10/07/2017
Participação do professor Fernando Schuler
O deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ), relator da denúncia contra o Michel Temer na Câmara, leu na segunda-feira (10) seu parecer sobre o caso e defendeu que o plenário autorize a abertura de um processo por corrupção passiva contra o presidente da República.
Zveiter entendeu que há indícios de que houve crime na conduta de Temer e de seu ex-assessor especial Rodrigo Rocha Loures, flagrado recebendo uma mala com R$ 500 mil de um diretor da JBS, a maior processadora de carnes do mundo.
Segundo o relator, é importante, para a sociedade brasileira, que o processo seja aberto a fim de esclarecer tanto a entrega da mala de dinheiro como o diálogo comprometedor mantido entre Joesley Batista, um dos donos da JBS, e Temer, no Palácio do Jaburu, a residência oficial do peemedebista em Brasília.
Zveiter disse também que seu relatório aborda aspectos técnicos da denúncia, mas tem um forte componente “político”. Para o deputado fluminense, a análise mais detalhada do ponto de vista jurídico da denúncia e das provas caberá ao Supremo Tribunal Federal.
Após a leitura do parecer pelo deputado fluminense na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, o advogado de Temer, Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, fez a defesa do presidente, na qual alegou não haver provas de que o peemedebista cometeu crime e defendeu o arquivamento da denúncia.
O que vem agora
A CCJ, formada por 66 deputados, voltará a se reunir na quarta-feira (12), quando começará o debate sobre o parecer de Zveiter, o que pode levar mais de um dia. Se todos que têm direito à palavra decidirem falar, haverá pelo menos 36 horas seguidas de discussão, sem contar os inevitáveis atrasos e interrupções. Ao final, o parecer será votado no colegiado e, independentemente do resultado, o tema será em seguida submetido ao plenário da Casa, no qual votam os 513 deputados.
Se dois terços dos deputados aprovarem o prosseguimento da denúncia, ela é encaminhada ao Supremo, que então decidirá se autoriza ou não a abertura da ação penal. Caso ela seja aberta, Temer se torna réu e é afastado do cargo por 180 dias ou até o final do julgamento, e Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, assume a Presidência de forma interina.
O governo está mobilizado para tentar evitar uma derrota na comissão. Por meio de partidos da sua base de apoio, trocou em uma semana 20 dos 132 membros (titulares e suplentes) do colegiado.
Duas análises sobre o relatório
O Nexo pediu a dois cientistas políticos que avaliassem o impacto do relatório de Zveiter no andamento da denúncia contra Temer:
Leon Victor de Queiroz, cientista político e professor da UFCG (Universidade Federal de Campina Grande) Fernando Schuler, cientista político e professor do Insper.
Qual é a importância do voto do relator na Câmara?
LEON VICTOR DE QUEIROZ A importância do parecer do relator deriva do fato de que ele é a pessoa que teve maior contato com a matéria. Isso serve tanto em um tribunal, em um julgamento na Câmara ou em qualquer decisão colegiada no serviço público. E quem teve esse maior contato? Um deputado do partido do presidente da República, mas que tem uma formação jurídica e foi conselheiro federal da OAB [Ordem dos Advogados do Brasil]. Ele tem uma reputação a zelar perante seus pares, perante a OAB, então fez uma análise constitucional. Não teve juízo de mérito [se Temer é ou não culpado], mas sim de que o presidente necessita ser melhor investigado pelo Supremo para apurar se realmente houve ou não crime.
E tem outra questão: a imprensa – a opinião pública é importante, e a imprensa forma a opinião pública – vai noticiar que a investigação foi autorizada [pelo relator]. Quem votar contra o parecer estará votando contra a investigação, e isso tem uma relevância na hora que sair a lista dos que votaram para engavetar.
Os deputados mais sensíveis à opinião pública tendem a votar com o relator. Agora, [alguns] vão votar de acordo com a orientação dos partidos e as articulações que o Planalto está fazendo, trocando inclusive membros da CCJ.
FERNANDO SCHULER O relatório do deputado Sergio Zveiter foi assumidamente um pronunciamento político. Ao criar uma figura retórica, “in dubio pro societate”, ele reconhece não haver provas concretas do envolvimento do presidente nos delitos que lhe são atribuídos pela Procuradoria. Sua argumentação diz, simplesmente: já que existe alguma dúvida em torno da conduta do Presidente, vamos autorizar a investigação.
A tese, por óbvio, leva o debate para um terreno bastante subjetivo. O presidente é responsável pela conduta de todos os seus colaboradores? Isto se aplicaria também aos presidentes anteriores? É este o parâmetro que se deve utilizar para levar adiante um processo cujo desdobramento quase imediato é o afastamento do presidente da República de suas funções?
Neste terreno altamente subjetivo, a decisão é basicamente uma jogada política. Temer tem menos de 10% de apoio popular e estamos em um ano pré-eleitoral. Mesmo sendo do PMDB, Zveiter sabia que um voto diferente possivelmente lhe custaria a reeleição. Há muita gente na Câmara que pensa como ele, e agora tem um bom argumento para tomar sua decisão.