20/10/2016
De 1994 para cá, as eleições presidenciais sempre foram protagonizadas por nomes do PSDB e do PT. Duas foram vencidas pelos tucanos. Quatro, as mais recentes, pelos petistas. Essa disputa se espalhou e acabou reproduzida em várias cidades do Brasil, incluindo a maior delas, São Paulo.
Criou-se, assim, uma espécie de consenso de que os dois partidos, atuando em campos distintos, representavam boa parte do pensamento político da sociedade brasileira.
A eleição municipal de 2016, no entanto, parece ter desequilibrado esse jogo a favor de um dos lados. Pela primeira vez na história, um partido, no caso, o PSDB, venceu a corrida pela prefeitura paulistana em primeiro turno, tirando do cargo um petista.
Além disso, o PT, que vinha crescendo de forma consistente nas cidades desde que chegara pela primeira vez ao Planalto, em 2003, sofreu talvez sua maior derrota eleitoral – o número de votos dados aos candidatos do partido caíram 60% na comparação com 2012.
O resultado foi reflexo da crise política nacional, que acabou no impeachment de Dilma Rousseff em agosto, somada à crise econômica da gestão da ex-presidente petista.
Além disso, houve o avanço da Lava Jato sobre o principal líder do partido, ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que acentuou o desgaste dos petistas, avariados já há algum tempo em razão do escândalo do mensalão e da própria operação que apura desvios na Petrobras.
Enquanto isso, o PSDB cresceu, mesmo que também tenha aparecido nas investigações da Lava Jato. O partido foi apoiador do impeachment e tornou-se um aliado de primeira hora do vice peemedebista Michel Temer, que assumiu o comando do país com a deposição de Dilma.
O PMDB, da sua parte, mantém sua influência nos municípios – o maior partido em número de prefeitos e vereadores do Brasil – e nutre pretensões de disputar novamente, pela primeira vez desde 1994, o Palácio do Planalto.
Diante desse quadro, o Nexo elaborou duas questões a respeito dos rumos da política nacional para dois cientistas políticos. São eles:
Bruno Reis, professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais)
Carlos Melo, professor do Insper (Instituição de Ensino Superior em Negócios, Direito e Engenharia)
O resultado das eleições municipais somado ao impeachment e a crise nacional coloca fim à polarização entre PT e PSDB ou ela existirá ainda em 2018?
BRUNO REIS Acho possível essa polarização ressurgir em 2018, para isso basta o cenário em que Lula possa ser candidato à Presidência. O coloco para não presumir que já há um pré-julgamento dele na Lava Jato. Hoje ainda nos cenários de pesquisa de intenção de voto, embora ele perca no segundo turno, ele ainda é um candidato forte.
É claro que o PT perdeu força, é claro que o PT está no centro da crise e é responsabilizado, com muita razão, pela deterioração econômica. Mas isso é uma coisa. Outra é o fim da polarização, ainda mais em uma eleição presidencial. Sem Lula o cenário fica imprevisível, com favoritismo mais tranquilo para um candidato com perfil de [Geraldo] Alckmin.
CARLOS MELO A polarização entre PT e PSDB acabou e é página virada. Isso talvez dilua um pouco do maniqueísmo que vinha sendo usado pelo menos há uma década e vai exigir que a análise da política seja mais refinada sobre quais são as disputas e os conflitos.
O sr. acredita que PSDB e PMDB, maiores partidos nas cidades e, atualmente, aliados no plano nacional, são os novos protagonistas da política nacional e podem travar a partir de agora uma disputa direta pelo poder?
BRUNO REIS Acho improvável. De um lado, eu nem apostaria na dissolução da polarização entre PT e PSDB, nem arrisco alternativas. Faltam ao PMDB duas coisas: uma plataforma política nítida e a vontade de antagonizar quem quer que seja eleito. Acho que qualquer que seja o presidente eleito em 2018, o PMDB vai ser parte da situação. Ele não vai para oposição.
Não vejo antagonismos entre PMDB e PSDB pelo simples fato de não serem antagonistas. Em certa medida eles compartilham a mesma agenda política e econômica. Parte do nosso problema, neste momento, é a dissolução das polaridades. Está difícil interpretar os partidos.
Modestamente, é preciso aguardar as coisas acontecerem. Temos que esperar a Lava Jato, o saldo das investigações e o alinhamento partidário que pode se colocar a partir disso. A dissolução e essa fragmentação partidária torna mais imprevisível a disputa pelo protagonismo.
CARLOS MELO Eles estão disputando quem será o protagonista da política brasileira. Mas primeiro será necessário um reordenamento para que tenha grupos minimamente coesos para que eles possam se qualificar dessa forma. Quando se fala de PMDB ou de PSDB, de quem está se falando? De Michel Temer ou do [ministro da Casa Civil] Eliseu Padilha? De Aécio [Neves], Alckmin ou [José] Serra?
Naturalmente vai haver uma nova polarização, mas ela ainda não está colocada hoje. Não porque não haja disputa, é porque o sistema político está tão fragmentado e carecendo tanto de um reordenamento que, somente a partir disso, talvez possamos pensar em novas polarizações.
Há falta de um programa ou de uma figura [que fortaleça essas legendas]. O PT talvez fosse o partido mais fragmentado de todos eles, mas tem uma figura que dá unidade. Tinha um projeto de poder em torno do Lula, que dava unidade. O que dá unidade ao PSDB e o PMDB? Eles vão ter que chegar a isso.
Fonte: Nexo Jornal – SP 08/10/2016