29/06/2022
Webinar do Comitê Alumni de Gestão da Saúde debateu os desafios e as oportunidades que o uso de evidências oferece para promover a saúde em vez de tratar da doença
Leandro Steiw
Antes mesmo da pandemia da covid-19, a preocupação com os custos de planos de saúde influenciava a estratégia das empresas. Os dados indicam que a saída imediata era trocar para um pacote inferior de serviços, como foi discutido no webinar Excelência na Saúde Corporativa – O que falta?, realizado pelo Comitê Alumni de Gestão da Saúde do Insper. No dia 28 de junho, os convidados debateram questões específicas do setor, como os desafios e as oportunidades para mudar a assistência de saúde nas empresas.
O evento foi apresentado por Victor Piana, coordenador do comitê e diretor geral do Hospital A.C. Camargo, com debates conduzidos por José Antônio Maluf, consultor sênior do programa de gestão e desenvolvimento do corpo clínico na consultoria do Hospital Israelita Albert Einstein. A boa notícia é que existem práticas baseadas em evidências e dados que conseguem integrar a saúde como parte indissociável da vida corporativa.
Luiz Edmundo Prestes Rosa, diretor da Associação Brasileira de Recursos Humanos, apresentou dados sobre saúde corporativa. De 704 empresas pesquisadas em 2020, com um contingente de 6,5 milhões de beneficiários de planos de saúde, 70% consideravam que o custo com ações de saúde estava crescendo muito acima da inflação. O que chama a atenção é que 83% das companhias não acreditavam na redução desse custo. Em quatro de dez empresas, o orçamento de saúde estava na mão de analistas e coordenadores, ou seja, pessoas que estão no terceiro ou quarto nível de decisão, sem conexão direta com a direção.
Apenas metade das empresas pesquisadas usava indicadores para acompanhar a saúde dos funcionários, mas eram basicamente os números de sinistralidade. “Essa fragilidade das estratégias aparecia não só na falta de indicadores, mas também na falta de programas que são absolutamente essenciais para uma boa gestão de saúde na empresa”, disse Rosa.
Uma das lacunas eram os programas voltados a grupos de risco — doenças crônicas, por exemplo —, que têm o maior impacto no custo de saúde. Faltavam ainda programas de alimentação saudável, atividade física e saúde mental. Segundo Rosa, para o reequilíbrio dos custos, as principais iniciativas em saúde corporativa são a opção por planos de serviços mais baratos, aumento da carência, exclusão de dependentes e aumento de participação financeira dos funcionários.
Ricardo Marchi, fundador e ex-presidente da Associação Brasileira de Qualidade de Vida, citou um paradoxo do sistema, porque as empresas contratariam “plano de doença”, e não plano de saúde. Durante anos, insistiu-se no modelo de controle de custos e agora se admite que educação é necessária — embora se fale pouco a respeito. E as soluções seriam simples: pessoal qualificado, incentivo a hábitos saudáveis e treinamento. “Se existe treinamento em segurança e prevenção de acidentes, por que a empresa não faz treinamento em saúde?”, questionou.
Para Marchi, saúde é uma responsabilidade partilhada entre empregador e empregado. “Convencer a gestão da empresa que saúde e produtividade estão intimamente conectadas é um desafio”, afirmou. Ele disse que a questão não é saber quanto custa manter os funcionários saudáveis, mas quanto custa se eles não forem saudáveis.
Como exemplo de políticas bem-sucedidas na área, Márcia Agosti, gerente de programas de saúde da General Eletric para América do Sul, apresentou a visão holística da empresa. Ela observou que três temas muito críticos são o dever de cuidado, a responsabilidade social corporativa (ESG) e a experiência de valor para o empregado. Na GE, os programas preveem várias intervenções no âmbito de temas como desigualdades sociais, poder institucional, condições de vida, comportamentos de risco, doenças e danos físicos e mortalidade.
Segundo Márcia, a empresa foca em bem-estar (estilos e hábitos saudáveis de vida) e em viver com qualidade (julgamento positivo da própria vida pela pessoa). “Temos muitas ações de bem-estar, que propõem interferir no estado de saúde da pessoa, para que ela possa mudar estilos de vida, e que levam a uma experiência favorável de saúde”, afirmou. “Quando você interfere nesse momento, no momento seguinte a pessoa já vai estar transformada. Então, não vai haver nunca um único conceito. Porque há o efeito da sua ação que precisa ser observado e estudado, para construir um cardápio de soluções que seja útil para transformar esse olhar.”
Para Ana Lúcia de Castro Rizzi, gerente e head de health analytics da Dasa Empresas, por mais madura que as companhias sejam em relação ao pilar de saúde, com indicadores e engajamento de seus funcionários, não se consegue atuar de forma efetivamente no desfecho clínico desses funcionários. “Hoje, temos informações de planos com dados de 60 dias atrás, de problemas que já se resolveram ou não estão mais em andamento”, afirmou.
A ideia é avançar na produção de evidências. “Estamos tentando trabalhar com a informação do indivíduo durante o processo de internação e já vincular a saída do hospital a um programa de acompanhamento no pós-alta, evitando as reinternações crescentes, que acontecem muitas vezes por falta de orientação ou entendimento depois do processo de alta”, disse Ana Lúcia. O médico solicitante é o vínculo entre as interações com o beneficiário.
Guilherme Salgado, cofundador e CEO da healthtech 3778, contou que a empresa nasceu como analista pura de dados e foi migrando também para a prestação de serviços corporativos. Para ele, simplesmente digitalizar o acesso à saúde não vai trazer o resultado esperado, porque o acesso descoordenado custa mais caro ao longo do tempo. Outro problema é que as realidades são diferentes entre os beneficiários dos planos, como acesso a vídeo para consultas, escolaridade, transporte até a clínica.
“Cinquenta por cento das pessoas saem com dúvidas do consultório do médico, então você dá o acesso e, muitas vezes, não tem uma continuidade por causa de dúvidas”, afirmou. “Pensar diferente não é só replicar digitalmente o que se fazia.” Segundo Salgado, já existe volume de dados suficiente para fazer as modificações que passam pela promoção da saúde, e não pelo tratamento da doença. Assim, a estratégia de simplesmente mexer nos planos de saúde dos funcionários para o reequilíbrio de custos pode deixar de ser a solução. Basta olhar para as boas práticas.