O Banco Central decidiu que não vai recorrer da decisão da Justiça de negar o pedido de ação penal contra o economista e colunista da Folha Alexandre Schwartsman.
A procuradoria-geral da instituição ofereceu queixa-crime contra Schwartsman, acusando-o de difamação. O pedido foi negado pela juíza que analisou o caso.
O que motivou a ação foram afirmações de Schwartsman em entrevistas à imprensa, como a de que o BC atuou com “subserviência, descuido, incompetência e frouxidão”. Na ocasião, o economista havia criticado a condução da política monetária no combate à inflação.
O BC informou que acata a decisão e dá como concluída sua atuação nesse caso.
A polêmica sobre a iniciativa do governo, entretanto, não está encerrada. Até o fechamento desta edição, 1.600 pessoas haviam assinado documento que critica a ação do BC contra Schwartsman. A lista inclui mais de 60 economistas de várias escolas e simpatias partidárias.
O documento foi lançado pelo diretor vice-presidente do Insper, Marcos Lisboa.
Entre as assinaturas, estão as de Nelson Barbosa, ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda no governo Dilma Rousseff, e do economista Luiz Gonzaga Belluzzo – ambos próximos da administração petista.
“Eu discordo de muitas coisas do Schwartsman, mas acho que o debate com ele tem de ser travado na economia, e não na Justiça”, afirmou Barbosa.
Também assinaram a lista ex-presidentes do BC, como Affonso Celso Pastore, Gustavo Franco e Armínio Fraga, e de ex-diretores da instituição, como Claudio Haddad. Há economistas ligados às candidaturas de Aécio Neves e de Marina Silva.
O BC informou que a decisão de ir à Justiça foi submetida pela procuradoria à diretoria da instituição, formada pelo presidente Alexandre Tombini e pelos outros sete membros do Copom (Comitê de Política Monetária).
“Acho nocivo à democracia que instituições, principalmente as públicas, façam uso de seus vastos recursos para constranger críticas às suas ações, mesmo as mais ácidas”, afirmou o professor da PUC-RJ Márcio Garcia.
Para o Sindicato Nacional dos Funcionários do BC, a decisão foi prejudicial à imagem da instituição, além de levantar dúvidas sobre a participação de outras áreas do governo nesse caso.
No abaixo-assinado, os signatários dizem que já foram feitas críticas muito piores e às vezes inverídicas à instituição, como a de que o BC seria manipulado pelos bancos, sem qualquer retaliação.
Opinião: Tese do procurador do BC contra colunista era polêmica
O Banco Central voltou atrás. Não entrou com recurso contra a decisão que rejeitou a queixa-crime em que acusava Alexandre Schwartsman de difamação. O assunto está encerrado. Estará?
A tese do procurador era no mínimo polêmica. Acreditava que a pessoa jurídica pode ser difamada, como se fosse pessoa física. O Código Penal pune a difamação no título de crimes contra a pessoa. No mesmo título em que estão os homicídios. Ora, assim como não se pode assassinar uma pessoa jurídica, não se poderia difamá-la.
Se a argumentação do procurador valesse, em princípio, para o Banco Central, valeria também para o Congresso, ou para a Presidência da República. Todos teriam uma honra objetiva a ser protegida contra críticas.
Ou seja, saímos diretamente do difícil ambiente de democracia que estamos construindo para o latente ambiente de autoritarismo que sempre quer voltar.
O Banco Central com certeza avaliou as consequências dessa argumentação e da ação judicial.
Ela estimula a judicialização da política monetária e cambial. Convida o juiz e o Judiciário a avaliarem se as decisões do BC foram temerárias ou não, por exemplo. Se foi responsável por aumentar ou não a inflação; se foi temerariamente omisso.
O Judiciário como regulador é um risco imenso. Cria sem querer um concorrente ao próprio Banco Central. Como aliás temos visto em vários outros setores regulados da economia.
Segundo, política monetária e cambial, políticas econômicas em geral, são concretização de teorias, conceitos e ideais. Como o próprio nome indica não se trata de concretizar verdades científicas, mas políticas.
O que temos assistido no mundo inteiro é que não existem teorias e verdades econômicas unívocas. A crítica, o debate, o contraditório são inerente não apenas à democracia, como também às ideias, às políticas e às estratégias.
A intimidação judicializante abre espaço para a teoria do economista ocasionalmente de plantão no BC. Com ou sem mandato fixo.
Joaquim Falcão é professor de direito constitucional da FGV Direito Rio.
Fonte: Folha de S. Paulo – 10/09/2014.