04/12/2012
Muitos economistas consideram equivocada a percepção do Banco Central (BC) de que a economia internacional ainda ajudará a baixar a inflação no Brasil. O momento de maior interferência do cenário externo sobre os preços domésticos já passou, dizem eles, e mesmo com uma grande piora na economia internacional – hipótese pouco provável de se concretizar, segundo os analistas -, não haveria garantias de que a inflação no país cederia.
Nos 12 meses encerrados em outubro, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subiu 5,45%, ficando quase um ponto percentual acima do centro da meta de inflação, de 4,5% ao ano. Após atingir 7,31% de alta em setembro de 2011, nessa base de comparação, o IPCA iniciou trajetória de desaceleração, que foi interrompida em junho, quando o indicador marcava 4,92%.
Desde então, a inflação voltou a se acelerar, e não há no radar dos especialistas sinais de arrefecimento. A mediana das projeções dos economistas consultados pelo BC para o Boletim Focus aponta aumento de 5,40% no IPCA em 2013.
Ao adotar uma política de interferência no câmbio e nas importações, o governo minimizou os efeitos desinflacionários promovidos pelo enfraquecimento da economia global, afirmam os economistas.
Atualmente, observam eles, é quase nula tal influência sobre a inflação no Brasil. “Não é possível controlar o câmbio e a inflação ao mesmo tempo, ainda mais num contexto de alta de commodities”, comenta Ricardo Dias Brito, professor do Insper.
Os preços menos atraentes dos produtos importados também podem abrir espaço para os artigos fabricados em território brasileiro. Se por um lado isso beneficia as vendas da indústria nacional, por outro, tende a reduzir a concorrência, que contribui para preços mais baixos nas prateleiras.
Ao mesmo tempo, lembra Brito, torna-se mais cara a modernização da indústria brasileira, já que grande parte das máquinas e equipamentos de última geração é importada. Os reflexos disso, segundo ele, vão para o bolso do consumidor. “A indústria brasileira está ganhando competitividade não pelo aumento de produtividade, mas por incentivos fiscais. Quando esses benefícios acabarem, a inflação vai subir”, afirma Brito.
Para ele, mesmo que o governo voltasse a deixar o câmbio flutuar livremente, a valorização do real não seria suficiente para compensar na inflação a retirada dos estímulos concedidos ao consumo, que incluem a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para eletrodomésticos da linha branca, automóveis, móveis e materiais de construção. “O governo se colocou numa sinuca de bico.”
Em seus cálculos de inflação, os economistas ainda acrescentam uma incógnita – o reajuste da gasolina, que no mercado brasileiro está cerca de 15% abaixo do preço praticado no mercado internacional. O último aumento no combustível foi realizado em junho, quando o reajuste de 7,8% foi compensado pela isenção da Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide).
“A desinflação que vimos entre o fim do ano passado e meados desse ano foi rodeada de artificialismos”, diz Zeina Latif, sócia da Gibraltar Consulting. “O governo fez uma escolha ao incentivar a indústria, e isso tem um custo.”
Acompanhando a evolução do IPCA e dos índices de inflação nos Estados Unidos e na China é possível notar uma relação entre eles. Com alguma defasagem e diferenças de intensidade, a inflação no Brasil tende a seguir o comportamento dos preços ao produtor americano e ao consumidor chinês, diz Zeina.
“Estados Unidos e China são formadores mundiais de preços. Não há como se descolar completamente deles”, afirma a economista. Ela lembra ainda que o Brasil é um grande importador de bens de consumo duráveis e semiduráveis chineses, além de comprador de bens de capital fabricados nos Estados Unidos, o que faz com que os preços praticados lá fora interfiram na inflação no Brasil.
De acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), de janeiro a outubro deste ano, China e Estados Unidos responderam por 30% das importações realizadas pelo Brasil. Os chamados bens comercializáveis – aqueles que podem ser importados ou exportados – representam 34,6% dos itens que formam o IPCA, segundo o Santander.
A influência internacional sobre a inflação no Brasil, entretanto, não é direta. “Ela é maior ou menor dependendo de quão livre estiver o câmbio”, pontua a economista Tatiana Pinheiro, do Santander.
Com o enfraquecimento da economia mundial, a demanda por duráveis diminuiu, descomprimindo os preços, que desde o ano passado seguem em deflação. A isenção de IPI para eletrodomésticos da linha branca e automóveis intensificou a queda, que passou de 0,96% nos 12 meses até outubro de 2011 para 4,56% nos 12 meses seguintes.
Apesar disso, no conjunto dos comercializáveis, é possível notar aumento de preços, ainda que abaixo do IPCA. A alta do grupo foi de 4% no acumulado em 12 meses terminados em outubro, período em que o IPCA avançou 5,45%.
Os reflexos da disparada dos preços dos grãos no mercado internacional, devido à quebra de safra nos Estados Unidos, explica grande parte desse avanço. “Se a economia da China não estivesse desacelerando, provavelmente o aumento nas commodities agrícolas seria maior e, consequentemente, pesaria mais sobre a inflação no Brasil”, diz Tatiana.
Para ela, em 2013, a tendência é de aumento no ritmo da inflação no país, com as pressões domésticas se sobrepondo a possíveis alívios derivados da menor demanda mundial. A atividade econômica começou a se recuperar, e a expectativa é que os estímulos, com os cortes de juros, impulsionem mais a economia no ano que vem.
Por Francine De Lorenzo | De São Paulo
Fonte: Valor Econômico – SP – 14/11/2012