21/03/2013
No começo deste ano, um grupo de executivos de bancos de investimentos foi visto em um restaurante badalado na região da Faria Lima em animada comemoração. O motivo do jantar era a conclusão da primeira emissão de debêntures de infraestrutura vendida a investidores estrangeiros, realizada pela concessionária de rodovias Raposo Tavares (Cart). A captação de R$ 750 milhões realizada pela companhia foi não apenas precursora como lucrativa para os bancos, que embolsaram quase R$ 57 milhões, ou 7,56% da operação.
A maior parte da remuneração dos bancos veio da chamada “comissão de sucesso”. Em linhas gerais, ela é cobrada quando há uma redução na taxa de juros que o emissor dos títulos pagará aos investidores em relação ao teto proposto originalmente. Ou seja, a empresa aceita dividir parte dessa economia com os bancos.
Nos últimos 12 meses, as instituições registraram uma receita de mais de R$ 130 milhões com a comissão de sucesso, de acordo com levantamento feito pelo Valor com base nas operações registradas na Comissão de Valores Mobiliários. Considerando também as comissões fixas, as ofertas de renda fixa renderam R$ 232 milhões para os bancos no período.
“Em um ano ruim para ofertas de ações e mais fraco em fusões e aquisições, a área de renda fixa ajudou a pagar as contas”, diz um executivo de banco de investimento. Para efeito de comparação, nas ofertas realizadas em 2011, os ganhos com a remuneração de sucesso foram de apenas R$ 6 milhões.
A taxa de juros paga pelas empresas nas emissões de títulos privados de dívida é definida pelos compradores dos papéis – investidores institucionais, como fundos de investimento e fundações de previdência -, a partir de um teto definido pelos bancos que coordenam a operação.
Acontece que no ano passado, com o processo de queda na Selic, os bancos receberam uma ajuda para ganhar as comissões de sucesso sem maiores sacrifícios. Houve um forte aumento na procura desses investidores pelos papéis de empresas, o que levou a maioria das ofertas a sair com taxas bem abaixo do teto inicial.
“Os gestores de fundos tiveram de aceitar taxas de juros menores para serem alocados nas ofertas”, diz o executivo responsável pela área de renda fixa de um grande banco. Para ele, a cobrança da remuneração de sucesso ajuda a alinhar os interesses com os emissores de títulos. “Vincular parte da comissão ao resultado da oferta estimula os bancos a trabalharem mais pela operação”, afirma. Para as empresas, vincular parte da comissão dos bancos de investimento ao sucesso da emissão pode valer a pena quando há pouca clareza sobre a demanda do investidor.
A oferta de debêntures da concessionária de rodovias Cart se enquadrava nessas condições, segundo um executivo que participou da emissão e pediu para não ser identificado. “Além do desafio de ser a primeira emissão de debêntures de infraestrutura com esforços de venda para investidores estrangeiros, a empresa contava com uma classificação de risco pior que a média das operações realizadas no mercado local”, afirma.
A taxa inicial definida pelos bancos na série com incentivo fiscal era de 8% ao ano mais correção pela inflação medida pelo IPCA, mas caiu para 5,8% em razão da boa procura dos investidores. Pelas condições da oferta, 45% da economia obtida pela Cart foi paga aos bancos como comissão de sucesso. “A remuneração pode ter sido alta, mas o ganho que a empresa teve com a redução dos juros viabilizou o projeto da rodovia”, defende a fonte. Procurada, a Cart não comentou o assunto.
Não foram apenas as operações mais arriscadas que contaram com a remuneração de sucesso. Três ofertas de certificados de recebíveis imobiliários (CRI) emitidos pela RB Capital com lastro em créditos devidos pela BR Distribuidora, da Petrobras, renderam mais de R$ 30 milhões em comissões. Em uma das operações, metade da economia obtida no pagamento de juros aos investidores foi dividida com os bancos. Procurada, a Petrobras não concedeu entrevista.
A Oi, que também é uma emissora frequente de debêntures, fechou uma captação de R$ 2 bilhões em março do ano passado na qual pagou R$ 21,2 milhões em comissões aos bancos. Desse total, R$ 6,2 milhões foram pagos na forma de comissão de sucesso.
Segundo fonte próxima à operadora de telefonia, a comissão de sucesso incentivou os bancos a buscar uma operação mais eficiente. A queda na taxa de remuneração dos papéis em relação à que estava prevista proporcionou economia de R$ 41 milhões à companhia, de acordo com o interlocutor. “Esse mecanismo é positivo porque alinha os interesses do emissor e dos estruturadores.” A Oi não comentou o assunto.
Para o professor de finanças do Insper Ricardo José de Almeida, o movimento de queda da taxa de juros pode ter pego os bancos de surpresa no momento de definir a taxa das ofertas de títulos de renda fixa no mercado. “Mas em algumas emissões a taxa definida inicialmente pelas instituições pode ter sido superavaliada”, diz.
Caso a companhia tenha a certeza de que a taxa de juros inicial estipulada pelo banco não foi jogada para cima, o pagamento de uma remuneração vinculada ao sucesso pode valer a pena, diz Almeida. “A empresa pode até diminuir os custos da emissão se conseguir negociar um pagamento menor das comissões fixas para os bancos de investimento”, afirma. No ano passado, as emissões de debêntures de MRV, Energisa e Eletropaulo não renderam remuneração de sucesso porque não houve redução da taxa paga pelas companhias.
Após os resultados obtidos em 2012, a expectativa é que a remuneração dos bancos com a comissão de sucesso seja menor neste ano. “As taxas de referência nas emissões de um modo geral já estão ajustadas ao novo cenário de taxa de juros”, diz um banqueiro.
Diante do crescimento do mercado, a concorrência entre os bancos pelas emissões tem derrubado as comissões, de acordo com o executivo. Ele cita a oferta da Taesa, empresa de transmissão de energia da Cemig, que no ano passado fechou uma captação de R$ 2,16 bilhões pagando uma comissão de apenas 0,01% ao banco coordenador (Itaú BBA), o equivalente a R$ 239 mil. A operação não previa remuneração de sucesso.
Fonte: Jornal Valor Econômico – SP – 21/03/2013