Especialistas debatem os excessos de informações vazadas em processos que estão sob sigilo judicial e as suas consequências para a sociedade

Desde 1988, a Constituição brasileira garante a livre expressão de opiniões, ideias e informações, sendo um marco para o país após o período de ditadura e garantindo a liberdade de imprensa. No entanto, os critérios para o exercício do regime de liberdade, principalmente em casos de publicação de informações que estão sob sigilo judicial, têm estado em evidência nos últimos anos com a Operação Lava Jato, as delações premiadas e os vazamentos.
O limite entre liberdade e sigilo foi tema do debate Liberdade de Expressão, Imprensa e Sigilo Judicial no Brasil, com abertura de Carlos Melo, professor de Ciências Políticas da escola. Dividido em dois painéis: O Sigilo no Regime de Liberdade de Imprensa e A Imprensa e o Sigilo, o assunto foi discutido pelos especialistas Marcio Schusterschitz da Silva Araújo, procurador federal, Marta Saad, especialista em Direito Processual, e pelos professores da escola Marina Coelho Araújo, do núcleo de Direito, e Carlos Eduardo Lins, do núcleo de Jornalismo.
“Há um dilema entre o direito às liberdades individuais, de proteção do indivíduo; e do interesse coletivo, da sociedade, de saber o que está acontecendo em processos nos campos da Política e da Economia. Neste cenário, as informações podem tanto virar arma política para que as investigações avancem como, por outro lado, a longo prazo, de pagarmos um preço muito alto, pois, quando esquecemos dos direitos individuais, é a própria sociedade que acaba sendo prejudicada”, destacou Melo na abertura do evento.
Para Araújo, professora do Insper Direito, é imprescindível que o sigilo seja respeitado para que não prejudique o julgamento do processo. “Se há o sigilo, isso é possível saber no site do tribunal, então não pode publicar. Isso pressiona a opinião pública, o juiz e tira a racionalidade da Justiça”, defende.
Saad concorda que a divulgação de informações sigilosas pode ser danosa para o processo, podendo inclusive influenciar nas ações dos juízes. “Não se garante que a própria defesa tenha acesso aos autos, mas terceiros, principalmente a imprensa, conseguem acessá-los antes mesmo do acusado ter conhecimento. ”
Araújo e Saad destacaram a importância de a imprensa adotar critérios para a divulgação das informações sigilosas e que se autorregule.
Lins destacou que esse processo de autorregulação já existe nos grandes veículos regidos pelos códigos de ética e manuais de redação, norteando o trabalho dos jornalistas nas redações, mas ainda são necessárias melhorias em sua aplicação. “Os vazamentos e quebras de sigilo não são questões relacionadas aos jornalistas, mas sim de quem detém e passa a informação para a imprensa”, argumenta.
Para o professor do Núcleo de Jornalismo do Insper, o principal foco da discussão não está na imprensa tradicional. “O problema dos que defendem o direito de censurar é que se preocupam com os veículos sérios e que fazem jornalismo de qualidade. Mas é impossível censurar os que não fazem jornalismo, que divulgam informações falsas e acabam com a vida das pessoas pelo WhatsApp, por exemplo. Fica tudo dependendo do julgamento individual das pessoas”, alerta.
“Uma das discussões que devem ser feitas é sobre o excesso de sigilo na Justiça”, propõe Schusterschitz. Para o procurador é necessária uma melhor discussão sobre o tema. “A democracia e o debate exigem um eleitorado participativo, esclarecido e atento. A imprensa existe para que esse debate possa acontecer.”
Para que Imprensa e Judiciário não entrem em atrito e acabem prejudicando a função um do outro é importante que cada um exerça o seu papel na avaliação de Saad.
“A publicidade é importante para a sociedade, mas também é necessário que exista uma preservação de cada função. Vivemos em um momento em que praticamente o Judiciário informa e a imprensa julga”, conclui a especialista em Direito Processual.
Confira o evento na integra em: