21/10/2013
Combinação de tributos prejudica negócios
Pequena empresa precisa investir em organização e até fiscalizar clientes para não ter problemas com impostos Substituição tributária faz com que empresário que vende para outros Estados tenha de pagar ICMS duas vezes Contando todas as obrigações federais, estaduais e municipais, o Brasil tem 15 milhões de combinações tributárias, segundo levantamento do Sescon-SP (sindicato que reúne as empresas de serviços contábeis).
E nem no regime tributário Simples, que unifica o pagamento de impostos, o pequeno empresário está sempre livre do emaranhado. É o caso do proprietário da ótica Lente de Contato.net, Edson Calamia, 49, que faz vendas para o país todo e desde 2008 também paga a substituição tributária –regime que faz com que uma das partes da cadeia comercial seja responsável por recolher antecipadamente o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) de todas as transações futuras do produto.
Funciona assim: em vez de recolher o tributo relativo a refrigerantes de todos os bares de um Estado, o Fisco pode decidir que a bebida é sujeita a substituição tributária. Com isso, o fabricante de bebidas recolhe o ICMS que lhe cabe e também o que os bares pagariam quando vendessem o refrigerante ao cliente. O problema para os pequenos que usam o Simples é que o ICMS também já está embutido na unificação de cobrança de impostos, por isso ocorre um recolhimento duplo. “Meus pagamentos de ICMS aumentaram até 15%. Vou precisar mudar de regime tributário”, diz Calamia. Por isso, o contador Sebastião Gonçalves e conselheiro do CRC-SP (Conselho Regional de Contabilidade) afirma que cada empreendedor deve avaliar se vale a pena continuar no Simples. “Deve-se pensar se o Simples vale a pena, comparando a redução de custos nos encargos trabalhistas e no preço final de seu produto e o custo dobrado do ICMS.” Para Fábio Soares de Melo, professor do Insper, a substituição tributária cria um panorama de insegurança jurídica, já que o Fisco pune fornecedores que têm clientes inidôneos –por exemplo, os que compram dizendo que os produtos serão para uso final ou próprio, mas os revendem.
“Se o Fisco descobre isso, ele autua também o fornecedor”, afirma (veja dicas no quadro abaixo). LEGISLAÇÃO Está em discussão no Congresso uma mudança no Simples que poderia reverter isso. O Projeto de Lei Complementar nº 237, de 2012 prevê o fim da substituição tributária para as micro e pequenas empresas. O texto também propõe a ampliação das categorias que podem ser incluídas no Simples, tendo como único critério o faturamento da empresa, cujo teto hoje é de R$ 3,6 milhões por ano, e não o ramo de atividade.
A proposta tramita em uma comissão especial na Câmara. De acordo com o deputado federal Cláudio Puty (PT-PA), relator da matéria, nos últimos dias as mudanças foram apresentadas ao Ministério da Fazenda e à Receita Federal para negociação de cada ponto.
A medida deve encontrar resistência na Receita Federal e nos governos estaduais. Entre aqueles que gostariam de estar no Simples, mas são proibidas, estão as pequenas e médias consultorias, que são obrigadas a escolherem o regime de lucro real ou presumido. Tânia Matos, 45, é sócia da consultoria de gestão organizacional e gestão de pessoas Muttare, que só tem dois funcionários, mas sete sócios por causa dos encargos trabalhistas. No Simples, os custos trabalhistas também entram no pagamento unificado, e por isso são menores. “É uma pena, poderíamos ser muito mais competitivos com o Simples. Algumas vezes o empresário segue a lei e é punido”, comenta. Os três regimes tributários do Brasil, de lucro real, lucro presumido e o Simples, têm um tipo de ganho para cada espécie de empresa. Por isso, a escolha nem sempre é fácil. Márcio Iavelberg, sócio da consultoria Blue Numbers, destaca que até o Simples, que unifica e facilita o pagamento de impostos, pode não ser o modelo ideal para as pequenas e médias empresas. Combinação de tributos prejudica negócios Artifícios jurídicos podem reduzir tributos para empresas Isso ocorre em negócios com margem de lucro muito reduzida ou em busca de créditos tributários.
“Não deixe o contador empurrar o Simples sem antes analisar outras opções. Para ele fica mesmo mais rápido, mas nem sempre é a melhor opção”, diz o especialista. Também há o caso quase oposto, pequenas companhias que não desejam sair do Simples pelos benefícios reais que têm. Quando estouram o limite de faturamento anual, hoje em R$ 3,6 milhões, criam subterfúgios ilegais -como abrir outras empresas para diluir o faturamento entre elas, mas fazer com que elas troquem mercadorias e mão de obra, sem fazer os registros.
“Se o Fisco descobre, autua na hora. Vale muito mais a pena se organizar e ir para outro regime tributário”, diz Iavelberg. O presidente do Sescon-SP (sindicato que reúne as empresas de serviços contábeis do Estado), Sérgio Approbato Machado Júnior, esclarece que a opção por cada regime tributário ocorre no mês de janeiro.
Na virada de cada ano, deve ser feita uma rotina de estudos. “Empresas novas devem fazer análises econômicas de tendências do seu mercado, dos gastos em geral e das leis. As já estabelecidas devem incluir também um estudo de como foi seu último ano fiscal”, recomenda Júnior. SEPARAÇÃO A empresa de TI IPconnection é uma pequena empresa que faz isso todos os anos e encontrou uma solução mais vantajosa. Seu diretor financeiro Renato Otto, 46, conta usar o regime de lucro real, mas criou uma outra empresa, com CNPJ, funcionários e função diferentes e separados, a IPservice, que está no Simples.
A empresa original, que trabalha com venda de hardware e licenças de software, tem taxas de retorno reduzidas, por isso a opção pelo regime de lucro real -no qual os impostos são cobrados apenas sobre o lucro realmente apurado.
Já a IPservice presta serviços de instalação e configuração e tem 33 funcionários. “O Simples costuma ser melhor para companhias de serviços, principalmente quando têm muitos funcionários”, afirma. Há menos encargos trabalhistas nesse regime. Uma falha comum relacionada à ineficiente gestão tributária é a inadimplência no pagamento de tributos. “Verificamos que em 60% dos casos o empreendedor tem inadimplência no pagamento de tributos porque simplesmente não sabe as datas de pagamentos. É uma dor de cabeça fácil de ser evitada, é só buscar essa informação”, destaca Júlio César Durante, consultor do Sebrae-SP.
Fonte: Jornal Folha de São Paulo
Data: 20/10/2013