21/08/2013
Tirar os projetos da gaveta e investir na produção têm sido uma decisão difícil para o empresário brasileiro. O cenário macroeconômico vem se deteriorando, com expectativas de crescimento cada vez menor para o Produto Interno Bruto (PIE) e sinais de descontrole nos gastos públicos. A estes fatores somam-se a inflação em alta, a incerteza política trazida pelas manifestações populares e as interferências de Brasília em questões regulatórias. Isso sem contar a resistente crise que assola os países europeus e os Estados Unidos. “Os empresários estão levando em conta o ambiente político. Estes fatores fazem acender a luz amarela”, resume Otto Nogami, professor de economia da escola de negócios Insper, de São Paulo.
Em tese, diz o professor, o ambiente brasileiro seria propício para investimentos, pois há uma defasagem geral entre a produção e o crescimento do mercado. Mas os empresários querem sentir segurança de que a infraestrutura lhes dará condições de elevar a produção e absorver os resultados. “É claro que, estrategicamente, pensando e acreditando na recuperação da economia, há empresas que aproveitam para investir, para atender à demanda quando a economia aquecer”, afirma. Para o segundo semestre, Nogami não espera mudanças, já que o “cenário ainda é nebuloso” e, como 2014 é ano de eleições, muitos investimentos tendem a ser freados.
A despeito do cenário político e macroeconômico, os investimentos têm sido realizados. A questão que toma conta do mercado é sua velocidade. Quando decidem aplicar na produção, as empresas podem usar recursos próprios, lançar mão do dinheiro dos investidores nacionais e estrangeiros no mercado de capitais, buscar empréstimos nos bancos privados ou recorrer ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Cada uma destas fontes tem mostrado um ritmo próprio de expansão para atender às demandas das empresas por capital.
A captação de recursos no mercado de capitais somou R$ 112,7 bilhões no primeiro semestre deste ano, com leve queda, de 4,1 %, em relação ao captado no mesmo período de 2012, segundo a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). A emissão de ações dobrou no período, de R$ 8,6 bilhões para R$ 17,7 bilhões, mas o valor de 2013 foi influenciado pela oferta de R$ 11,4 bilhões da BB Seguridade, a empresa de seguros, previdência e capitalização do Banco do Brasil, considerada a maior do mundo no semestre. No total, foram 11 operações de oferta de ações no semestre entre primárias e subsequentes. Para o segundo semestre, há cinco ofertas registradas na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Segundo a Anbima, 70,4% dos recursos captados no mercado de ações no semestre foram destinados à aquisição de ativos e para a própria operação das empresas, quesito que no mesmo período de 2012 recebeu 31% dos recursos. Outros 21,4% das captações foram empregados na aquisição de participações acionárias.
As ofertas de papéis de renda fixa – debêntures, notas promissórias, Certificados de Recebíveis Imobiliários e Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios -, normalmente usados para refinanciamento de dívidas e também para investimentos, registraram retração de 18,6% de janeiro a junho. Dos R$ 33,2 bilhões captados com debêntures, 44,7% destinaram-se ao refinanciamento de passivo, enquanto 16,5% foram para a recompra de títulos de emissão anterior. “Até junho, não houve dificuldade em captar, mas uma necessidade menor das empresas”, comenta Mareio Guedes, diretor da Anbima.
“Não vimos empresas tentando captar e não conseguindo. As que suspenderam as operações foram porque decidiram esperar a volatilidade do mercado passar.” A causa são os sinais do Federal Reserve (Fed), o banco central dos EUA, de que o governo irá reduzir os estímulos à economia e elevar as taxas de juros. Este fator trouxe incertezas. No mercado externo, em que as empresas brasileiras obtêm recursos com a emissão de bônus e commercial papers, o volume foi praticamente o mesmo na comparação do primeiro semestre deste ano com 2012, com US$ 19,5 bilhões. Guedes afirma que, entre as emissões de debêntures e notas promissórias, há uma participação maior das empresas fechadas, porque os bancos têm dado apoio a este tipo de título. “Há predominância das abertas, mas as fechadas têm se tornado bastante importantes.”
Os bancos privados têm feito sua parte na concessão de recursos para investimentos. O Itaú BBA trabalha com operações para empresas com faturamento acima de R$ 400 milhões por ano. Alberto Fernandes, vice-presidente comercial do banco, diz que o crescimento nas operações de crédito foi da ordem de 5% a 6% nos seis primeiros meses do ano, mas esta variação está diretamente ligada ao crescimento do PIB. Como o banco reduziu sua estimativa de alta para a economia do país de 3,5% para 2,4%, a expansão do crédito também deve ser menor. “Agora, o crédito deve aumentar de 8% a 10%, mas isso depende do que irá ocorrer no segundo semestre”, avalia Fernandes.
No Bradesco, as operações de crédito para as grandes empresas aumentaram 15,6% no primeiro trimestre sobre o mesmo trimestre do ano passado, para um saldo de R$ 155,4 bilhões no total da carteira. “O maior crescimento da demanda (por crédito) foi das grandes empresas. O primeiro trimestre foi muito bom, mas, como o crédito tem ligação direta com a atividade econômica, o ritmo vem desacelerando”, afirma José Ramos Rocha Neto, diretor do departamento de empréstimos e financiamentos do Bradesco. Ele lembra que, da carteira voltada para as micro, pequenas e médias empresas, 60% dos recursos emprestados são para capital de giro, enquanto 25% são linhas para investimentos, como repasses do BNDES para investimentos e para o financiamento da compra de máquinas e equipamentos.
O BNDES só tem números consolidados dos desembolsos de recursos às empresas até maio. Os desembolsos somaram R$ 73 bilhões nos cinco meses, 66,8% mais que no mesmo período de 2012. “Este crescimento de 67% foi bastante heterogêneo. Houve expansão nos recursos para o setor industrial, como material de transporte, química e petroquímica e metalurgia. A agropecuária teve crescimento expressivo também”, avalia Humberto Mingotti Gabrielli, gerente de planejamento. A grande maioria dos setores em que o banco divide a concessão de recursos, com base na classificação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, registrou aumento na comparação com janeiro a maio de 2012. Dos 44 setores, apenas seis tiveram redução. Outros 12 mostraram aumento nos desembolsos acima de 100%.
Isoladamente, os maiores volumes foram destinados à agropecuária, que ficou com mais de R$ 8 bilhões, com alta de 115,3% na comparação com os cinco primeiros meses do ano passado. O setor de transporte terrestre levou R$ 10,7 bilhões, com aumento de 35%, enquanto os projetos ela administração pública receberam R$ 5 bilhões, um salto de 1.105% sobre os dados ele 2012. Gabrielli diz que os setores ligados à infraestrutura tiveram “crescimento não tão bom”, mas ressalva que a expectativa do banco é apoiar esses projetos. “As aprovações para infraestrutura cresceram 92% no acumulado até maio. Em 12 meses, as aprovações para o setor somam R$ 105 bilhões, 38% elas aprovações totais do banco no período.” A expectativa é que os desembolsos melhorem ainda mais. As aprovações significam projetos já avaliados pelo banco, mas que estão à espera de receber recursos. Elas sempre precedem os desembolsos.
Entre as linhas do BNDES, Gabrielli destaca o Financiamento de Máquinas e Equipamentos (Finame), responsável por quase R$ 30 bilhões de janeiro a maio. O Finame está enquadrado no Programa de Sustentação do Investimento (PSI), lançado em 2009, para suportar a demanda de crédito diante do agravamento da crise financeira internacional. Os juros anuais para a compra de máquinas dentro do PSI é de 3,5%. “O PSI também apoia projetos de inovação e de exportação de bens de capital, para os quais o banco desembolsou R$ 36,5 bilhões até maio.”
Embora não partam de projetos de investimento que necessitem de recursos a partir do zero, as operações de fusões e aquisições são responsáveis por uma parcela significativa dos investimentos feitos no país. Dados da consultoria PricewaterhouseCoopers (PwC) mostram que foram fechadas 330 transações envolvendo empresas no Brasil até maio. O número empata com os 331 negócios do mesmo período de 2012, volume que vem se mantendo desde 2010. Dos negócios até maio, a maioria, ou 172, representaram compras majoritárias. Outros 36% foram operações de compra de participação minoritária. Alexandre Pierantoni, sócio da PwC, lembra que a recente deterioração do ambiente macroeconômico e as turbulências políticas vêm dificultando as transações. “Isso pode impactar no nível das transações neste ano ou nos próximos 18 meses”, avalia.
Pierantoni afirma que o mercado brasileiro é de transações médias, pois há muitas empresas familiares. A admissão de um sócio estrangeiro ou de um fundo de private equity são boas fontes de recursos, na sua opinião, apesar das dificuldades. “Os fundamentos da demanda no Brasil e do profissionalismo das empresas estão aí. Nos próximos 12 a 18 meses, vamos ver uma oportunidade de crescimento importante para os fundos de private equity”, afirma o sócio da consultoria Pwc.
O presidente da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP), entidade que reúne fundos que compram participação em empresas, Clóvis Meurer, concorda. “O ambiente para investimento em private equity e venture capital não é tão volátil como a bolsa ou a renda fixa. São operações de médio e longo prazos, de três a cinco anos. Mesmo com uma conjuntura instável, alta menor do PIB, aumento no câmbio ou queda da bolsa, os investimentos irão se realizar. Não se trata de um investimento especulativo”, afirma. Pelas contas de Meurer, os fundos têm cerca de R$ 30 bilhões à espera de compra de empresas. “Os negócios continuam sendo fechados, porque as oportunidades estão no mercado.”
Fonte: Revista as campeãs Valor 1000 – Investimentos
Data: 21/08/2013