06/09/2022
Obra produzida com a ferramenta de geração de imagens Midjourney ganha prêmio de arte digital nos Estados Unidos e causa controvérsia
Saiu no New York Times e vem repercutindo em veículos mundo afora. Jason Allen, um americano de 39 anos que trabalha como designer de games, foi anunciado no fim de agosto como ganhador do prêmio principal de um concurso de artes da Feira Estadual de Colorado, nos Estados Unidos. O prêmio em si é modesto (750 dólares), mas tem causado polêmica porque a obra vencedora foi gerada por um programa de inteligência artificial.
Intitulada “Théâtre D’opéra Spatial”, a obra premiada retrata personagens de uma ópera barroca em um cenário galáctico e conquistou o primeiro lugar na categoria amadora de arte digital. A peça foi criada com o uso do Midjourney, um programa de inteligência artificial que converte instruções de texto em imagens visuais. Como descreveu a reportagem do New York Times, “os usuários digitam uma série de palavras em uma mensagem para o Midjourney; segundos depois, o bot cospe uma imagem”.
O Midjourney é um programa concorrente da DALL-E, da OpenAI, laboratório de pesquisas financiado pelo empresário Elon Musk. O Midjourney foi utilizado pela revista britânica The Economist para criar sua capa da edição de 26 de junho de 2022, que tratou da nova fronteira da inteligência artificial.
O designer Jason Allen comemorou seu feito nas redes sociais, mas logo recebeu uma saraivada de críticas. “Estamos vendo a morte da arte se desenrolar diante de nossos olhos” escreveu um usuário do Twitter. Outro usuário opinou que um trabalho criado por inteligência artificial não pode ser considerado arte: “A IA não pode criar arte, porque qualquer coisa gerada a partir de uma IA é totalmente desprovida de mensagens, temas e significados”.
Muitos artistas se manifestaram na rede sobre a ameaça que a inteligência artificial pode representar ao seu ofício, que demanda dias ou meses de trabalho para criar uma única obra, agora possível de ser produzida em poucos minutos diante de um computador. Para isso, basta digitar uma instrução ao programa (por exemplo, “mulher sorridente com guarda-sol em praia deserta”) e esperar que o algoritmo faça a mágica.
O trabalho de Allen também recebeu apoio nas redes sociais. Um de seus defensores comparou a geração de imagens por inteligência artificial com a fotografia. Embora seja usada uma máquina, quem dá o toque final é o fotógrafo. “A pessoa passou semanas refinando o input e depois vasculhou centenas de opções para chegar às melhores imagens. Isso requer experiência artística subjetiva. Não é como se a inteligência artificial tivesse feito isso por conta própria”, disse o apoiador de Allen.
Em sua defesa, Allen afirmou ter mérito na criação das peças com o Midjourney. Ele disse que criou “centenas de imagens” e dedicou “muitas semanas de ajuste fino” da inteligência artificial até chegar às três peças finais com as quais participou do concurso. O designer afirmou não ter violado nenhuma regra do concurso de arte. Ressaltou ter inscrito suas peças sob o nome “Jason M. Allen via Midjourney”, para deixar clara a natureza de seu trabalho.
Os juízes ouvidos pelo New York Times reconheceram, no entanto, que não sabiam que Midjourney era um programa de inteligência artificial — mesmo que tivessem ciência disso, declararam, teriam escolhido a oba de Allen como vencedora.
As regras da categoria em que Allen sagrou-se vencedor permitem qualquer “prática artística que utilize a tecnologia digital como parte do processo criativo ou de apresentação”. Para alguns, isso pode significar que usar programas de inteligência artificial para criar arte não é diferente de usar outros programas, como o Photoshop (que, aliás, também emprega inteligência artificial em suas ferramentas de edição de imagens).
Em meio à polêmica, há quem acredite que a crescente popularidade da inteligência artificial, com recursos cada vez mais sofisticados, deverá levar à criação de uma categoria distinta de outras formas de arte digital.