Evento no Insper, com o ministro Bruno Dantas, do TCU, debate o impacto da Lei Geral de Proteção de Dados no acesso a informações públicas
A Lei de Acesso à Informação (LAI) está completando 10 anos. Ela entrou em vigor em maio de 2012, para garantir aos cidadãos o direito de acesso às informações em posse do poder público, bem como assegurar a transparência dos atos da administração pública. Para marcar os 10 anos da vigência da lei, o Insper e a agência especializada em acesso a dados públicos Fiquem Sabendo, com o apoio da Fundação Getulio Vargas, lançam um relatório que analisa o impacto da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no acesso a informações públicas. O estudo, elaborado com financiamento da Fundação Heinrich Böll, será apresentado durante o painel de debate Transparência Pública e Privacidade de Dados Pessoais: Um Caminho Harmônico?, que acontece no dia 28 de abril, das 19h às 20h30, na sala Jorge Paulo Lemann, no Insper.
O evento contará com a participação de Bruno Dantas, ministro do Tribunal de Contas da União; Bruno Bioni, diretor fundador do Data Privacy Brasil e membro do Conselho Nacional de Proteção de Dados; e Maria Vitória Ramos, diretora e cofundadora da Fiquem Sabendo. A mediação do debate será feita por Natália Mazotte, presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo e coordenadora do Programa de Jornalismo e Comunicação do Insper.
Para Natália, os casos de sigilos impostos pelo atual governo deixam evidente o seu descompromisso com a transparência pública. “Alguns sigilos têm sido revertidos, como o aplicado ao cartão corporativo, em flagrante desacordo com princípios constitucionais e com a LAI”, diz Natália. “Infelizmente, essas decisões acabam sonegando informações públicas que deveriam estar acessíveis aos cidadãos.”
Na avaliação de Natália, em 10 anos de vigência, a LAI representou um grande avanço para a agenda de transparência no Brasil. “O fato de a lei abranger todos os três poderes e níveis de governo faz dela uma das mais completas do tipo no mundo. Sua aprovação foi fruto da mobilização da sociedade e é a própria sociedade que precisa garantir que não haja retrocessos em seu cumprimento”, afirma. “Temos o direito de saber o que o governo está fazendo. O controle social é um dos pilares mais importantes da democracia e só é possível se a transparência for regra para os atos de nossos representantes.”
Avanços e obstáculos
Em vigor desde setembro de 2020, a LGPD estabeleceu normas mais rígidas em relação a coleta, armazenamento, tratamento e processamento de dados pessoais, sejam eles digitais ou não, por parte de empresas e órgãos públicos. A LGPD representou um avanço na proteção da privacidade dos cidadãos, que têm o direito de saber como as empresas e os órgãos públicos estão utilizando seus dados pessoais.
Entre outros direitos, os titulares dos dados podem confirmar se a empresa ou o órgão público realiza o tratamento de seus dados pessoais, requisitar o acesso às informações, solicitar a correção de dados incompletos, inexatos ou desatualizados e pedir a anonimização, o bloqueio ou a eliminação de dados desnecessários, excessivos ou tratados em desacordo com finalidades específicas ou cujo tratamento não seja justificável por uma base legal.
Apesar dos avanços, a LGPD também trouxe um impacto na LAI. Um levantamento inicial realizado pelo jornalista Eduardo Goulart para a agência Fiquem Sabendo, em agosto de 2021, apontou que, até então, ao menos 79 pedidos de informação negados com base na lei de proteção de dados haviam chegado à Controladoria-Geral da União.
Para Natália Mazotte, contudo, é possível conciliar a necessidade de transparência pública e o direito à privacidade. “Transparência é um princípio que se aplica a informações de interesse público. Privacidade trata da esfera privada, é um direito da personalidade. É claro que há bases de interesse público que possuem informações de caráter privado, mas há formas de contornar isso sem impactar negativamente no acesso a informações públicas”, afirma.
Nesse sentido, continua Natália, a LGPD e a LAI são leis compatíveis e não há prevalência entre elas. “Esse foi um entendimento inclusive firmado pela CGU em março deste ano. Contudo, temos observado uma interpretação extensiva da LGPD que acaba afetando o acesso a informações de interesse público”, diz Natália. “Falta estabelecer concretamente como harmonizar a aplicação dessas duas leis em casos mais limítrofes e orientar os servidores públicos nesse sentido, já que eles estão na linha de frente do cumprimento dessas legislações.”