19/08/2014
A expansão do acesso ao ensino superior no Brasil pode ser considerada, ao mesmo tempo, uma das maiores realizações dos últimos governos – Fernando Henrique, Lula e Dilma – e também uma das mais problemáticas.Especialistas ouvidos pelo Valor são unânimes em apontar a importância do maior acesso dos brasileiros à universidade. É um processo que precisa continuar. Mas se o próximo governo quiser tornar o ensino superior um avanço real para o país, terá de atacar seu principal problema: a falta de qualidade.
“A ideia de expansão é correta, porque o Brasil tem baixa porcentagem de população no ensino superior”, afirma o sociólogo Simon Schwartzman, presidente do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets) e ex-presidente do IBGE.“Mas a maior parte dos que estão entrando na faculdade não vai atrás do ensino tradicional ou não vai terminar o curso.”
São dois problemas, diz: a expansão está aquém do necessário e não foi acompanhada de uma preocupação com a melhoria do ensino superior. “Cresceram mais os cursos mais fáceis de montar e mais baratos, que não requerem grandes instalações, como administração, direito e economia, mas não os cursos de alto nível. Muita gente se forma em direito e depois não passa no exame da OAB.”
Para Schwartzman, não há uma política clara de excelência, que privilegie as melhores instituições de ensino com a dotação de mais recursos, como ocorre no exterior. “Enquanto o país está formando mais gente, o mercado de trabalho se queixa da falta de gente qualificada.”
Schwartzman observa que “o Plano Nacional de Educação fala em expansão do ensino superior, mas isso vai criar uma situação financeira muito complicada para o governo”. A razão é que “não estão sendo observados critérios de qualidade, nem acadêmica nem do ponto de vista do mercado de trabalho, para realizar essa inclusão”. Muitos entram na universidade e não conseguem concluir o curso . A evasão leva a perda de receita, inviabiliza a existência das instituições privadas e causa rombos no crédito educativo do governo. “O aluno que toma um crédito educativo só vai pagar algum tempo depois de formado. Se ele não se forma, não paga.”
E, quando se forma, pode estar se tornando vítima de um “estelionato”, na expressão de João Grandino Rodas, professor titular de direito e ex-reitor da Universidade de São Paulo (USP), de 2010 a 2014.É o que acontece “quando o jovem obtém um diploma sem ter as mínimas condições de exercer a profissão, quer por falta de preparo básico, quer por falta de mercado de trabalho”.
Com apenas 12% de adultos com ensino superior, o Brasil se encontra muito abaixo da média dos países da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), de 35%. Organismos internacionais. como a própria OCDE e a Organização das Nações Unidas, consideram necessário ter pelo menos um terço da população adulta com formação universitária para manter o dinamismo econômico e social de um país.
“O que aconteceu no Brasil é que, nos últimos 15 anos, foram criadas inúmeras universidades sem nenhuma preocupação especial com qualidade e excelência”, afirma o físico e professor da USP José Goldemberg. Para ele, o país tem grande número de faculdades pagas nas quais a qualidade deixa a desejar. O governo criou um sistema de financiamentos e bolsas de estudo que facilita a vida dos estudantes, “mas a preocupação em ter um corpo docente qualificado, que demonstre excelência, não foi pensada”. Rodas fala em “preparação inadequada de parte do corpo docente, tanto no que se refere ao conteúdo, quanto à didática”.
As carreiras de docentes são pouco estimuladas, na visão de Roberto Lobo, ex-reitor da Universidade de São Paulo (1990-1993), fundador e dirigente do Instituto Lobo para o Desenvolvimento da Educação , da Ciência e da Tecnologia. “O bom professor, aquele que ensina, é pouco valorizado.” Segundo ele, as avaliações só levam em consideração trabalhos publicados. No tripé acadêmico – ensino, pesquisa e extensão – só se dá importância à pesquisa. “O professor pode ensinar e fazer pesquisa, mas o papel fundamental dele é ensinar. Seria preciso avaliar melhor esses professores, para que as instituições passassem a valorizá-los, valorizar a carreira.”
A falta de capacitação dos professores é também um problema que afeta as fases anteriores do ensino, afirma Lobo. “A formação de professores hoje é muito deficiente. Os cursos de licenciatura são fracos. Os professores do ensino básico e médio não estão bem preparados e não têm perspectivas de carreira. Isso influencia o resultado do ensino superior.”
“A expansão do ensino superior vai criar uma situação financeira muito complicada para o governo”, prevê Simon Schwartzman A expansão dos cursos universitários menos exigentes em matéria de instalações é alvo de críticas generalizadas. A maioria condena o modelo por considerar que o país precisa menos de administradores e mais de engenheiros e outras profissões técnicas ou tecnológicas, da área das ciências exatas. Mas há também quem observe que o problema não é formar muitos administradores de empresas.
Ao contrário. Uma das muitas carências do Brasil é a oferta de gestores. Ocorre, porém, que os formados nessas profissões não correspondem às exigências do mercado.
É o que diz, por exemplo, o filósofo Renato Janine Ribeiro, professor titular da Universidade de São Paulo e colunista do Valor. Segundo ele, os cursos mais fáceis de montar são administração, direito e pedagogia. “Não há dúvida de que precisamos de administradores e professores, mas esses cursos não conseguem formar pessoas capazes de fazer uma revolução no ensino, nem na gestão.” A explicação para isso está na qualidade da formação. “São cursos fracos.” A formação não é suficiente diante dos desafios. “É um problema sério do Brasil: 70% ou mais dos formados em administração nunca vão conseguir ser administradores, enquanto temos problema sério de gestão pública e privada.”
O modelo tecnológico é apontado como o mais adequado para o país. “Existem muitas pessoas, eu inclusive, que têm uma visão de ensino superior voltado para formar uma elite tecnológica que promova o desenvolvimento do país”, afirma Goldemberg.
Ex-reitor da USP (1986-1990) e ex-ministro da Educação (1991-1992), Goldemberg defende um modelo semelhante ao implementado pela Coreia do Sul e outros países asiáticos: foco no ensino das ciências exatas e alto grau de competitividade.“Há 50 anos, a Coreia era um país mais atrasado que o Brasil. Hoje, está mais avançada, porque lá o ensino superior é uma preocupação fundamental não só do governo, mas da sociedade como um todo. A ênfase é na qualidade.”
Goldemberg demonstra certo desconforto com as origens do ensino superior brasileiro, baseado na tradição humanística francesa. Para ele, as universidades brasileiras foram criadas “muito tarde” – a USP é de 1934 – e padecem de uma “característica cultural, não tecnológica, que atrapalha o Brasil hoje.”
Goldemberg aponta o programa Ciência sem Fronteiras, do governo federal, que envia estudantes para outros países, como uma tentativa de melhorar a universidade brasileira ao expô-la ao contato das melhores instituições do exterior, mas argumenta que nem assim o país alcança a qualidade necessária.Segundo ele, os estudantes não dominam outros idiomas e, em boa parte, acabam se concentrando em Portugal. (A página do programa na internet mostra que Portugal conta hoje com 623 bolsistas brasileiros do Ciência sem Fronteiras, enquanto na Alemanha são 2.318 e nos Estados Unidos, 10.837.)
O problema da qualidade não está atrelado a uma suposta carência de recursos financeiros, pretexto padrão para nove entre dez mazelas da administração pública brasileira. A questão é burocrática. As universidades federais não têm autonomia financeira – ao contrário do que ocorre com as estaduais de São Paulo (USP, Unesp e Unicamp). Elas se tornam caras e não conseguem qualificar seu corpo docente, por falta de um plano de carreira que privilegie a melhoria contínua dos professores, afirma Goldemberg.
Ele diz que os professores das universidades federais recém-criadas “são muito jovens”, sem o preparo necessário, e estão aproveitando as primeiras oportunidades de concurso público para se tornarem “funcionários efetivos”, sem se comprometer com a formação acadêmica.
Mesmo assim, os salários são maiores que os da USP, a melhor universidade brasileira em diferentes rankings nacionais e internacionais. De acordo com Goldemberg, um professor titular de uma federal recebe mensalmente em torno de R$ 15 mil. “É um salário de padrão internacional”, comenta. “Se você for às instituições dos Estados Unidos, vai ver que são salários parecidos, mas sem a mesma exigência de qualificação.” Estudo do Boston College indica que um professor universitário no topo da carreira ganha o equivalente a US$ 4,6 mil no Brasil, valor próximo ao do salário de um professor japonês ou francês, mas metade do que se paga no Canadá ou nos Estados Unidos.
O ex-ministro defende o modelo da USP, no qual se valoriza o desempenho. Mesmo assim, nem todas as suas áreas seguem o modelo, diz. “Para progredir na USP é preciso fazer mestrado, doutorado. As pessoas não se tornam professores titulares rapidamente. Existe uma série de barreiras. Exige-se que os professores jovens trabalhem bastante para alcançar as posições mais elevadas. Essas universidades federais que estão sendo criadas têm sido povoadas por professores jovens, que não passaram por esse crivo. E isso terá um custo enorme no futuro, porque vão se constituir numa barreira para a melhoria da universidade.”
“A USP gasta R$ 4 bilhões por ano, poderia oferecer mais”, diz Schwartzman. “Ela também está na lógica da expansão, embora não seja federal.” Essa expansão pode ser uma das causas que têm levado à queda das universidades brasileiras nos rankings internacionais. Este ano, a USP caiu no ranking “reputacional” da Times Higher Education. A instituição, que no ano passado figurava no intervalo entre o 61º e o 70º lugares, recuou para a faixa seguinte – da 81ª à 90ª posição. No QS Quacquarelli Symonds University Ranking da América Latina, a USP perdeu a liderança pela primeira vez para a Universidade Católica do Chile.
A queda nos rankings não tem tanta importância, porque isso pode ocorrer de um ano para outro, diz Lobo. Até então, a USP vinha subindo sistematicamente. É preciso ficar atento caso continue caindo. “Aí precisamos ver o que está acontecendo.”
Na queda, a universidade pode ter ficado “inexoravelmente para trás, como está acontecendo com as universidades latino-americanas em geral”, diz Rodas. “Com referência à USP, as greves e as dissensões internas, assim como a ausência de continuidade administrativa em aspectos básicos, a estão levando para baixo, inclusive no tocante aos rankings globais e regionais.
” Lobo tem uma avaliação que se assemelha à de Schwartzman e, em parte, à de Goldemberg. “Até acho que a USP poderia render mais do que rende, mas isso é outra história. Acho que é uma questão de gestão, que toda instituição pública deveria cobrar mais de seus funcionários, procurar processos de avaliação mais rígidos do corpo docente e até estabelecer metas, inclusive de posicionamento nos rankings internacionais.
” Os rankings são muito diferentes entre si e utilizam critérios baseados no sistema anglo -saxão de ensino superior, a fim de minimizar a importância da queda”, diz Janine. “É um modelo tecnológico, avesso à área de humanas e muito distinto do que se pratica no Brasil.”
Naércio Menezes, coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, colunista do Valor, também considera importante aumentar a formação nas áreas de ciências exatas. Ele entende que o crescimento do número de formandos em administração, pedagogia e direito decorre de forma natural do aumento de renda da população menos assistida, que escolhe esses cursos como os mais acessíveis ou os únicos possíveis, em um universo de possibilidades limitado.
Essa abertura começou na administração de Paulo Renato Souza no Ministério da Educação (1995-2002, governo Fernando Henrique), diz Menezes, quando a desregulamentação do setor abriu espaço para o crescimento das instituições privadas e para a multiplicação das universidades particulares. O crescimento prosseguiu nos governos Lula e Dilma, com a ampliação da rede federal. Até este ano, foram criadas 47 universidades e institutos federais de educação , ciência e tecnologia.
“Por falta de acesso ao crédito, principalmente no passado, hoje menos, as pessoas iam para as carreiras mais baratas e mais fáceis”, comenta Menezes. “É preciso mudar isso, porque os diferenciais de salários mostram que os maiores gargalos estão em engenharia e outras áreas de exatas.” “Muitas pessoas, eu inclusive, têm uma visão de ensino superior voltado para formar uma elite tecnológica” diz José Goldemberg.
Ele entende que as novas modalidades de financiamento do ensino superior ajudam a mudar essa realidade, mas não tem certeza se o Programa de Financiamento Estudantil (Fies) e o Programa Universidade para Todos (Prouni) são suficientes para compensar as necessidades e cobrir definitivamente essas defasagens.
Na visão de Menezes, o principal gargalo nem é o descompasso entre oferta e demanda de cursos mais ou menos tecnológicos, mas a baixíssima qualidade do ensino básico e médio. A formação deficiente acaba comprometendo o curso superior. Ele cita a alta evasão no ensino médio como um dos problemas. Os dados mais recentes, de 2012, do levantamento Todos pela Educação , indicam que apenas 52% dos jovens em idade escolar que concluíram o ensino fundamental estavam matriculados no ensino médio.
“Os que completam o ensino médio em geral apresentam qualidade muito baixa em matemática e leitura, o que dificulta muito o acesso ao ensino superior, principalmente em cursos mais difíceis, como os de exatas”, diz Menezes. As deficiências são tantas, que boa parte das instituições de ensino superior consome parte do período letivo, principalmente no início das atividades, para sanar parcialmente deficiências de matemática, leitura e, eventualmente, de história, comenta Janine. “É um trabalho de alcance limitado, porque anos e anos de atraso precisam ser cobertos em algumas semanas.”
Para Menezes, “é difícil separar a qualidade do curso superior da qualidade dos alunos”. Enquanto os jovens continuarem chegando mal preparados à universidade, a média dos cursos superiores será necessariamente ruim. É por essa razão que estudantes mais pobres “vão ficando para trás”: justamente porque frequentam um ensino médio e fundamental de qualidade inferior, acabam entrando em faculdades ou universidades de menor padrão – quando entram.
“O Brasil tem um desempenho pífio no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes [Pisa, na sigla em inglês] em relação a outros países”, observa Menezes. Dados do programa divulgados no início deste ano mostram que o Brasil foi um dos países que mais avançou nos indicadores de ensino, mas continua entre os últimos avaliados. Em um ranking de 65 países, o Brasil está em 55º em leitura (compreensão de textos), 58º em matemática e 59º em ciências.
Menezes é contra a atitude, que considera paternalista, de se criarem barreiras à existência de cursos de menor qualidade. Embora considere que o ideal é conciliar as duas coisas, seria preferível ter uma oferta maior de cursos superiores e dela extrair alguns com mais qualidade.
Em seu entendimento, cursos de padrão inferior não são ideais, mas atendem a uma demanda e permitem que quem não tem acesso a um ensino de qualidade possa se valer desses cursos para melhorar de vida. O ensino superior é usado por muitos para complementar deficiências do ensino médio e para galgar posições no mercado de trabalho. Desse modo, esses cursos têm, bem ou mal, uma função relevante. “A pessoa acaba aprendendo alguma coisa e, mesmo que não suba muito de posição, social, vai ganhar mais”, argumenta.
Para Menezes, o Ministério da Educação tem a função de avaliar todos os cursos e divulgar amplamente os resultados. “As instituições acabam suprindo desejos da população. Tem muita diversificação de preço e qualidade porque as pessoas escolhem o melhor para si em termos de custo-benefício”, diz. “Não cabe a nós escolhermos por elas.” Ele acha que o governo só deve se preocupar com a qualidade dos cursos que implicam riscos, como no caso das faculdades de medicina. O restante irá se desenvolvendo com a demanda e melhorando de nível conforme as exigências.
Um exemplo da capacidade de adaptação do mercado às necessidades são os chamados cursos tecnológicos. Embora estejam disponíveis também na rede pública, é nas faculdades e universidades privadas que vicejam, afirma Schwartzman. “Tenho dados de 2012 que mostram que havia 800 mil alunos matriculados em ensino superior tecnológico, contra apenas 200 mil no governo [instituições públicas federais]. Quem faz isso bem, embora pouco também, é a Fundação Paula Souza, que comanda as Fatecs [Faculdades de Tecnologia] de São Paulo.”
Schwartzman considera inadequada a denominação “tecnológicos” para cursos superiores de curta duração e de conteúdo mais técnico, focado no mercado de trabalho, porque nem sempre são tão tecnológicos assim. Mas entende que representam oportunidade importante para a formação de mão de obra. “Falta ênfase maior no ensino técnico de nível universitário, só que o setor produtivo deveria participar mais da elaboração, para definir melhor que tipo de mão de obra será formada, de acordo com as necessidades”.
Cursos tecnológicos suprem necessidades em menos tempo e podem ser boas alternativas para pessoas que não possam frequentar um ensino mais longo, diz Menezes. É bom que foquem mais no aspecto técnico, no qual o país enfrenta grande carência de profissionais.
Cursos mais curtos e mais focados trazem algumas vantagens. A primeira e mais evidente é a facilidade de inserção profissional. A segunda reside no custo, que acaba influenciando decisivamente a terceira: a redução da evasão. Grande parte da evasão se dá porque a entrada na universidade retarda ou, no mínimo, limita a participação do jovem no mercado de trabalho. Aquele jovem, mesmo que estude em uma instituição gratuita, vai precisar ser financiado enquanto não estiver no mercado – seja pelo Estado, seja pela família.
Deficiências do ensino básico e médio acabam tendo que ser cobertas em salas de aula ainda na universidade, lembra Janine Ribeiro Lobo acredita que os cursos tecnológicos podem ser bons, “desde que funcionem em um sistema semelhante ao europeu, no qual se valorizam profissionais para o mercado de trabalho”. Em sua visão, o mercado brasileiro “não está entendendo onde deve usar tecnólogo e onde usar bacharel”.
Outro ponto falho apontado por Goldemberg é a pesquisa. “A universidade só vai ser boa se houver pesquisa. Se não houver pesquisa, vai reproduzir conhecimento. Vai ter o mínimo de laboratório possível. Se quiser uma universidade mais dinâmica, precisa ter pesquisa, porque pesquisa melhora o ensino.”
Para Menezes, pesquisa é importante, mas precisa ser circunscrita aos locais em que faz sentido: as instituições de excelência. “Tem de ser coisa de poucas universidades. Pesquisa é algo muito caro e não há necessidade de tantos professores doutores. Precisa ficar restrita a alguns centros, polos regionais. A maioria das faculdades deve se dedicar a ensino de qualidade.”
Janine acredita que um salto de qualidade pode se dar com a mudança de mentalidade. Ele defende a mudança dos currículos dos cursos de bacharelado, hoje muito ligados à ideia de profissão. Isso permitiria que as pessoas transitassem entre diferentes atividades profissionais ao longo da vida. “Hoje, mudar de rumo profissional é considerado um defeito. Deveria passar a ser visto como uma coisa normal.” Segundo ele, as pessoas hoje têm uma vida ativa até os 70 ou 80 anos e não faz sentido passar 50 ou 60 anos limitadas a uma escolha feita no fim da adolescência.
Janine defende uma proposta semelhante à que vem sendo testada na Universidade Federal da Bahia, de bacharelados interdisciplinares. Ele acha também que o ensino superior deveria oferecer atualizações periódicas de conteúdo. “Algumas até deveriam ser obrigatórias, como no caso das profissões de saúde e de engenharia.”
Apesar dos problemas enfrentados nos últimos anos com fraudes, o sistema de seleção de alunos para o ensino superior pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) é considerado positivo pela maioria dos entrevistados.
“O Enem é um modelo ótimo”, diz Menezes. “Um exame só feito para o Brasil inteiro. Dá acesso ao Prouni, ao Fies. Eu não faria nenhuma mudança.”
Mesmo assim, o professor do Insper acredita que o modelo possa ser aperfeiçoado se as provas forem feitas por computador, para reduzir os custos elevados, e mais vezes por ano, para facilitar a seleção. “Se fizer mais vezes, de forma computadorizada e com um sistema eficiente de monitoramento, consegue-se reduzir a possibilidade de fraude, que é o principal problema.”
“Não conheço sistema de seleção melhor do que o Enem”, afirma Lobo. “Todo critério cria distorções e exclusões e nenhum sistema de seleção é perfeito. Dentro das suas imperfeições, o Enem é o melhor.”
Goldemberg prefere um modelo “mais competitivo”, como o da Fuvest, o processo seletivo da USP, segundo ele, muito semelhante ao dos modelos internacionais que admira. “A USP tem vestibulares muito competitivos. São 100 mil, 150 mil candidatos para disputar 7 mil ou 8 mil vagas. Isso lembra a Coreia.” Em sua avaliação, esse modelo é o que mais se aproxima do ideal para a formação de uma elite científica e tecnológica para o país.
Fonte: Valor Econômico – 15/08/2014