Para chegar à aposentadoria em situação considerada ideal não há outra receita além da combinação entre disciplina e planejamento – de preferência, de longo prazo. Apesar de as pessoas enfrentarem realidades distintas, com rendas e necessidades diferentes ao longo da vida, há um cenário ideal comum que é manter o padrão de vida. De preferência, viver sem aperto financeiro caso a pessoa não queira ou não possa trabalhar.
Para isso seria recomendável aposentar-se em condições de receber mensalmente uma renda equivalente a, no mínimo, 70% do último salário. Seria o suficiente para bancar gastos básicos. Esse dinheiro poderá vir de mais de um canal: do INSS e de produtos como os de previdência privada ou outros tipos de investimentos financeiros e da venda ou aluguel de imóveis. Uma combinação de todos – mais de um canal de renda e o acúmulo de patrimônio – seria o cenário ideal, na visão de especialistas consultados pelo Valor.
Uma importante diretriz é poupar entre 10% a 30% da renda mensal obtida no presente para a economia relacionada à aposentadoria. “É claro que a renda recebida no futuro dependerá também do tempo de acúmulo, mas esse é um bom parâmetro”, diz Evaldo Alves, professor da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV/Eaesp). “Não é bom ir além desse teto porque se não a pessoa corre o risco de ficar inadimplente no presente”, diz.
O fator tempo é fundamental já que quanto mais cedo for possível começar, maior será o volume de recursos. “O ideal é começar a investir com cerca de 20 anos. Nesse caso já se pode pensar em guardar 10% da renda, e a previdência é uma opção de ferramenta, fora o que for direcionado para o INSS”, sugere Leonardo Bastos, coordenador do curso de ciências econômicas do Centro Universitário Newton Paiva. Há quem conte com a vantagem de ter pais preocupados com isso. Bastos, por exemplo, deposita R$ 100 mensais em um fundo destinado à terceira idade para a filha de apenas sete anos. Esse não é um caso comum, já que a maior parte das pessoas no Brasil não está acostumada a fazer planejamento de tão longo prazo.
Outro aspecto importante é não se ater apenas ao benefício do governo. Como raramente as pessoas conseguem receber o teto do INSS ao se aposentarem – e mesmo se conseguissem o valor não seria suficiente em para manter o padrão de vida em muitos casos -, é importante apostar em caminhos complementares.
Nesse cenário, a previdência privada se apresenta como alternativa interessante devido aos benefícios fiscais. “Os usuários não pagam o come-cotas semestral como nos fundos de investimentos e há também os benefícios do PGBL, por exemplo“, lembra Michael Viriato, coordenador do laboratório de finanças do Insper. Quem faz a declaração completa de Imposto de Renda e destina até 12% de sua renda anual tributável para planos nos moldes do Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) paga menos imposto no presente.
Para Viriato, no entanto, o melhor seria contratar um conselheiro financeiro. “Dessa forma o investimento em previdência ou em outro produto financeiro será customizado“. O coordenador do Insper faz analogia entre planos de previdência e de academias de ginástica: “Você pode se matricular e fazer o treino que o professor do local indica. Ele vai te passar treinos padrão, que serão ótimos e vão funcionar. Mas se você contratar um personal trainer, os exercícios serão bem mais específicos. É similar na previdência“. O detalhe pode ser o diferencial no futuro. Uma pessoa pode economizar o mesmo valor que outra, só que ter a saúde mais delicada. Esse fator exigirá que ela faça economia extra, por exemplo. Saúde, lembram os especialistas, é um item muito relevante à medida que o tempo passa e há quem esqueça de considerá-la com a devida importância.
Segundo Bastos, também deve entrar na lista fazer um pé de meia para o presente. Seria o equivalente à poupança de seis meses de salário atual. “Se ela perder o emprego não avançará nos recursos da aposentadoria.” Na avaliação do professor do Insper, esse montante deve ser até maior e equivalente a um ano do salário atual. Como nem sempre a renda é suficiente para garantir a situação ideal, a recomendação é tentar garantir ao menos o INSS e uma complementação.
Geralmente ao longo da vida também há um esforço para ter ao menos a casa própria, o que alivia despesas com moradia lá na frente. Outra dica fornecida pelos especialistas é olhar não apenas para a renda, mas também para gastos. Pode ser que a pessoa não ganhe dinheiro suficiente para pensar em tudo o que é proposto na situação ideal de aposentadoria, mas será que não poderia redirecionar para a aposentadoria algum gasto desnecessário? “As pessoas acham que patrimônio em imóveis é fundamental. Eu discordo“, diz Viriato. Para o coordenador do Insper, o pensamento foi reforçado nos anos recentes. Mas lembra que na década de 1990 se “perdeu barbaramente” nesse setor.
Fonte: Valor Econômico – 15/12/2014