A presidente Dilma Rousseff (PT) usou em seu pronunciamento na noite de domingo, que causou reação negativa em setores da sociedade e até um panelaço em diversas cidades do país, dados distorcidos para conclamar a população a dividir com o governo o ônus do ajuste fiscal que está sendo realizado.
A opinião é de especialistas ouvidos pelo DIÁRIO. Para o professor Otto Nogami, do Insper, não é correto a presidente dizer que nos seis primeiros anos da crise internacional o Brasil cresceu 19,9%, enquanto a economia dos países da zona do euro caiu 1,7%.
“Crescemos 11,48% de 2008, quando começou a crise, até agora“, afirma Nogami, não 19,9% como disse a presidente.”
Outro dado falso, segundo o professor, é atribuir o baixo crescimento do Brasil a crise internacional, tática recorrente de Dilma e do PT. “Como se justifica então o crescimento dos Estados Unidos e de alguns países da Europa? “, pergunta Nogami, já respondendo. “O que aconteceu é que o governo não fez a lição de casa, cortando os próprios gastos, e ainda estimulou o consumo exagerado que trouxe de volta a inflação ao país“.
Para ele, o governo errou ao adotar uma estratégia de fazer a economia crescer a custa do endividamento das famílias. “O governo errou e quer agora impor à população o remédio amargo com aumento de impostos e redução no consumo das famílias causado pela inflação, que reduz o poder de compra“, completa.
Presidente critica suposto terceiro turno
A presidente Dilma Rousseff reagiu, ontem, as manifestações durante o seu pronunciamento, na noite de domingo, em cadeia de rádio e TV. Para ela, as pessoas irem para as janelas bater panelas e os motoristas buzinarem enquanto ela se dirigia aos brasileiros faz parte da democracia.
A presidente defendeu o direito de manifestação, mas condenou a violência nos protestos. Dilma reforçou ainda, se antecipando aos protestos marcados para o próximo domingo em todo o país, que é preciso haver razão para um pedido de impeachment.
“Eu acredito que o Brasil tem uma característica que é o fato de que aqui as pessoas podem se manifestar, têm espaço para isso e têm direito a isso”. disse Dilma. “Eu sou de uma época em que se a gente se manifestasse ou fizesse alguma coisa, acabava na cadeia, podia ser torturado ou morto”, afirmou. A presidente foi torturada durante a ditadura.
“O fato de o Brasil evoluir. passar pela Constituinte de 88, passar pelo processo democrático e garantir o direito de manifestação é algo absolutamente valorizado por todos nós, que chegamos à democracia e temos de conviver com as diferenças, com as manifestações. O que não podemos aceitar é a violência, qualquer forma de violência.”
Segundo a petista, o impeachment representa o terceiro turno das eleições e uma ruptura do processo democrático. No panelaço, os manifestantes gritaram “fora, Dilma”. A oposição também aguarda o movimento das duas nas próximas semanas para tomar uma posição sobre a saída forçada da presidente.
“Eu acho que há que caracterizar razões para o impeachment. Não é possível no Brasil a gente não aceitar a regra do jogo democrático. A eleição acabou, houve primeiro e segundo turnos. Terceiro turno das eleições, para qualquer cidadão brasileiro, não pode ocorrer, a não ser que você queira uma ruptura democrática.
“Mais cedo, o principal auxiliar da presidente, o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, afirmou que as manifestações de domingo coincidiram com os locais onde Dilma perdeu as eleições . “No Brasil só tem dois turnos, não tem terceiro turno”, disse. “As eleições acabam quando alguém vence. Nós vencemos. Isso tem de ser reconhecido. Reconhecemos plenamente o direito de manifestação, que preocupa é que foi uma eleição bastante polarizada, que teve momentos de radicalização, e nós precisamos construir uma cultura de tolerância, de diálogo, de respeito”, afirmou.
O PT disse que o “panelaço” fracassou. “As manifestações que aconteceram foram orquestradas para impedir o alcance da mensagem (de Dilma)”. acredita o partido.
Promessas de campanha viram fumaça
Passados pouco mias de quatro meses do segundo turno das eleições, que selou a reeleição de Dilma Rousseff (PT), medidas impopulares anunciadas pela presidente transformam em página virada promessas de campanha feitas durante o período eleitoral.
“Na campanha, a presidente disse, por exemplo, que não mexeria nos direitos trabalhistas snem que a vaca tussa”, lembrou o cientista politico Milton Lahuerta, da Unesp. “A primeira coisa que ela fez, ainda em 2014, foi anunciar mudanças no seguro-desemprego”.
Lahuerta comentou ainda que a presidente errou ao atribuir o remédio do ajuste fiscal a uma possível politica neoliberal do seu principal adversário na eleição . Aécio Neves (PSDB). “Agora o ajuste esta sendo feito e e necessário mesmo”, afirmou o docente da Unesp.
Segundo Lahuerta, o primeiro sinal de mudança no discurso eleitoral da presidente foi a escola do ministro da Fazenda. Joaquim Levy, um especialista em cortes, para comandar a economia. “Ali ela mostrou que campanha é campanha e governo é governo.”
Fonte: Diário de S. Paulo – 10/03/2015