As empresas maiores e mais maduras, portanto menos necessitadas de ajuda governamental, foram as maiores beneficiadas pela expansão do crédito público entre 2004 e 2012. Além disso, apesar de um maior acesso ao crédito direcionado levar a maior alavancagem, o efeito sobre a taxa de investimento não é estatisticamente significativo, ao menos para empresas de capital aberto. Como as taxas de juros no crédito direcionado são mais baixas, as empresas com maior acesso a esses empréstimos tendem a reduzir o custo da dívida, elevando os lucros.
Essa é a conclusão do estudo “Consequências Macroeconômicas e Financeiras da Expansão do Crédito Governamental no Pós- Crise”, elaborado por técnicos do Banco Central (BC) — embora não expresse necessariamente a visão do banco — e do Insper. O trabalho é assinado por Marco Bonomo e Ricardo Brito, do Insper, e por Bruno Martins, do Departamento de Pesquisas do BC.
O assunto está em linha com a discussão que se trava neste momento de renovação da equipe econômica que indica rever a concessão de subsídios, o tamanho e a forma de atuação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), principal agente do crédito direcionado, que já recebeu mais de R$ 400 bilhões desde 2009.
O estudo aponta que as empresas agraciadas substituíram o crédito existente e mais caro pelo crédito subsidiado, elevando seu endividamento. “E é bem possível que parte desse aumento na alavancagem foi motivada pela oportunidade de arbitragem financeira, possibilitada pela disponibilidade de investimentos financeiros de baixo risco com taxas de retorno mais elevadas que a dos empréstimos direcionados”, diz o estudo.
Os pesquisadores também concluíram, após avaliar dados de empréstimos de mais de um milhão de empresas, firmados entre 2004 e 2012, que o crédito direcionado tem sido importante no financiamento de setores intensivos em externalidade social. No entanto, esses setores não foram os principais beneficiários da forte expansão do crédito direcionado desde a crise de 2008.
O trabalho também aponta que as operações de crédito público tiveram um papel importante durante a crise financeira, compensando a forte contração na oferta de crédito livre e privado. “No entanto, as concessões de crédito público continuaram a se expandir mesmo após a recuperação da atividade econômica”, diz o estudo.
O propósito do trabalho é investigar se a expansão de crédito puxada pelo governo atingiu o propósito de gerar beneficio social. Os autores reconhecem a limitação de se medir objetivamente quando certa empresa ou financiamento gera externalidade social. Então eles se basearam em relações estatísticas entre as variáveis observáveis para tentar responder a isso.
O levantamento, que contou com uma amostra com mais de 4 milhões de observações, baseou-se em dados do Sistema de Informação de Crédito do BC, da Rais, que traz estatísticas de emprego, e balanços de companhias abertas, que mostram melhor os dispêndios com investimentos.
Os pesquisadores relacionaram o perfil das empresas que recebem crédito subsidiado e aquelas que não recebem. Primeiro, eles levantaram os determinantes para ter acesso a esse tipo de crédito. Depois buscaram responder se a entrada do governo no mercado alivia as restrições de crédito enfrentadas pelas empresas, se eleva o investimento e o endividamento e se reduz o custo financeiro. No entanto, não foi encontrada evidência desses benefícios.
“Nossos resultados mostram que as empresas maiores, mais antigas e menos arriscadas foram as que mais se beneficiaram. Muito provavelmente, essas são as empresas com melhor acesso a fontes alternativas de financiamento privado, o que está em contradição com a visão social de atuação governamental neste mercado”, concluem. Procurado, o BNDES não quis comentar as conclusões do estudo.
Fonte: Valor Econômico – 07/01/2015