06/02/2015
A notícia de que a presidente Dilma Rousseff teria decidido tirar Maria das Graças Foster da presidência da Petrobras desatou uma onda de especulações sobre quem poderia tomar as rédeas da estatal.
De acordo com os jornais Folha de S.Paulo e O Globo, a saída de Foster do comando da Petrobras, junto de todos os demais integrantes da cúpula da empresa, ficou acertada após uma reunião emergencial com Dilma na noite desta terça-feira em Brasília. Eles devem deixar os cargos até o fim deste mês, segundo os diários.
A informação de que Foster deixaria a presidência da estatal circulou na imprensa desde o início do dia. O Palácio do Planalto não confirmou, por enquanto, a eventual decisão.
A perspectiva de mudança na cúpula da Petrobras, no entanto, repercutiu positivamente no mercado e as ações da empresa fecharam o pregão com alta de 15%.
Para analistas ouvidos pela BBC Brasil, a substituição da presidente da Petrobras se tornou quase inevitável em função do aprofundamento da crise na empresa e do desgaste político de Graça Foster.
Mas uma mudança na cúpula da Petrobras está longe de contribuir para resolver a crise de credibilidade em que a empresa está mergulhada ou reduzir a sua vulnerabilidade a novos esquemas de corrupção, dizem eles.
“Quem mais ganhou com esses rumores foram especuladores que compraram as ações da empresa em baixa e puderam vendê-las com essa valorização”, opina Francisco Vignoli, especialista em administração pública da Fundação Getúlio Vargas.
Para Sérgio Lazzarini, professor do Insper que tem estudado o sistema de governança em empresas petrolíferas estatais, o ideal seria que a atual presidente fosse substituída por um nome “forte“. “Teria de ser uma figura com certa estabilidade, intocável, como o ministro (da Fazenda), Joaquim Levy“, opina.
“Mas mesmo que fosse conseguido alguém com esse perfil, a troca de comando não será suficiente para blindar a estatal de ingerências políticas indevidas, impedir o surgimento de novos esquemas de corrupção e fazer com que suas decisões atendam a interesses de Estado, não de governo“.
Em seu livro mais recente, Reinventando o Capitalismo de Estado (Portfolio Penguin), escrito em parceria com Aldo Musacchio, da Universidade de Harvard, Lazzarini compara o sistema de governança da Petrobras com o de outras petrolíferas estatais de capital aberto.
O resultado, segundo ele, é que, embora todas essas estatais tenham sistemas de “freios e contrapesos” embutidos nos seus regimes societários para garantir boas práticas de gestão, diferenças nas regras e na implementação desses sistemas de garantias faz com que algumas empresas sejam mais vulneráveis que outras a esquemas de corrupção e interferências políticas indevidas.
Entre os cotados para substituir Foster, estão o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, o ex-presidente da OGX Rodolfo Landim e o ex-presidente da Vale, Roger Agnelli, este último desafeto de Dilma.
Tanto a Petrobras quanto a norueguesa Statoil possuem conselhos administrativos relativamente grandes e com conselheiros de fora da empresa, por exemplo.
No entanto, enquanto na Noruega há uma lei que proíbe a participação de membros do governo nesse conselho, na Petrobras ele está repleto de servidores públicos e membros indicados pelo Planalto.
Como resultado, embora em ambos os casos seja este conselho quem nomeia o presidente da estatal, na prática, no Brasil o processo de nomeação é essencialmente político, o que não ocorre na Noruega – onde a nomeação independeria de ciclos eleitorais.
Outra diferença, segundo Lazzarini, diz respeito à força das agências reguladoras do setor. “No Brasil, a Agência Nacional do Petroleo (ANP) é relativamente fraca, enquanto que na Noruega a agência reguladora (NPD) é forte.”
“O ideal é que a agência reguladora tenha independência para supervisionar a estatal de sua área e traçar as linhas gerais para a sua política de preços e de investimentos. Só assim é possível garantir que a empresa siga interesses de Estado e não de governo, que haja uma blindagem política”, opina Lazzarini.
Diretores
John Forman, ex-diretor da ANP, concorda que a troca da cúpula não é suficiente para contornar a crise da Petrobras, mas também é cético sobre a possibilidade de melhorar a governança da empresa.
“Tudo isso é muito subjetivo. Você pode ter normas e regras, mas é preciso contratar pessoas que as respeitem. As regras já existentes e as sindicâncias realizadas mostraram-se ineficientes”, diz.
Forman ressalta que o cenário que levou aos problemas na companhia parece envolver grande parte de sua cadeia administrativa – inclusive diretores e gerentes.
“Não é possível fazer nada sem que diferentes partes desta cadeia estejam envolvidas. Como mudar a Petrobras? É evidente que você precisa fazer grandes alterações administrativas. É preciso trocar da cúpula aos diretores e gerentes para termos pessoas comprometidas com o processo de recuperação da companhia”, avalia.
“Um possível novo presidente terá que fazer uma avaliação completa (dos processos da empresa). Terá de analisar toda a estrutura e entender como diferentes elos da cadeia estiveram envolvidos (no esquema de corrupção da Lava Jato)”.
Forman opina, porém, que ter um perfil técnico não é garantia de que um possível novo presidente seja eficiente nessa tarefa.
“Muitos dos envolvidos (no escândalo) inclusive tinham carreiras de mais de 30 anos na Petrobras: o Renato Duque, o Paulo Roberto Costa. Isso não blinda ninguém contra más práticas”, diz.
Para Vignolio, o que ampliou o desgaste em torno do nome de Graça Foster foi a divulgação de um cálculo segundo o qual a estatal teria o equivalente a R$ 88,6 bilhões em ativos “superavaliados” — ou seja, registrados na contabilidade da empresa com valores mais altos do que os reais.
O cálculo foi citado em um comunicado que acompanhou o balanço não auditado do terceiro trimestre e ajudou a derrubar as ações da empresa. “O desgaste do nome de Graça Foster é inegável em função de todas essas notícias, mas também é preciso ressaltar que ao final não ficou comprovado nenhum tipo de envolvimento direto da atual presidente da Petrobras no esquema da Lava Jato”, diz Vignoli.
“Há inclusive muitas indicações de que esse é um esquema de longa data. Acho perfeitamente possível que ela não tenha tomado conhecimento dessas irregularidades”, opina.
Fonte: BBC Brasil – 04/02/2015