Como já era esperado pelo mercado, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu ontem, por unanimidade, manter a taxa de juros básica da economia (Selic) em 11% ao ano. A autoridade monetária levou em conta a evolução do cenário macroeconômico e as perspectivas para a inflação.
Especialistas avaliam, no entanto, que o ciclo de manutenção dos juros deve ser finalizado no próximo ano, em vista da necessidade de reajuste das tarifas de energia e dos combustíveis. “Mesmo com a previsão de que a economia cresça pouco no ano que vem, a inflação deve se manter elevada, pela necessidade de reajustes nos preços administrados”, afirma o estrategista-chefe do Banco Mizuho, Luciano Rostagno. “O cenário da política monetária é bastante incerto [devido às eleições]. No entanto, o que podemos afirmar é que uma queda na Selic é um cenário menos provável”, complementa.
Para Rostagno, a trajetória dos juros dependerá da política fiscal a ser implementada pelo próximo governo. “Se o novo governo implementar uma política de ajuste no campo fiscal, isso irá reduzir as chances de downgrade [rebaixamento] na nota brasileira, o que recuperaria os investimentos estrangeiros.
Esse movimento ajudaria na apreciação do câmbio, contribuindo, dessa forma, no combate à alta inflação”, diz Rostagno. “De certa forma, uma política fiscal austera poderia compensar o menor crescimento da economia”, finaliza o representante.
Para o professor de economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Pedro Raffy Vartanian, a taxa de juros deve também se elevar em 2015, contribuindo para a convergência gradual da inflação ao centro da meta de 4,5%, mesmo que isso custe alguns pontos percentuais a menos em termos de crescimento econômico. “O baixo crescimento vai contribuir para que a inflação caminhe, gradualmente, ao centro de 4,5%”, afirma ele.
Para Vartanian, o aumento dos juros não somente afetará o consumo, como também pode elevar um pouco a taxa de desemprego ou, pelo menos, reduzir a contratação no mercado de trabalho, devido a menor atividade de diferentes setores da economia.
Já o professor do Instituto Insper, Otto Nogami, avalia que o que está em jogo é a inflação de custo. “Nós estamos vivendo um momento onde as famílias estão altamente endividadas. A pressão inflacionária, portanto, já não é mais de demanda. É uma inflação de custo das empresas”, diz Nogami. “Diante desse cenário, a taxa de juros não tem mais eficiência, apesar da queda da demanda”.
Para Nogami, a solução para reduzir a inflação de custo é de longo prazo, com a retomada de investimentos no setor produtivo, para que as empresas tenham produtividade. “Se houver uma retomada da atividade econômica, na medida em que as pessoas voltem a consumir, e o setor produtivo não estiver preparado, o BC terá que aumentar os juros de novo”, exemplifica Nogami.
Independência
Após a candidatura de Marina Silva pelo PSB, o debate sobre um Banco Central independente passou a ganhar a força.
Para Rostagno, uma autoridade monetária com autonomia deixaria o governo mais cauteloso quanto aos seus gastos, já que este estaria ciente da possibilidade de um aumento de juros “O BC teria mais autonomia para pressionar o governo”, afirma o economista do banco Mizuho.
Além disso, Rostagno avalia que um BC independente colaboraria para a diminuição da Selic no longo prazo, devido à redução de prêmios de investidores na curva de juros.
Vartanian também diz que um BC autônomo também fica livre de pressões políticas. E que, nesse sistema, os mandatos da Presidência da República e da entidade não devem se coincidir, para que o BC fique livre de ciclos políticos. Ele explica também que em economias desenvolvidas, uma autoridade monetária nesses termos, é igual uma inflação baixa. No entanto, diz que, em países emergentes, essa fórmula não é tão exata, por conta da maior oscilação do câmbio.
Repercussão
Para o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Benjamin Steinbruch, a manutenção da Selic em 11% ao ano coloca em risco a situação financeira de empresas e trabalhadores. “Por causa do cenário desenhado pelos números do PIB, somado à contínua deterioração da confiança das empresas e dos consumidores, esperávamos um corte na taxa básica de juros, que infelizmente não ocorreu, mantendo o Brasil com a taxa mais elevada do mundo”, afirma.
Para o presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Rogério Amato, a decisão do Copom não surpreendeu. “No entanto, acreditamos que haveria espaço para uma redução moderada da taxa, considerando o baixo nível das atividades econômicas, que não apresentam perspectivas de melhora no curto prazo”, afirma Amato.
Fonte: DCI – 04/09/2014.