23/05/2014
Um retorno médio anual de 19,20% contra uma rentabilidade de 11,61%. Esse é o retrato do desempenho médio do Idiv, o índice de dividendos, comparado ao do Ibovespa, o referencial da bolsa brasileira, no período de 2006 a 2013. Embora o Idiv tenha sido lançado oficialmente em maio de 2011, ele tem como base retroativa os cinco anos anteriores. E ela dá uma sinalização importante ao investidor que está de olho numa opção mais defensiva.
O índice mede o comportamento das ações de empresas que se destacaram em termos de remuneração dos investidores, sob a forma de dividendos e juros sobre o capital próprio. Em 2011, ele subiu cerca de 14%, enquanto o Ibovespa caiu 18,1%. Em 2012, o Idiv teve alta de 21,50% (acima do ganho de 7,4% do índice referencial da bolsa) e, em 2013, queda de 4,24%, contra perda de 15,5% do Ibovespa.
Já neste ano, a situação não está tão confortável para o índice de dividendos, que acumulava até terça-feira queda de 1,84% e, portanto, perdia do Ibovespa, que subia 1,67%.
Não é segredo para ninguém que tem sido cada vez mais desafiador, para dizer o mínimo, encontrar as boas oportunidades do mercado doméstico. O garimpo tem sido repetido exaustivamente por gestores há algum tempo. E mesmo aqueles com uma estratégia mais voltada aos dividendos também estão tendo que rebolar mais.
Levantamento da Santander Corretora com base em 97 ações revela que o “dividend yield” (relação entre o dividendo por ação distribuído e o preço do papel) médio foi de 3,7% em 2013. Já as projeções para este e o próximo ano são de 4,1% e 4,7%, respectivamente.
Segundo Daniel Gewehr, estrategista-chefe da corretora e responsável pelos dados, o número do ano passado surpreendeu negativamente, dada a revisão para baixo de crescimento do lucro das empresas, que era de 17% em janeiro de 2013 e ficou em apenas 10%. O dividend yield do último ano ficou menor que o de 2012 (4,2%), igual ao de 2011 e acima do de 2010 (3,4%).
E nada impede que o cenário se repita. O Santander projeta expansão dos resultados de 19% para este ano, mas o estrategista afirma que o número poderá ser menor, dado que as estimativas de crescimento do PIB têm sido revistas para baixo. Para 2015, o dividend yield estimado leva em consideração um aumento de lucro das empresas acompanhadas ao redor de 13%.
O diretor-executivo de gestão de fundos da BB DTVM, Carlos André, destaca que a estratégia de dividendos costuma ter uma performance em termos comparativos mais interessante em momentos de bolsa com trajetória menos definida. Trata-se de uma estratégia mais conservadora. E a perspectiva é de melhora desse tipo de carteira ao longo do ano.
“Até o momento, em 2014, a estratégia de dividendos tem uma performance aquém do Ibovespa, mas enxergamos daqui para frente uma opção que pode render alguns frutos, talvez com uma volatilidade mais acentuada da bolsa, em meio à aproximação do cenário eleitoral, à situação do cenário internacional, dentre outras coisas”, diz.
Ainda que o Idiv seja um indicador de referência, cabe ao investidor ter uma carteira selecionada para aproveitar as melhores oportunidades entre as empresas pagadoras de dividendos. Conforme mostra a tabela, no ano passado, o setor de telecomunicações, mídia e tecnologia entregou o maior retorno com dividendos, de 9,4%, com destaque para as ações da Telefônica (10%). Já neste ano, o segmento de mineração lidera o ranking conforme as estimativas do Santander, com o maior dividend yield, de 6,3%, puxado pelos papéis da Vale (6,3%).
Mas não é apenas com base nesse indicador que um investidor deve montar seu portfólio. O professor de finanças do Insper, Michael Viriato, lembra que existem duas fontes de retorno: uma a partir de dividendos e outra com ganhos de capital, que refletem a evolução do preço de uma ação na bolsa.
“Não adianta nada comprar uma ação olhando simplesmente para o dividendo e esquecer o indicador preço, que é o ganho de capital”, diz. Segundo Viriato, o dividendo costuma ser um elemento menos significativo na conta total de retorno, mas se torna mais relevante em casos de companhias sem perspectivas de mudanças de preço, com um desempenho mais estável em bolsa.
O estrategista do Santander ressalta que é preciso analisar ainda o histórico das companhias. “Gostamos de empresas que tenham um bom dividend yield, mas também gostamos de ver como está o crescimento do dividendo”, assinala Gewehr.
Nesse sentido, ele menciona o caso de BB Seguridade, que indica retorno com dividendo de 4,3% em 2014, mas apresenta uma expansão de lucro da ordem de 20% ao ano, o que deve garantir retornos maiores nos próximos anos. “E outra coisa interessante de olhar é que quando a empresa consegue aumentar o lucro e pagar dividendo junto, quer dizer que o negócio gera um rendimento bom, não precisa de muito para crescer”, afirma o estrategista.
Diante da busca de papéis que apresentem um bom retorno sobre patrimônio e sobre o capital investido, e não sejam apenas os maiores pagadores de dividendos, a Santander Corretora inclui Ambev (com dividend yield de 4,5% previsto para 2014), Ultrapar (3,8%) e a já mencionada Vale. E no portfólio de small caps, destaque para as ações da Mahle Metal Leve (7,3%) e da Alupar (9,7%).
Embora o setor elétrico seja a principal referência quando se pensa em dividendos e ainda conte com ações com retornos atrativos, como Cesp (com projeção de dividend yield de 17,8% para este ano) e AES Tietê (15,8%), a Santander Corretora tem um posicionamento “underweight” (abaixo da média de mercado) para o segmento, dada a visão de risco regulatório. “Se as empresas não conseguirem repassar tarifas, talvez os lucros sejam revistos para baixo e isso afete o dividend yield”, afirma o estrategista da casa.
Juan Morales, gestor e sócio da Grand Prix Investimentos, conta que as mudanças macroeconômicas levaram a gestora a adotar uma estratégia mais agressiva em seu fundo de dividendos com distribuição trimestral dos proventos. “Como vimos um ciclo de alta da taxa de juros no Brasil, o custo de oportunidade do investidor aumentou, e nosso produto é comparado com o CDI. Tivemos que ser um pouco mais agressivos na composição de nossa carteira.”
Isso quer dizer que a gestora tentou concentrar mais papéis com distribuições elevadas de dividendos e aumentou recentemente a exposição às ações da Vivo/Telefônica, com perspectiva de retorno com dividendo na casa dos 7% neste ano. “É um papel que conjuga resultados bastante estáveis, de uma empresa constante na distribuição de dividendos, em um mercado relativamente estável, com uma política clara, então temos uma previsibilidade grande no fluxo de caixa”, afirma Morales.
Assim como o Santander, a gestora gosta dos papéis da BB Seguridade e aumentou a exposição no portfólio, de olho em resultados que têm superado as expectativas consistentemente, no controle de custos e na expansão de receita. “A BB Seguridade está conjugando crescimento de lucros e distribuição de dividendos. E normalmente isso nos leva a um perfil de empresa num estágio de vida mais consolidado, líder de mercado, sem muita necessidade de fazer investimento para crescer”, aponta.
No sentido oposto, a Grand Prix excluiu as ações da Coelce e da Vale, essa última por se tratar de uma empresa cíclica, que não oferece previsibilidade de resultado.
Pedro Barbosa, sócio da STK Capital, ressalta que o investidor precisa estar atento ao pensar numa estratégia de dividendos, já que uma companhia pode distribuir um provento elevado, mas indicar, ao mesmo tempo, que não tem onde alocar os recursos. “Nosso foco está muito em ações que geram caixa, na previsibilidade da geração de caixa, no potencial de crescimento da empresa e qual o preço que estamos pagando por isso”, afirma o sócio da STK, que também conta com um fundo de dividendos que distribui os proventos.
A escolha, diz Barbosa, precisa levar em conta companhias com boa chance de sucesso no futuro, o que, na visão da STK, se enquadra para os papéis de Ambev, Cosan e Aliansce. O sócio ainda reforça que, a longo prazo, esse tipo de aplicação é interessante para a pessoa física, especialmente de olho na aposentadoria. “É uma estratégia muito importante numa carteira de investimentos, no planejamento financeiro”, comenta.
Viriato, do Insper, ressalva que fazer a própria gestão desses papéis não é tarefa trivial para um investidor de varejo, que costuma olhar apenas para o retrato de anos anteriores. “O ganho passado não te dá retorno no futuro”, lembra o professor. Para quem não tem a disciplina necessária, Viriato recomenda procurar fundos específicos de dividendos ou o fundo de índice (ETF, na sigla em inglês) de dividendo negociado na bolsa.
Fonte: Valor Econômico – SP – 22/05/2014