Webinar do Insper discutiu a importância de definir regras claras para os sócios para evitar situações como a alta mortalidade das empresas após a ascensão dos herdeiros na gestão
Bruno Toranzo
A relação entre sócios de uma empresa é, por natureza, desafiadora. Cada sócio costuma ter uma visão sobre o caminho que deve ser seguido, os objetivos que precisam ser alcançados e o futuro que se vislumbra. Há quem queira vender a empresa depois de atingido certo patamar. Outros querem fazer dela uma gigante do mercado.
Diferenças de visão como essas podem resultar em conflitos entre sócios. Tais divergências são potencializadas se houver questões subjetivas envolvidas, como no caso de membros de uma família. De acordo com o IBGE e o Sebrae, cerca de 90% das empresas brasileiras são familiares. Um estudo da consultoria PwC, feito em 2020, indica que 75% dessas empresas encerram suas atividades depois da sucessão pelos herdeiros dos gestores.
“Divido os instrumentos jurídicos em dois conjuntos: aqueles que lidam diretamente com a transmissão da propriedade da participação societária e os que se dedicam à manutenção dela, considerando em ambos os contextos as relações entre as pessoas envolvidas no negócio”, disse Adriane Pacheco Danilovic, sócia-diretora do Humberto Sanches e Associados, no webinar Acordos Societários – Mitos e Verdades, promovido pelo Insper no dia 13 de junho. “São essas soluções que farão com que a empresa se mantenha, preservando o relacionamento entre os membros da família.”
De acordo com ela, o primeiro passo é a família se conhecer, saber quais são os interesses de cada membro e como eles podem se aliar ou se opor. “Se eu tenho uma situação de fundador da empresa com filhos que trabalham nela e outros que não, é importante que ele comece pelo testamento, definindo que os filhos não atuantes na empresa continuem fora dela, recebendo, para isso, outros ativos do seu patrimônio”, exemplificou.
Para Adriane, “é preciso primeiro identificar qual é o problema mais premente para, a partir dele, lidar com as questões jurídicas sob as mais diversas perspectivas, o que envolve sucessão, acordo de sócios, doação e até mesmo pacto antenupcial”.
Plano de sucessão e acordo de sócios
Um estudo recente da PwC indicou que 54% das empresas familiares brasileiras não têm um plano de sucessão em vigor. Para a consultoria, esse é um dos motivos que explicam a sobrevivência baixa dessas empresas depois da terceira geração de administradores. E o anseio de boa parte delas é justamente manter o negócio na família, passando seu controle para a próxima geração.
Para que isso seja possível, de acordo com o estudo da Deloitte “Global Family Business Survey 2019”, esses empresários devem olhar as questões mais estratégicas, de longo prazo, como o plano de sucessão, e não as de curto prazo, como costumam fazer. O planejamento de muitas empresas vai de dois a cinco anos — muito aquém do necessário para o plano de sucessão. Aline Porto, cocoordenadora da Plataforma de Empresas Familiares do Insper, foi a moderadora do webinar e compartilhou sua experiência nesse assunto, reconhecendo, por exemplo, que o plano de sucessão exige, de fato, um esforço duradouro e consistente por parte das empresas.
“Também indicamos a elaboração do acordo de sócios para regular o exercício da propriedade na sociedade empresária. Por meio dele, são definidas regras para o dia a dia do negócio, além dos direitos e deveres de cada sócio”, disse o mediador Marcelo Perlman, fundador da Perlman Mediação e Estratégias Jurídicas.
Nesse documento, deve haver uma cultura de antecipar riscos, de prever situações que possam dar errado, com previsão de como resolvê-las. “É preciso, por exemplo, estabelecer cláusula de arbitragem, para manter em sigilo as informações do negócio, no caso de necessidade de forçar o cumprimento de determinada obrigação”, recomendou.
Ainda assim, Perlman destacou que o acordo de sócios deve priorizar cláusulas que deem senso de responsabilidade a todos em relação ao efetivo cumprimento. “Na cultura oriental, o foco são contratos mais curtos, sem prever a possibilidade de dar errado, não havendo remédios jurídicos ou penalidades. Há um olhar muito positivo de que o contrato significa compromisso com o futuro, é quase uma peça de otimismo e esperança em relação ao futuro”, observou.