A entrada no País de empréstimos tomados por empresas no exterior tem sido maior do que as amortizações de dívidas. Esse cenário tem preocupado especialistas, já que uma posterior evasão de dólares pode trazer prejuízos à balança de pagamentos.
De acordo com dados do setor externo divulgados ontem pelo Banco Central, os desembolsos líquidos de investimentos estrangeiros diretos no Brasil somaram, até agosto deste ano, US$ 11,323 bilhões, com ingressos brutos de US$ 24,338 bilhões contra amortizações no valor de US$ 13,305 bilhões.
No mesmo período do ano passado, essa relação foi equilibrada, com a entrada bruta de US$ 17,870 bilhões e amortizações no valor de US$ 19,598 bilhões.
Cautela
O professor de economia da Fundação Instituto de Administração (FIA), Carlos Honorato, afirma que apesar do aumento da entrada de empréstimos fazer parte da natureza dos negócios, o governo precisa se manter vigilante em relação a um possível fluxo de saída de dólares maior do que a entrada.
“Até o momento, nenhum acontecimento deu a impressão de uma evasão muito grande de capital. Estamos conseguindo trazer dólares para cá e isso tem mantido a cotação do real equilibrada”, diz o professor da FIA.
“No entanto, é preciso tomar cuidado com o fluxo de capital para não ocorrer, mais para a frente, uma fuga de dólares do País, fazendo com que as nossas reservas internacionais caiam. […]Essa entrada de empréstimos de US$ 11 bilhões está, praticamente, em um quinto do nosso déficit externo”, alerta Honorato.
De acordo com dados BC, até agosto deste ano o déficit das contas externas do Brasil está em US$ 54,818 bilhões. O professor do MBA Executivo em Finanças do Insper, Otto Nogami, concorda com a avaliação de Honorato e define esse cenário como uma “compensação onerosa” à balança de pagamentos, já que, no curto prazo, diminui nosso déficit nas contas externas, com a maior entrada de dólares e, no longo, uma fuga massiva de capitais pode aumentar o valor negativo da conta do País.
Consequências
“Em algum momento, essas empresas terão que devolver o dinheiro emprestado. E, supondo um cenário em que a situação internacional piore, as companhias estrangeiras podem exigir uma amortização integral antes do prazo”, diz Nogami. “Uma situação como essa pode impactar nossas reservas cambiais”, completa.
Além disso, Nogami afirma que uma eventual desvalorização do real pode ser um problema para as empresas nacionais que precisem amortizar dívidas, já que irão precisar de mais reais para comprarem dólares. “Pensando do lado do Brasil, a empresa que está aqui pode querer antecipar esse pagamento [para aproveitar o patamar atual do câmbio]”, diz o professor do Insper.
Ritmo da economia
Para Honorato, esse aumento da tomada de empréstimos por empresas brasileiras até agosto pode estar relacionado com a menor atividade econômica do País. O que faz com que as companhias prefiram tomar empréstimos no exterior, a juros mais baixos, levando em conta também o baixo risco que o câmbio oferece no momento. “Como o Banco Central americano tem o intuito de diminuir a liquidez no mercado para evitar um processo inflacionário nos EUA, isso pode fazer com que as empresas nacionais tomem esses empréstimos nesse momento para evitar uma subida do dólar em segundo momento”, diz Honorato, acrescentando que o câmbio tem apresentando estabilidade.
Subsídio fiscal
Já o professor de finanças do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibemec), Nelson de Sousa, relaciona a maior entrada de empréstimos no Brasil a subsídios fiscais oferecidos pelo governo ao capital estrangeiro. Ele cita a redução do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), pelo Ministério da Fazenda em junho deste ano, para o capital estrangeiro em renda fixa, de uma alíquota de 6% para zero.
“Esse dinheiro que está entrando no País são de investidores estrangeiros que encontram por aqui uma rentabilidade maior para o seu capital com taxas de juros elevadas”, diz Sousa. “Não é propriamente investimento no setor produtivo da economia”, complementa ele, citando os dados do investimento estrangeiro no mês de agosto.
De acordo com o BC, os aportes em carteira vindo do exterior somaram ingressos líquidos de US$ 5,4 bilhões em agosto, compostos por entradas líquidas de US$ 1,6 bilhão em ações e de US$ 3,7 bilhões em títulos de renda fixa. Já os investimentos em títulos de renda fixa negociados no País somaram ingressos líquidos de US$ 3,4 bilhões, informa o Banco Central.
Fonte: DCI – 25/09/2014.