Notas melhores na escola são seguidas por maior remuneração no mercado de trabalho. Essa hipótese acaba de ser testada no Brasil e se mostrou verdadeira.
Um estudo da Fundação Itaú Social, que será divulgado hoje, revela que alunos com nota 10% maior em português no Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica) têm remuneração 5% superior no início da carreira.
Para pontuações 10% mais altas em matemática, o incremento de renda é de 4,6%.
A pesquisa, conduzida pelos economistas Andréa Zaitune Curi (FGV) e Naércio Menezes Filho (Instituto de Ensino e Pesquisa-Insper), foi realizada em todas as unidades federativas, com grupos de jovens de duas gerações, uma nascida em 1977 e 1978 e outra em 1987 e 1988.
“Esses resultados são importantes porque mostram o valor do aprendizado”, afirma Menezes Filho.
“Havia muita dúvida no Brasil se o efeito de mais anos de estudo poderia ser amplificado com mais qualidade.”
Os resultados do estudo descontam o efeito que outras variáveis -como sexo, cor ou o fato de ter frequentado uma faculdade após o ensino médio- possam ter sobre ganhos salariais futuros.
Dessa forma, o aumento de 5% no salário para um aluno que teve pontuação 10% maior do que outro em português não inclui o ganho extra que ele também possa ter conseguido por ter cursado uma faculdade, por exemplo.
Segundo Patrícia Mota Guedes, gerente de educação da Fundação Itaú Social, já há consenso sobre a importância de mais anos de escolaridade, mas faltam avaliações sobre o impacto da qualidade do ensino.
O estudo, diz ela, preenche essa lacuna. Patrícia espera que a conclusão da pesquisa ressalte a importância de reforçar a aprendizagem de cada aluno, independentemente do seu nível de proficiência.
DADOS
Há cerca de duas décadas, estudos internacionais indicam o forte impacto da qualidade do ensino escolar sobre os salários futuros. O ganho de renda reflete a maior produtividade do aluno que aprendeu mais.
No Brasil, as pesquisas existentes têm foco no efeito dos anos de escolaridade sobre o desempenho no mercado de trabalho. Segundo a Fundação Itaú Social, é a primeira vez que um estudo analisa o impacto da qualidade do ensino no país.
Uma das dificuldades para pesquisas desse tipo no Brasil é a falta de dados para acompanhar o desempenho individual de cada aluno.
O estudo da Fundação Itaú Social contorna essa barreira acompanhando duas gerações, uma nascida em 1977 e 1978 e outra em 1987 e 1988, agrupadas de acordo com algumas características.
São analisados os resultados da pontuação desses grupos no Saeb e, posteriormente, seus salários com idade entre 22 e 23 anos.
“O fato de que encontramos um ganho salarial expressivo já no início da carreira é importante porque esse ganho tende a se ampliar ainda mais com o tempo”, diz Menezes Filho.
Os pesquisadores também analisaram dados do Censo Demográfico e da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio).
Notas diferentes levam amigos a vias opostas
Ronilton Alves, 23, e Dalila Prates, 25, são amigos e estudaram juntos em uma escola pública em Felisburgo, cidade localizada em uma área pobre de Minas Gerais, no Vale do Jequitinhonha.
Depois da escola, Alves conseguiu uma bolsa para cursar publicidade em uma faculdade privada em São Paulo.
Hoje, trabalha como analista de mídias sociais e atribui o bom começo na carreira ao ótimo desempenho que teve durante a vida escolar.
“A base mais importante é a que vem da escola. Se te pedem para fazer uma redação e você não sabe regras gramaticais, não vai se sair bem”, diz Alves.
Dalila terminou a escola e começou uma faculdade privada no Rio de Janeiro, mas interrompeu o curso por falta de dinheiro. Tentou alguns concursos públicos sem sucesso. Hoje, está desempregada e acha que, se tivesse se dedicado mais na escola, estaria em melhor situação.
“Se soubesse como seria difícil, eu teria dado mais valor ao ensino de português, de matemática”, diz ela que, atualmente, faz um curso técnico de serviços públicos.
Alves acha que seu sucesso na escola teve várias causas, como seu gosto pelo estudo, o incentivo recebido dos pais e o fato de ter frequentado uma boa escola, onde os professores incentivavam os alunos.
Para Patrícia Mota Guedes, gerente de educação da Fundação Itaú Social, os educadores devem evitar o foco em aumentar a média da escola nos testes de proficiência e trabalhar pelo melhor desempenho de cada aluno.
“É importante não investir só naqueles que vão bem. Todo ganho de aprendizagem para todos os alunos deve ser valorizado.”
Fonte: Folha de S. Paulo – 18/03/2014