29/04/2014
Auxiliar os pais a educar os filhos, com o objetivo de oferecer ferramentas que ajudem na formação das crianças. Focar os investimentos públicos no ensino da primeira infância e até mesmo no pré-natal. Discussões como essas, que vão além dos limites do espaço físico da escola, deram o tom dos Fóruns Estadão Brasil 2018 sobre educação, organizado em parceria com o Insper, centro de referência de geração de conhecimento nas áreas do ensino, administração, direito e engenharia, nas e de do instituto, na Vila Olímpia, zona sul de São Paulo.
Trata-se do primeiro de uma série de seis encontros que vão estimular a discussão analítica de temas importantes para a sociedade como segurança pública. Mobilidade urbana e saúde. “Numa época em que as informações são tantas, estabelecemos parceria com o centro de excelência de formação e de pesquisa, para promover um debate mais profundo”, disse Ricardo Gandur, diretor de conteúdo do Grupo Estado.
Foram duas mesas de debates, que contaram com uma plateia de 160 convidados. O primeiro encontro começou às 9h15 com a moderação de Marcos Lisboa, vice-presidente do Insper, que abriu o evento. Participaram os debatedores Daniel Santos, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (USP),o psicólogo João Batista Oliveira, fundador e presidente do Instituto Alfa e Beto, ONG geradora de políticas e práticas de educação que priorizam a alfabetização, e o psicólogo Ricardo Primi.
“O Brasil gastou menos, até os anos 1980, do que países como a Coreia, e usou esse dinheiro mal. Os indicadores de frequência na escola têm aumentado ao longo das últimas duas décadas, mas ainda há desafios”, disse Lisboa, logo de início. “Com a descentralização das verbas na educação, surgem iniciativas regionalizadas interessantes, mas que são pouco divulgadas. Isso porque não há monitoramento do que é feito no País. Há experiências e pesquisas que falam da importância de desenvolver o ensino não cognitivo, método usado no desenvolvimento das habilidades socioemocionais na pré-escola.”
Investimentos. O primeiro passo, proposto por João Batista Oliveira, é que a reflexão sobre o assunto não seja dominada só por interesses corporativos.“ Estamos em ano de eleição”,lembrou. “Mas precisamos resgatar o público, e o espaço público, para discutir a educação de fato.” Entre as ideias propostas, a de transferir verba do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), fundo especial ligado ao Ministério do Trabalho, para que os próprios pais cuidem melhor da educação dos filhos pequenos.
Criar uma espécie de “escola para pais” foi uma das sugestões que mais repercutiu entre os especialistas. De acordo com os debatedores, a criança precisa chegar preparada ao ensino público, com condições emocionais e habilidades, que sirvam de alavanca para o desempenho escolar. Até os 18 meses, os pequenos, em geral, têm um universo de 12 a 15 palavras, depois disso o desenvolvimento da linguagem é avassalador e as diferenças entre crianças com e sem suporte da família aparecem. “Depois não há como recuperar o gap na formação. As linhas dessas duas crianças não se encontrarão mais”, afirmou o psicólogo Roberto Primi.
“O segredo da educação infantil está na capacidade do adulto de entender as necessidades da criança. A infância é um exercício de preparação para a maturidade – um período feito não apenas para assistir TV no sofá, comendo chocolate”, disse Oliveira, do Instituto Alfa e Beto, referindo-se às creches, obrigação legal no Brasil. Para os especialistas, é preferível manter a criança em casa a mandá-la a uma creche ruim.
Leitura. A escola tem o papel de formadora. Os pais respondem pela educação informal, fundamental para o futuro da criança. “A transmissão social da pobreza acontece pela linguagem”, lembrou Oliveira.“Os livros são importantes para a conquista de um vocabulário rico. O hábito da leitura desde cedo é transformador.”
Muito da educação da criança é determinada pelos pais. Consequentemente, a formação dos filhos vai depender da história pregressa de seus familiares. “Os pais são o resultado da escola do passado. Eles ensinam com base nisso”, disse Primi. Daí a importância de passarem pela “segunda escola” para aprender como ajudar na educação dos filhos. Estabelecer vínculos afetivos sólidos continua a ser uma das lições de casa.
Daniel Santos
Economista
“Falamos do professor e da qualidade da escola. A gente esqueceu de olhar para a criança.”
“A qualidade da escola é sempre muito importante, mas fica ainda mais importante quando se fala em educação infantil. Uma escola de baixa qualidade pode trazer danos à criança. Melhor não ir para escola do que frequentar um colégio ruim.”
“O Brasil é criativo, mas peca por não aprender com seus erros.”
“A barganha que o Estado fez foi trocar salários por permissividade com os sindicatos.”
João Batista Oliveira
Fundador do Instituto Alfa e Beto
“Há instituições básicas do governo que dão dinheiro na escola. Algumas precisam ser repensadas, caso num momento em que a população envelhece e o número de crianças diminuiu.”
“Alfabetizar as crianças é fundamental e o Brasil ainda discute em que ano deve fazer isso. Qualquer pessoa sabe que se a criança vai para escola tem que saber ler e escrever.”
“A política pública deve assegurar que a criança venha ao mundo; tenha condições de sobreviver e chegue na escola pronta para aprender. Isso é importante para gerar conhecimento para creches e babás.”
Ricardo Primi
Psicólogo
“Potencial de aprender é a rapidez com que você aprende. Porém omais importante é esse processo de cristalização do conhecimento. E isso começa na infância.”
“A educação é importante para que a nossa sociedade desenvolva tecnologia, e não só consuma coisas.”
“O ideal seria criar uma escola atrelada ao pré-natal e pós-natal. Há necessidade de trabalhar com os pais antes que a criança entre na escola.”
“Evolução é um processo social.”
Fonte: O Estado de S. Paulo – SP – 25/04/2014