15/07/2014
A Oi, em processo de fusão com a Portugal Telecom (PT), registrou ontem o seu maior tombo na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) desde que veio a público a informação de que a companhia portuguesa comprou € 897 milhões (cerca de R$ 2,6 bilhões) em títulos da Rioforte — empresa do Grupo Espírito Santo, dono de 10% das ações da PT, e que passa por dificuldades financeiras, de acordo com analistas do mercado. Ontem, as ações preferenciais (PN, sem direito a voto) da Oi caíram 14,46%, fechando na mínima do dia (R$ 1,42), e as ordinárias (ON, com direito a voto) amargaram recuo de 14,06%. Em duas semanas, desde que a operação veio à tona, a empresa carioca acumula queda de 29% em seu valor de mercado: perdeu R$ 4,8 bilhões, para R$ 12 bilhões. Ou seja, já viu virar pó quase uma PT, que ontem valia cerca de R$ 5 bilhões.
Segundo fontes, o risco de calote é real, o que pode prejudicar o processo de fusão das duas companhias. Os títulos da Rioforte foram comprados pela PT há três meses, sem o conhecimento da Oi e de investidores estrangeiros que participavam, no mesmo momento, da capitalização da Oi. Agora, os acionistas da Oi — que já criticaram a operação da PT, como o BNDES — querem que a companhia portuguesa honre seus compromissos. Do outro lado, a PT vem tentando convencer os brasileiros a reverem sua fatia na nova empresa, batizada de CorpCo. Os títulos vencem na próxima semana, nos dias 15 e 17.
FIM DA SUPERTELE, DIZEM ANALISTAS
Analistas explicam que o forte recuo nas ações da Oi se deve ao fato de o Espírito Santo Financial Group (ESFG) — uma das empresas do Grupo Espírito Santo — ter pedido ontem suspensão da negociação de suas ações devido a “dificuldades materiais” em sua controladora Espírito Santo Internacional, dona ainda da Rioforte. O ESFG tem 25% das ações do Banco Espírito Santo (BES). Com isso, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM, órgão regulador do mercado de capitais de Portugal) decidiu suspender as ações do BES na Bolsa de Lisboa. Isso fez as ações da PT caírem 6,8%. Em duas semanas, a empresa já perdeu 31,6% de seu valor de mercado (€ 773 milhões, ou R$ 2,3 bilhões), recuando a € 1,671 bilhão (cerca de R$ 5 bilhões).
— Houve uma contaminação geral nas ações das empresas. O movimento do Grupo Espírito Santo ontem alterou o valor de mercado de Oi e PT. Como há muita incerteza sobre o pagamento dessa dívida, os papéis devem continuar recuando. A queda da ação da Oi não surpreende, pois já vimos recuos similares em períodos anteriores — disse Lucas Marins, analista da corretora Ativa.
William Araújo, analista da UM Investimentos, endossa essa avaliação. Para ele, haverá ainda muitos capítulos até a próxima semana. Ronaldo Sá, sócio da Orion Consultores, lembra ainda que o acordo entre as duas companhias pode estar em vias de ser rompido, reforçando a tese de que o projeto da supertele, surgido com a compra da Brasil Telecom pela Oi, em 2008, nasceu com problemas, sobretudo financeiros:
— A Oi era só um investidor para desenvolver os segmentos fixo e móvel em sua área de concessão e na área da antiga Brasil Telecom. Como não houve fôlego financeiro para os investimentos, chamaram a PT, uma empresa pequena para os padrões da Europa. Agora, vemos esse problema na companhia, que fez um investimento arriscado. A ideia da supertele nacional se torna, mais uma vez, inviável. A solução vai ser buscar outro parceiro.
FATIAMENTO DA TIM PERDE FORÇA
O consultor Virgílio Freire, ex-presidente da Vésper, lembra que o episódio também enterra de vez a criação de uma grande empresa nacional e coloca em xeque a capacidade da Oi de investir e fazer frente aos concorrentes TIM, Claro e Vivo:
— Nesse episódio, os acionistas brasileiros saem enfraquecidos. A Oi vê ainda uma situação mais complicada, devido ao alto nível de concorrência, pois a gestão perde tempo resolvendo problemas com os acionistas. Não é uma boa hora para estar enfraquecida.
Uma fonte do setor lembrou ainda que, neste momento, a hipótese de fatiar a TIM, levantada há alguns meses, está cada vez mais distante. Segundo esse executivo, Zeinal Bava, presidente da Oi e da PT, era justamente um dos defensores da divisão da companhia italiana, que passa por mudanças em sua holding controladora, a Telco, na qual a Telefónica, dona da Vivo, é majoritária.
— A Oi levou essa surpresa da PT. A controladora da Claro, a América Móvil, está tendo de vender ativos para reduzir sua concentração de mercado no México. Quem vai negociar com a Vivo? Será que esse fatiamento vai para frente? Está mais distante que nunca — disse a fonte. Mas, para a Oi, a única saída ainda é a fusão com a PT. Segundo Marins, da Ativa, dificilmente uma companhia com dívida de R$ 30 bilhões (no fim do primeiro trimestre) pode atrair o interesse de algum concorrente.
Investidor precisa ficar de olho na governança das companhias.
Quem comprou papéis na capitalização não tem alternativa senão esperar. Os investidores que compraram ações da Oi durante a capitalização, em abril, não têm muito o que fazer agora, além de acompanhar o desenrolar da crise para decidir se esperam ou não que o papel se recupere. A perspectiva, por enquanto, é que a crise se resolva, já que há governos envolvidos nos dois lados. E fica a lição: é preciso estar atento à governança das empresas, alertam especialistas, e não só às perspectivas de lucro.
— Mudança no controle pode comprometer a capacidade de investimentos da empresa — diz Silvio Paixão, professor de finanças da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis (Fipecafi). No caso da Oi, já havia um histórico de mudanças súbitas nos rumos, lembra o professor Alexandre Chaia, do Insper:
— O problema da Oi era tomar empréstimos para capitalizar outras empresas do grupo. E, em 2010, a Telemar, da qual surgiu a Oi, rompeu com a Brasil Telecom, uma indicação de governança duvidosa. Ironicamente, o projeto de fusão com a PT inspirou otimismo ao levar à tele brasileira a expectativa de melhora na gestão de endividamento e na governança corporativa.
Fonte: O Globo – RJ – 11/07/2014