ministro da Fazenda Joaquim Levy e a Lei de Diretrizes Orçamentárias, a LDO. Na semana passada, o Congresso Nacional se dedicou a discutir e votar o projeto do governo federal que flexibiliza a meta fiscal para 2014. Para os especialistas, a medida é um sinal ruim, que indica falta de planejamento e de compromisso com as contas públicas.
O encontro, realizado na sede do instituto, na zona sul de São Paulo, também marcou o lançamento do livro que reúne as discussões, artigos e entrevistas dos seis temas anteriores do projeto: educação, segurança, saúde, agricultura, infraestrutura e meio ambiente. O documento será entregue à presidente da República e aos governadores eleitos em outubro. A série de Fóruns será retomada em 2015.
Retomada do crescimento depende de ajuste fiscal já
Foi unanimidade entre os economistas reunidos no último encontro dos Fóruns Estadão Brasil 2018, no dia 3, na sede do Insper, Instituto de Ensino e Pesquisa: o País precisa encarar um ajuste fiscal duro e imediato para que a economia reencontre o caminho do crescimento.
O debate marcou o lançamento do livro que reuniu artigos inéditos, entrevistas com especialistas e resumos dos encontros anteriores dos Fóruns – cujos temas foram Educação, Segurança,Saúde,Infraestrutura, Meio Ambiente e Agricultura. Ele será entregue à presidente Dilma Rousseff e aos governadores eleitos no pleito de outubro.
“Economia é como juiz de futebol. Quando está no centro do debate algo não está bom”, afirmou Marcos Lisboa, vice-presidente do Insper , logo na abertura do debate. O tema foi Perspectivas para os próximos anos: desafios fiscais e vulnerabilidade da economia.
Para Samuel Pessôa, economista da Fundação Getúlio Vargas e presidente do Instituto Brasileiro de Economia, “a forte desaceleração é fruto de uma experiência de política econômica que desorganizou a economia”. O economista se disse otimista com a indicação de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda, mas vê a necessidade de um componente adicional para a economia brasileira entrar nos eixos.
“Os próximos dois anos vão depender da capacidade dos operadores políticos”, afirmou. O governo terá de se articular no Congresso para aprovar as reformas necessárias.
Dívida pública. De acordo com Marcos Lisboa, pela magnitude dos valores e esforços envolvidos, a responsabilidade de equilibrar as contas públicas não é uma tarefa que cabe apenas a Joaquim Levy.“Isso não é tarefa de ministro da Fazenda, é agenda de governo, que tem grandes desafios, como a definição de uma agenda legislativa.” Lisboa faz críticas à confusa política de desoneração implantada no governo Dilma.“É a primeira vez que uma redução de impostos não melhora o ambiente de negócios”, afirmou. Na opinião de Lisboa, ações pontuais como o aumento do imposto da gasolina, a Cide, não são suficientes. “Se o ajuste for para valer, é preciso uma agenda clara sobre como os problemas reais serão enfrentados.”
O professor João Manoel Pinho de Mello, do Insper, definiu como péssimo o ambiente para negócios no Brasil: “Fomos piores que Coreia, Chile e Turquia.” De acordo com o professor, outro problema é “o risco de se investir no Brasil”, especialmente a longo prazo, caso dos projetos de infraestrutura. “O governo não sabe induzir competição, mas acredita que sabe mais que o mercado o que é o melhor retorno para o investimento.”
Crédito. A retomada do crescimento depende do crédito – algo que nos últimos anos funcionou para pessoas físicas, mas não para empresas. De acordo com o professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo, Carlos Eduardo Soares Gonçalves, a tarefa do governos erá vencer resistências no Partido dos Trabalhadores e no Congresso para uma reforma fiscal. “A presidente não acredita muito em reforma fiscal, mas há o risco de o País perder investimento, o que prejudica o fluxo de capitais.”
Para Gonçalves,um ajuste fiscal pode ser contracionista ou expansionista para a economia, dependendo do efeito dos juros de longo prazo na estabilidade econômica. Ele citou o exemplo da Dinamarca, que nos anos 1990 fez um ajuste fiscal da ordem de 10% do PIB – e depois disso viveu um período de grande crescimento econômico. O mesmo aconteceu com a Irlanda, que usou receita semelhante.
O cenário do mercado externo para negócios não é dos melhores. A Europa perdeu capacidade de retomada do crescimento por falta de investimentos privados e por ter ativos depreciados.“ Não deve crescer pelos próximos dez anos”, diz Gonçalves, que acredita que a atual retomada da economia americana pode vir acompanhada de aumento da taxa de juros.“ Se isso acontecer, vai depreciar o câmbio no Brasil e levar a um aumento dos juros por aqui”, diz Gonçalves. “E a China está ficando mais rica e por isso deve crescer a um ritmo menor”.
4 Perguntas para… Samuel Pessôa, economista da Fundação Getúlio Vargas
1.Qual é o maior desafio fiscal do Brasil?
Temos dois desafios. O primeiro é reconstruir o superávit primário. Vamos fechar este ano com déficit. O ideal é ter um superávit de 2%.
2.Por quê?
Para estabilizar a dívida pública. Se o governo não der sinais claros de que caminha neste rumo, perdemos o grau de investimentos no prazo de um ano e meio.
3.Qual é o segundo desafio?
São reformas nas leis que garantam que as taxas de gastos públicos não excedam a do crescimento do PIB. O problema não é só gastar mais do que ganhar. O problema é que os gastos estão subindo numa velocidade muito maior que a taxa de crescimento do PIB. Em 1999, a taxa da dívida pública era de 14,5%. Este ano, fechamos com 20%. Nunca foi tão rápido. O ideal é ter a mesma velocidade de crescimento.
4.E qual é a saída?
No início, o jeito será aumentar a carga tributária para que as contas se equilibrem. E em paralelo terão de ser feitas outras reformas fiscais que garantam estabilidade.
Melhores momentos?
Marcos Lisboa, Vice-presidente do Insper: “Sem um ajuste fiscal eu temo pelo futuro da economia.”
João Manoel Pinho de Mello, Economista do Insper: “Para a minha geração, o Brasil foi descoberto em 1994, quando abriu a economia.”
Carlos Eduardo S. Gonçalves, Economista da USP: “O ajuste da economia pode estar mais avançado do que se imagina.”
Fonte: O Estado de S. Paulo – 08/12/2014