15/10/2013
Nobel para lógica de preços de ativos
Três acadêmicos americanos ganharam o Prêmio Nobel de Economia por seus trabalhos pioneiros sobre os mercados financeiros, que transformaram a gestão de carteiras e a precificação de ativos e inauguraram o estudo de como as emoções afetam as decisões de investimento. Eugene Fama e Lars Peter Hansen, da Universidade de Chicago, e Robert Shiller, da Universidade de Yale, foram premiados por seus estudos sobre “a análise empírica dos preços dos ativos”. Fama, de 74 anos, é visto por muitos como o pai das finanças modernas por seu trabalho dos anos 60 sobre a teoria dos mercados eficientes. Suas conclusões desmentiram as noções de que se podia tentar lucrar prevendo o mercado ou as ações a cada momento – e deu origem à indústria dos fundos de índice. Shiller concluiu 20 anos depois que a eficiência de curto prazo dos mercados era menos duradoura ao longo de períodos mais extensos. Hansen apresentou uma ferramenta econométrica para estudar as mudanças na precificação de ativos. Três acadêmicos americanos ganharam o Prêmio Nobel de Economia por seu trabalho pioneiro sobre os mercados financeiros, que transformou a gestão de carteiras e a precificação de ativos e inaugurou o estudo de como as emoções afetam as decisões de investimento. A Real Academia Sueca de Ciências concedeu ontem o prêmio a Eugene Fama e Lars Peter Hansen, da Universidade de Chicago, e a Robert Shiller, da Universidade de Yale, citando os seus estudos pioneiros, que são complementares, porém foram realizados de modo independente, sobre “a análise empírica do preço dos ativos”. Os laureados se concentraram na forma com que são definidos os preços das ações e dos títulos, mas suas constatações têm implicações que vão muito além dos mercados financeiros. Todos os aspectos da macroeconomia são afetados pela tolerância ao risco – bem como pelos atos, racionais e irracionais, que incentivam os indivíduos e as empresas a investir ou a poupar dinheiro. “Ainda temos neste país [EUA] um senso de colaboração que vai emergir e evitar um default [da dívida pública]” (Robert Shiller, falando ontem após vencer o Nobel de Economia) Mark Gertler, economista da Universidade de Nova York, atualmente em licença sabática na Universidade Columbia, disse que a escolha não foi uma surpresa. “Todos eles estavam na seleta lista [dos indicados ao Nobel] há muitos anos”, disse. “O interessante é a forma como os três se conectam.” Fama, de 74 anos de idade, é visto por muitos como o pai das finanças modernas pelo seu trabalho, dos anos 60, sobre a teoria dos mercados eficientes. Depois de ter pouco sucesso na escolha de ações, Fama concluiu que os mercados eram eficientes dentro de um período do dia a dia ou de mês a mês. Eles absorviam as informações mais recentes de maneira rápida e integrada e geravam preços exatos para os ativos. A conclusão desmentiu as noções de que se podia tentar lucrar prevendo o mercado ou as ações a cada momento – e deu origem ao setor de fundos de investimento. Lars Peter Hansen, de 60 anos, também professor da Universidade de Chicago Shiller concluiu 20 anos depois que a eficiência de curto prazo dos mercados era menos duradoura ao longo de períodos mais extensos. Ele examinou por que os preços dos ativos eram voláteis demais para serem justificados pelos dados fundamentais, como os dividendos. Em períodos de três a cinco anos, os preços oscilavam por uma série de razões, tais como a aversão dos investidores ao risco, seu otimismo ou pessimismo. Nasceu assim o campo da economia comportamental, com os estudiosos tentando compreender o que há por trás das mudanças nas atitudes dos investidores em relação à tolerância ao risco e às decisões de risco. Ao mesmo tempo, Hansen estava trabalhando em questões sobre a previsibilidade do mercado e apresentou uma ferramenta para estudar as mudanças na precificação de ativos. Isso levou ao seu Método Generalizado dos Momentos, ferramenta econométrica que hoje é um teorema padrão da economia, aplicável em todo o campo e não apenas aos mercados financeiros. O Teorema de Hansen é “absolutamente espetacular”, disse John Cochrane, professor da Faculdade de Administração Booth, da Universidade de Chicago. “Parece muito complicado, mas ele levou a coisa para outra dimensão (…) e viu que é algo gloriosamente simples.” “Precificar errado os ativos pode contribuir para crises financeiras (…), e essas crises podem afetar a economia geral” (Eugene Fama, ao comentar o seu trabalho, premiado com o Nobel) Aos 60 anos, Hansen é o mais jovem dos vencedores do Nobel de Economia deste ano. “Ultimamente tenho me sentido velho”, disse ele. “Mas isso me dá a sensação de ser jovem.” Ele disse que seu trabalho sobre o teorema data do tempo em que fazia pós-graduação e começava a lecionar, sendo orientado pelos vencedores do Nobel de 2011, Thomas Sargent e Christopher Sims. Cochrane, que é genro de Fama, além de seu colega, disse ontem que, depois de saber da decisão do painel do Prêmio Nobel, seu sogro retomou sua rotina normal, dando aula na Universidade de Chicago, seu domicílio profissional há 54 anos. Embora Fama tenha trocado o tênis e o windsurf pelo golfe, ele não dá nenhum sinal de estar desacelerando o ritmo, disse Cochrane. Shiller, 67, é um dos criadores do Índice de Preços de Imóveis Case-Shiller, da Standard & Poors, que acompanha a trajetória do valor dos imóveis nos Estados Unidos. Numa coletiva de imprensa ontem em New Haven, no Estado americano de Connecticut, Shiller afirmou que muitos campos, incluindo o Direito, a Sociologia e a História, contribuíram para a formação dos seus estudos e que sua esposa, que é psicóloga, “contribuiu na formação do meu trabalho de uma maneira fundamental”. AP / APRobert Shiller, de 67 anos, professor de Finanças na Universidade de Yale Shiller está trabalhando em outro livro com George Akerlof, um dos vencedores do Nobel de 2001, que é casado com Janet Yellen, indicada para suceder a Ben Bernanke como presidente do Federal Reserve, o banco central americano. O trabalho trata das manipulações e enganos na Economia. O livro anterior do autor foi “O Espírito Animal – Como a psicologia humana impulsiona a economia e a sua importância para o capitalismo global”. Os prêmios de ontem acrescentam mais três especialistas baseados nos Estados Unidos aos laureados com o Nobel deste ano. Há uma semana, três cientistas que trabalham nos EUA ganharam o Prêmio Nobel de Medicina. Dois dias depois, três cientistas trabalhando nos Estados Unidos venceram o prêmio de Química. (Colaborou Niclas Rolander.) Shiller alertou para risco de bolha imobiliária no Brasil Robert Shiller, que recebeu o Nobel de Economia ontem, fez um alerta sobre a existência de uma bolha imobiliária no Brasil, em palestra no fim de agosto. Professor da Universidade de Yale e referência em finanças comportamentais, Shiller afirmou não ter encontrado motivos que justificassem o fato de os preços de imóveis em São Paulo e no Rio terem mais que dobrado em cinco anos. Com a ressalva de que não conhecia o mercado brasileiro a fundo, Shiller observou na ocasião que há algo de errado quando os preços assumem uma direção única. “Isso me lembra o Japão, onde os preços dispararam em 1980, com um pico no começo dos anos 1990, e depois caíram fortemente”, disse o professor em apresentação no 6º Congresso Internacional de Mercados Financeiro e de Capitais, promovido pela BM&FBovespa, em Campos do Jordão. Estudioso das bolhas na economia e seus efeitos, Shiller previu as crises de 2000 e 2008 nos Estados Unidos. Para ele, bolha é uma espécie de epidemia social, que ocorre quando as pessoas se entusiasmam tanto com determinado tipo de investimento que espalham esse entusiasmo a outras pessoas. Na linha de pensamento de Shiller, a psicologia e a sociologia têm grande importância no comportamento financeiro das pessoas. Por isso, as expectativas racionais são meias verdades. Ele recebeu o Nobel da Economia ao lado de Eugene Fama e Lars Peter Hansen, ambos da Universidade de Chicago. O trio foi premiado por seus trabalhos de análise empírica de preços de ativos. Prêmio foi compartilhado de uma forma eficiente À primeira vista, a ideia de que o Nobel de Economia seja compartilhado por Eugene Fama e Robert Shiller soa absurda; seria como fazer Keynes e Friedman compartilharem a premiação. Afinal de contas, o primeiro, da Universidade de Chicago, é o pai da hipótese dos mercados eficientes, ao passo que Shiller, da Universidade Yale, é seu crítico mais conhecido. No entanto, foi anunciado ontem que eles compartilharão o prêmio deste ano, juntamente com Lars Peter Hansen, acadêmico também da Universidade de Chicago, homenageado por seu trabalho com modelagem dinâmica. A hipótese dos mercados eficientes deu origem a muitos instrumentos financeiros modernos, inclusive os fundos de índices, mas é fácil ridicularizá-la. Em sua forma extrema, ela sugere que o preço de um ativo é sempre o preço certo, ou, em outras palavras, que o preço de mercado incorpora sempre todas as informações conhecidas. As bolhas e falhas das últimas duas décadas parecem incompatíveis com isso. Shiller aplicou psicologia comportamental para mostrar que os mercados muitas vezes comportam-se de modo irracional. Seu livro “Exuberância Irracional” foi publicado pouco antes do estouro da bolha pontocom, em 2000, quando ele advertiu para uma bolha imobiliária nos EUA – isso antes de os preços dos imóveis caírem. Mas há uma justificativa para um prêmio conjunto. Em primeiro lugar, a hipótese de Fama não tem um desempenho tão ruim; continua sendo extremamente difícil para qualquer investidor conseguir um desempenho superior ao comportamento do mercado. Em segundo lugar, Fama publicou uma bateria de dados que, muitos argumentam, minaram sua teoria. Os dados mostram que, no longo prazo, as ações de empresas de menor porte que parecem baratas em comparação com os fundamentos tendem a superar a média do mercado. Fama elogiou Shiller, mas negou que o crash de 2008 mostrou que os mercados são ineficientes. “O mundo é incerto. A volatilidade foi muito alta em 2008, mas a volatilidade é sempre muito alta nos momentos difíceis. Isso é exatamente o que seria de se esperar em um mercado eficiente.” Talvez ironicamente, ele acrescentou: “Eu achei que foi uma grande experiência que validou a teoria. Mas fui a única pessoa no mundo que viu a coisa desse jeito”. Preço de ativos continua sendo um debate quente Sem dúvida há um sabor pós-crise no Prêmio Nobel de Economia deste ano. Os economistas americanos Eugene F. Fama, Lars Peter Hansen e Robert J. Shiller ganharam o prêmio por sua “análise empírica dos preços dos ativos”. Os três têm um forte histórico como economistas em busca de uma compreensão mais profunda do preço e do valor dos ativos para além dos mecanismos voláteis, e muitas vezes irracionais, do dia a dia do mercado. Eis um trecho de um perfil dos laureados, publicado ontem pela Fundação Nobel: “Fama, Hansen e Shiller desenvolveram novos métodos para o estudo do preço dos ativos e os utilizaram em suas pesquisas de dados detalhados sobre o preço das ações, títulos e outros ativos. Seus métodos se tornaram ferramentas padrão na pesquisa acadêmica, e suas percepções fornecem uma orientação para o desenvolvimento da teoria, bem como para a prática profissional dos investimentos. Apesar de ainda não compreendermos plenamente de que modo os preços dos ativos são definidos, a pesquisa dos Laureados revelou uma série de regularidades importantes que estão nos ajudando a chegar a melhores explicações. ” Shiller, da Universidade Yale, é provavelmente o mais conhecido pelos participantes do mercado financeiro, já que seu nome está em vários índices de preços residenciais Case-Shiller, que ocasionalmente conquista as manchetes, e por seu livro “Exuberância Irracional” (Editora Saraiva), onde dizia que os mercados da época das pontocom estavam supervalorizados. Seu argumento acabou se revelando uma previsão certeira. Fama é outro obcecado pelo preço dos ativos. É professor da Faculdade de Administração Booth, da Universidade de Chicago, a qual vai firmando ainda mais sua longa predominância na área da economia de mercado com a inclusão de Hansen nos vencedores do Nobel de Economia deste ano. Os últimos cinco anos de crise financeira abriram cruelmente os olhos do mundo para a farsa da precificação dos ativos no mercado, em especial no campo dos derivativos mais complexos e dos ativos de alto risco, como o banco Lehman Brothers descobriu em 2008. Naturalmente, há os que se preocupam por considerar que os mercados continuam até hoje com os preços seriamente mal avaliados. Como exemplo, as ações resistem a cair muito abaixo de picos recordes de vários anos, apesar da ameaça da paralisação do governo dos EUA, e, possivelmente, de uma moratória da dívida do país. Além disso, também não se sabe se qualquer índice estaria perto dos níveis atuais sem o estímulo do governo. E isso continua sendo um problema cinco anos após a quebra do Lehman. Se alguma vez já precisamos de uma análise fria e objetiva da precificação dos ativos, o momento é agora. Economistas brasileiros elogiam a premiação Ex-alunos de Eugene Fama e de Lars Peter Hansen, economistas brasileiros apontam a capacidade dos premiados na articulação de modelos econométricos complexos com teoria econômica. Aluno de Hansen, na Universidade de Chicago, em 1994, Fernando Veloso, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV-Rio), afirma que o premiado tem um “abordagem típica” do departamento de economia de Chicago, “que é uma postura de encarar a economia seriamente como ciência, a partir do desenvolvimento de modelos econométricos sofisticados”. Uma das grandes questões levantadas pela crise econômica mais recente, diz Veloso, foi como incorporar o aspecto financeiro a modelos macroeconômicos, e Hansen tem feito isso muito bem. Uma de suas grandes contribuição, cita, foi desenvolver método econométrico para testar expectativas racionais aplicadas às finanças. “Hansen sempre teve postura de cientista: extremamente curioso e empolgado”, diz Veloso. “É uma pessoa muito fácil de lidar, não tem estrelismo”, completa. Aloisio Araújo, professor de economia da FGV-Rio, conheceu Hansen quando foi professor-visitante em Chicago e elogiou o premiado, dizendo que “é um cientista extremamente dedicado ao trabalho”. Ex-aluno de Fama, na mesma Chicago, entre 1998 e 1999, Ricardo Dias Brito, professor de economia do Insper, entende que Fama revolucionou a indústria de fundos de investimentos. “Finanças pré-Fama são um outro mundo”, diz. No período pré-Fama, na explicação de Brito, acreditava-se que uma pessoa que gastasse algum tempo selecionando quais ações comprar dentro de um conjunto de ações, “bateria” o mercado; ou seja, ganharia mais dinheiro do que a média do mercado. “Lá atrás, só havia fundo de investimento ativo, aquele que fica olhando para o conjunto das ações e escolhendo aquelas que acha as mais baratas e, portanto, as que seriam consideradas boas compras”, diz Brito”. “Uma das coisas que Fama provou é que isso não é verdade”, complementa. Fama mostrou que os fundos ativos têm retornos iguais aos fundos passivos. Mas os fundos passivos possuem uma vantagem adicional em relação aos fundos ativos: custos menores da sua estrutura operacional e, por conta disso, podem cobrar taxas de administração menores, aumentando assim os retornos finais para os cotistas. São considerados fundos passivos aqueles que compram ações de todas as empresas disponíveis, têm um portfólio diversificado, mas não têm tantos custos com gestores que indicam o tempo todo quais ações devem ser compradas. “Ao ter um custo de funcionamento menor, cobra-se taxa de administração menor, “e aí sim as pessoas conseguem levar para casa um retorno maior”. Segundo Brito, Fama mostrou que não adianta fazer uma seleção de ações, pois o mercado seria eficiente e, nessa medida, os preços dos ativos estariam corretos. “Há anos, as pessoas esperavam que ele ganhasse esse prêmio. Sob o ponto de vista de muita gente, o prêmio veio tarde. Eu também acho isso. Ele fez por merecer há muito tempo”, disse.
Fonte: Valor Econômico Data: 15/10/13 |