26/01/2015
Juro mais alto reforça aperto na economia
Na terceira alta seguida, Banco Central eleva taxa para 12,25%, a maior desde 2011. Movimento que eleva custo do crédito era previsto e acentua correção de rumo do Planalto.
Decisão do Banco Central de elevar a taxa básica em 0,5 ponto percentual já era esperada pelo mercado financeiro. Segundo analistas, o movimento segue a prioridade dada pela equipe econômica ao ajuste das contas neste ano, com o controle da inflação, relegando a segundo plano o crescimento do país.
Com o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) relegado a algo secundário neste ano, o Banco Central (BC) fez ontem mais um movimento em linha com o ajuste da economia pretendido para o início do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff.
Na tentativa de debelar a inflação, que ameaça estourar o teto da meta em 2015, o Comitê de Política Monetária (Copom) promoveu a terceira alta consecutiva da Selic após as eleições. A decisão foi unânime e, segundo a nota divulgada pelo BC, foram avaliados o cenário macroeconômico e as perspectivas para a inflação. Com o aumento de 0,5 ponto percentual, o juro básico da economia chegou a 12,25% ao ano, o mais alto patamar desde setembro de 2011.
Amargo por significar freio nos investimentos, na produção industrial e no consumo, o remédio do juro alto busca frear a disseminação dos efeitos da pressão principalmente de preços administrados, como o da gasolina, que deve subir RS 0,22 por litro com a volta da cobrança da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), e da energia, mais cara pela queda do nível dos reservatórios das hidrelétricas.
Projeção de IPCA acima da meta
Assim, avaliam economistas, a escalada da Selic é coerente com o ajuste fiscal empreendido pelo governo federal. Com essas medidas, a intenção da equipe econômica seria recuperar a credibilidade e começar a injetar confiança no mercado para os investimentos voltarem a crescer e a economia, lentamente, reagir.
– Se o BC quer garantir a convergência da inflação para o centro da meta (4,5% ao ano) até o final de 2016 tem de fazer uma política monetária mais apertada agora – diz Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, que prevê um Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 6,8% neste ano, acima do limite de 6,5%, puxado principalmente pelos preços administrados, que caminham para alta de 9,5% em 2015.
O professor de finanças Gilberto Braga, do Ibmec do Rio de Janeiro, lembra que não há surpresa na iniciativa do governo de fazer de 2015 um ano de ajustes na economia, com a busca por cortar gastos e aumentar receitas. Além de retomar a Cide, já foram anunciadas iniciativas como o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (I0F) no crédito, de alíquotas de importação. de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) relativo a cosméticos e regras mais rígidas para benefícios como o seguro-desemprego.
Pressão inflacionária deve levar a elevações nos próximos meses
– O governo está fazendo uma espécie de poupança para o futuro para soltar as amarras da economia se) no final do mandato – avalia Braga, que também espera neste ano inflação medida pelo IPCA acima do teto de 6,5%.
Para Antonio Madeira, economista da LCA Consultores, o quadro da inflação em 2015 será ainda mais grave, com um IPCA acima de 7%, contaminado principalmente pelos preços administrados, que podem subir até 10%. Dessa forma, o mais urgente para 2015 é o ajuste fiscal, com o crescimento da economia em segundo plano.
– Com essa combinação de política fiscal e monetária contracionistas não há como vislumbrar crescimento da economia em 2015. Apesar de as projeções indicarem algo entre 0,2% e 0,3%, não seria de se estranhar se tivermos um PIB negativo – alerta Otto Nogami, professor de economia do Insper.
O ciclo de alta da Selic não chegou ao fim com a alta de 0,5 ponto percentual anunciada ontem. Entre especialistas, é unânime a expectativa de pelo menos mais uma elevação do juro no inicio de março e talvez outra no final de abril, na terceira reunião prevista do Comitê de Politica Monetária (Copom) em 2015. Com isso, a taxa encerraria o ano entre 1225% e 13%.
Na Tendências Consultoria, a projeção é de uma nova alta de 0,5 ponto percentual na próxima reunião dos diretores do Banco Central (BC) e mais 0,25% em abril, com maior possibilidade de a taxa ficar estável até o final do ano em 13%.
– Mas pode acontecer de o juro ser reduzido ao final do ano – pondera Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências.
Como prosseguirá ao longo do ano a pressão dos preços administrados, principalmente energia, o professor de finanças do Ibmec do Rio Gilberto Braga vê poucas chances de redução do juro ainda em 2015.
– Acredito que somente em 2016. Este ano é de ajuste – diz Braga, que aposta na Selic encerrando o ano a 13%.
Para o economista Antonio Madeira, da LCA Consultores, o Copom deve encerrar o ciclo de alta do juro em março, com taxa de 12,75% que tenderia a se manter até o final do ano. Autor de projeções um pouco mais pessimistas para a inflação em 2015, ele não considera qualquer chance de o BC começar a baixar a Selic ainda neste ano.
– Reduzir o juro, só em 2016 – prevê Madeira.
Queda pode ficar somente para 2017
Mais cético ainda com relação ao tema está o professor de economia do Insper Otto Nogami: – Enquanto não for consertado o estrago feito na economia nos últimos quatro anos, não há perspectiva lúcida de queda do juro, ainda mais se queremos buscar o crescimento sustentado. Então, a queda da Selic fica para 2016, quiçá 2017.
As consequências em cinco áreas
Aplicações financeiras
Quanto mais alta a Selic, mais atraentes se tornam investimentos em fundos de renda fixa, principalmente em relação à poupança. É o caso dos fundos Dl, que costumam ter o rendimento próximo ao juro básico da economia. Vale lembrar, porém, que são aplicações que pagam Imposto de Renda, cuja alíquota diminui de acordo com o prazo do investimento, e ainda têm taxa de administração cobrada pelo banco para gerir o recurso. Outra alternativa em momento de alta do juro é o Certificado de Depósito Bancário (CDB).
Câmbio
A alta do dólar nos últimos meses deixou apreensivo quem tinha viagem marcada para o Exterior. Oque a alta da Selic tem a ver com isso? Em tese, o juro mais alto pode atrair mais moeda americana para o Brasil, em busca de uma remuneração maior em investimentos em renda fixa, e ajudar a segurar a cotação . Nos últimos meses, porém, o dólar tem se valorizado apesar da escalada da Selic. Oque um juro maior poderia fazer, portanto, seria frear um pouco o dólar, o que também ajuda a segurar a inflação, mas isso também depende de outros fatores, como a postura do banco central dos EUA.
Indústria
O aumento da Selic torna os financiamentos mais caros e afeta os investimentos do setor, que já estão em baixa, além de debilitar ainda mais as condições de competitividade. A situação deixa a recuperação das fábricas mais distante e eleva o grau de preocupação com o emprego industrial. Oaumento do juro também tende a prejudicar o consumo, o que significa projeção de menor demanda para os produtos das indústrias brasileiras.
PIB
A decisão do Copom é mais um fator a inidibir o crescimento da economia em 2015, depois de um 2014 com resultado próximo de zero. A previsão para este ano não é nada animadora. De acordo com o boletim Focus, do Banco Central, a projeção de alta do PIB caiu de 0,4%, na semana passada, para 0,38%. A elevação do juro é ruim para o PIB porque desencoraja investimentos, prejudica a indústria e encarece o crédito, o que impacta no ânimo do consumidor para ir às compras.
Consumidor
Para a população, a alta da Selic significa que as compras a crédito vão ficar mais caras. Isso freia o ímpeto de adquirir bens, justamente em um momento de menor expansão da massa salarial e do emprego, fatores que minam ainda mais a confiança do consumidor. Conforme a Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), o juro do cartão de crédito chegou, em dezembro, a 11,22% ao mês, recorde dos últimos 15 anos. Outra consequência do juro alto é o aumento da inadimplência.
Fonte: Zero Hora – 22/01/2015