Derrotado na Justiça e obrigado a fornecer à Folha registros policiais usados como base dos balanços mensais das estatísticas criminais de São Paulo, o governo Geraldo Alckmin (PSDB) decidiu divulgar todos esses dados em um portal na internet.
Segundo a Secretaria da Segurança Pública, o portal será aberto nesta segunda-feira (9) com “mais de 120 mil dados sobre criminalidade”.
A pasta diz ainda que “todos os boletins de ocorrência, inclusive os complementares, poderão ser consultados por mês e ano, desde 2003, em relação aos homicídios dolosos, latrocínios e lesão corporal dolosa seguida de morte”.
Para os anos a partir de 2013, ainda segundo a secretaria, haverá registros policiais tanto em relação à morte decorrente de intervenção policial, quanto em relação aos casos das chamadas “mortes suspeitas”.
Essa categoria, segundo o governo, engloba casos em que a polícia tem dúvida sobre o que ocorreu (suicídio ou crime, por exemplo). O número de registros desse tipo cresceu 51% de 2012 a 2015 —de 12.367 para 18.620.
No total, segundo o governo, o portal terá mais de 64 mil boletins.
A plataforma será aberta no mesmo dia em que vence o prazo concedido pelo Tribunal de Justiça para a Secretaria da Segurança Pública fornecer à Folha registros usados como base dos balanços mensais das estatísticas criminais de São Paulo.
No dia 29 de abril, decisão da desembargadora Teresa Ramos Marques, da 10ª Câmara de Direito Público do TJ paulista, rejeitou pedido da secretaria para suspender os efeitos de decisão liminar (provisória) concedida anteriormente à Folha.
A liminar havia sido dada no início do mês passado pelo juiz Alberto Alonso Muñoz, da 13ª Vara da Fazenda Pública. Nela, o magistrado determinava à gestão Alckmin a entrega dos dados em um prazo de até cinco dias.
O governo descumpriu a determinação enquanto recorria ao Tribunal de Justiça, o que motivou o juiz Muñoz a intimar o secretário Alexandre de Moraes, cotado para integrar o governo federal em uma eventual gestão Michel Temer (PMDB).
Nessa decisão, o juiz deu prazo de 24 horas para o fornecimento das informações.
A secretaria pediu então o efeito suspensivo. O tribunal rejeitou o pedido e deu cinco dias para que os dados fossem fornecidos.
A desembargadora atendeu parte do pedido do Estado para permitir que não fosse divulgada a íntegra dos boletins de ocorrência”, “por implicar potencial risco a terceiros”.
TRANSPARÊNCIA
Na avaliação de especialistas em segurança, a tendência de queda dos homicídios em São Paulo parece clara, mas, por causa do sigilo de dados como os de boletins de ocorrência, não é possível saber o tamanho da redução.
Para o professor e pesquisador da área de segurança pública do Insper João Manoel Pinho de Mello, a publicidade dos dados agora deverá atrair mais interessados em estudar o tema.
Ele faz uma comparação. “O Brasil tem excelentes economistas do trabalho porque [a divulgação de] dados do IBGE é excelente.”
Tanto Mello, quanto o sociólogo Renato Sérgio de Lima, professor da FGV-SP e vice-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, elogiam a medida.
Eles lembram, porém, que as informações precisam ser disponibilizadas em “plataforma aberta”—ou seja, de forma que os dados possam ser extraídos e estudados por imprensa e pesquisadores.
“É uma medida que precisa ser louvada e pode afastar as dúvidas sobre a fidedignidade dos dados de queda da violência”, diz Lima.
Para a advogada Taís Gasparian, que representou a Folha nas ações judiciais pela abertura dos dados, a medida é bem-vinda. “Finalmente a secretaria reconheceu a necessidade de dar transparência aos dados de criminalidade. Lamento que tenha demorado tanto tempo e colocado tantos empecilhos”, diz.
Procurada para comentar a medida, a secretaria não se pronunciou até a conclusão desta edição.
Fonte: Folha Online – 08/05/2016