[{"jcr:title":"“Recuo do PIB do agronegócio em 2022 não gera preocupação”"},{"targetId":"id-share-1","text":"Confira mais em:","tooltipText":"Link copiado com sucesso."},{"jcr:title":"“Recuo do PIB do agronegócio em 2022 não gera preocupação”","jcr:description":"Queda ocorreu por descompasso entre preços e custos, diz a economista Nicole Rennó Castro, coordenadora da área de macroeconomia do Cepea. Ela ressalta a crescente importância do setor na geração de empregos"},{"subtitle":"Queda ocorreu por descompasso entre preços e custos, diz a economista Nicole Rennó Castro, coordenadora da área de macroeconomia do Cepea. Ela ressalta a crescente importância do setor na geração de empregos","author":"Ernesto Yoshida","title":"“Recuo do PIB do agronegócio em 2022 não gera preocupação”","content":"Queda ocorreu por descompasso entre preços e custos, diz a economista Nicole Rennó Castro, coordenadora da área de macroeconomia do Cepea. Ela ressalta a crescente importância do setor na geração de empregos     O PIB do agronegócio brasileiro fechou o ano de 2022 com uma queda de 4,22%, de acordo com dados calculados pelo Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP, em parceria com a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil). Esse recuo ocorreu, sobretudo, porque os custos de produção subiram mais do que os preços agrícolas, mas não é motivo de preocupação, diz a economista Nicole Rennó Castro, professora da Esalq e coordenadora da área de macroeconomia do Cepea. Com a queda no ano passado, o agronegócio viu sua participação no PIB cair de 26,6% em 2021 para 24,8% em 2022. Embora o agro tenha perdido um pouco de espaço, Nicole ressalta que essa variação é uma medida relativa de desempenho econômico e, do ponto de vista da sociedade, significa que o agronegócio tem cumprido bem seu papel de ofertar alimentos a preços mais acessíveis para a população. Setor mais dinâmico da economia brasileira nos últimos anos, o agronegócio tem adquirido crescente importância também na geração de empregos. No final de 2022, o agro ocupava quase 19 milhões de pessoas, ou 19,4% da força de trabalho do país. Segundo Nicole, a escolaridade média do trabalhador da agropecuária tem crescido mais rapidamente do que a média do trabalhador brasileiro, atraindo profissionais qualificados como agrônomos, economistas e estatísticos. O agronegócio, contudo, continua a ocupar mão de obra predominantemente masculina. Em 2022, as mulheres representavam 31% da força de trabalho no setor, uma participação pequena se comparada ao conjunto da população. Confira na entrevista a seguir.     O Cepea divulgou em março que o PIB do agronegócio brasileiro caiu 4,22% em 2022, depois de ter batido recordes nos dois anos anteriores. A que se atribui essa queda? Antes de mais nada, cabe uma explicação para evitar uma confusão metodológica entre os dados do PIB apurados pelo Cepea em parceria com a CNA e os dados divulgados pelo IBGE. A primeira diferença é que, no Cepea, olhamos para o agronegócio todo, enquanto o IBGE considera somente o setor agropecuário, ou seja, apenas as atividades dentro da porteira. Outro ponto é que estamos interessados na renda real dos agentes do agro. Por isso, assim como faz o IBGE, captamos os volumes de produção, mas, além disso, olhamos como estão os preços e os custos do agro. Com isso, em 2022, de fato, o PIB do agronegócio caiu. Mas vale ressaltar que esse não é um resultado ruim como aparenta ser. Depois de dois anos de recorde, ter uma queda de 4,22% parece assustador, mas, como levamos em conta os preços, essa variação negativa é normal — os preços oscilam mesmo. Esse declínio foi resultado de um movimento descompassado entre custos e preços. Foi um ano ainda de bons preços agrícolas, mas os custos subiram com muita força no campo, dentro da porteira, e por consequência também na agroindústria. Os grãos estavam caríssimos, então os custos das matérias-primas agrícolas subiram para as agroindústrias que as processam, e outros custos industriais estavam altos também. Além disso, tivemos algumas quedas de produção, com destaque para a soja, a principal cultura na formação do PIB. Como tivemos uma quebra significativa de produção, isso impactou também o resultado desse ramo da agricultura. Em resumo, foram dois os principais fatores para a queda do PIB em 2022: os custos subiram mais que os preços e a quebra da safra de soja também pesou de forma importante.   Os custos aumentaram principalmente por causa da alta dos insumos? Os custos em geral subiram, incluindo defensivos, máquinas e sementes, mas o que mais subiu na safra passada foi o custo dos fertilizantes, por causa da guerra na Ucrânia. Aumentou também porque o mercado já estava aquecido, elevando a demanda por fertilizantes. É algo que costumamos ver no setor: quando o preço das commodities sobe, o preço dos insumos acompanha, com alguma defasagem. Mas é óbvio que esse quadro foi agravado pela guerra, que afetou o lado da oferta e gerou incerteza no mercado.   Com a queda do PIB, a participação do agronegócio na economia brasileira caiu de 26,6% em 2021 para 24,8% em 2022. Qual tem sido a dinâmica desse indicador ao longo do tempo? A participação do agro na economia tem aumentado, diminuído ou se mantido estável? Isso vai variando muito ao longo do tempo, já que essa é uma medida relativa de desempenho econômico. Se o agronegócio está indo melhor do que a economia como um todo, sua participação no PIB cresce. Em períodos de boom favorável de preços, como foi os últimos três anos, a participação do agro tende a aumentar. Porém, se olharmos para os últimos 20 anos, tivemos no início uma tendência decrescente dessa participação. Ela estava em 30% em 2000 e foi se reduzindo até 2014. Isso ocorreu principalmente porque os preços relativos caíram, ou seja, os preços do agronegócio cresceram menos do que a inflação. Isso significa que o produtor está perdendo crescimento real de renda — um efeito, inclusive, do crescimento bastante expressivo de oferta que temos visto no agronegócio. Praticamente todo ano, o setor tem produzido mais do que no ano anterior, exceto quando ocorre algum problema de clima. Com a oferta crescente, os preços foram caindo em termos reais frente à média da economia. Isso vai puxando a participação do agro para baixo. Pela perspectiva da sociedade, esse momento em que o agronegócio perdeu participação no PIB se deu porque ele estava fazendo muito bem a função de ofertar comida a preços baixos.   Como você vê o desempenho do agro neste ano? Ainda não temos uma estimativa calculada. Mas, com base no que estamos enxergando, a expectativa é que seja um ano ainda difícil, parecido com 2022, talvez um pouco melhor, e isso por dois motivos principais. A safra ainda foi cara, pois grande parte dos insumos já foi comprada a custos altos, então o custo de produção vai continuar elevado ao longo de 2023. A perspectiva é que os preços dos produtos se acomodem ou mesmo que alguns tenham queda. Isso, inclusive, por causa da oferta enorme de grãos do Brasil que vai chegar ao mercado. A situação dos preços parece estar se normalizando no mercado internacional e, com os custos ainda altos, não esperamos que o PIB volte a ter um desempenho como de 2020 ou 2021. Deve ficar mais parecido com o do ano passado. Isso se não houver nenhuma grande mudança. Uma crise sanitária ou mesmo guerra pode mudar amanhã todo o cenário. E há também a preocupação com o desaquecimento da economia global. Embora acreditemos que a exportação ainda vai continuar sendo uma alavanca importante para o agro, como foi nos últimos anos, há esse desaquecimento global que está sendo desenhado e, em termos de demanda doméstica, não há razão para acreditar que vá aumentar muito. Ainda vai ser um ano de inflação, de desempenho econômico fraco, então o consumidor brasileiro, que já estava com dificuldades para absorver a alta dos preços, deve continuar na mesma situação neste ano. Portanto, a tendência para 2023 é mais de estabilidade do PIB do que de um resultado excepcional.   O agronegócio tem sido o setor mais dinâmico da economia brasileira nos últimos anos. Isso tem se refletido no mercado de trabalho? O setor tem conseguido atrair mais gente? Sim, isso tem se refletido de várias formas. Primeiro, observamos esse grande dinamismo mais no campo, dentro da porteira, onde temos uma produção que vem crescendo explosivamente todo ano, e via produtividade, o que é excelente. No caso das agroindústrias, enfrentamos muitas dificuldades que atingem a indústria de transformação do Brasil em geral. Temos problemas de produtividade, de protecionismo dos outros países. Com isso, o dinamismo no mercado de trabalho está mais associado ao campo, onde há duas forças que são contrárias e que atuam o tempo inteiro. Por um lado, claro, se a produção cresce, a renda aumenta e isso puxa para cima o número de pessoas ocupadas dentro da porteira. Verificamos isso nos últimos anos. Mas temos também uma força estrutural que não é de agora, é de décadas: à medida que a agricultura cresce e se moderniza, o trabalhador menos qualificado tende a ser substituído por máquinas. A tendência geral, inclusive em outros países, é que, dentro do agronegócio, o papel de gerador de empregos vai saindo do campo e se transferindo para antes e depois da porteira. Vale destacar que essa modernização da agropecuária vem tendo um efeito interessante de atrair profissionais qualificados. A escolaridade média do trabalhador da agropecuária tem crescido muito mais intensamente do que a escolaridade média do trabalhador brasileiro. O setor tem atraído mais agrônomos, mais economistas, mais estatísticos, um movimento que pode se intensificar com a nova revolução da digitalização do campo.   Pelos dados do Cepea, em 2022, o número de empregados com carteira no agronegócio era mais que o dobro do número de empregados sem carteira. As condições gerais de trabalho no setor têm melhorado ao longo do tempo? Sim, por vários fatores. Esse emprego mais qualificado que citei anteriormente é mais formalizado do que o emprego de baixa qualificação. Além disso, as culturas mais dinâmicas e que remuneram melhor tendem a usar mais a mão de obra permanente, e não aquela temporária, o que contribui também para aumentar a formalização do trabalho. A cultura da soja, por exemplo, está se tornando uma grande empregadora. Ela usa pouco trabalhadores por hectare, mas, como é uma atividade econômica gigantesca que usa um trabalho permanente, isso também tem favorecido o movimento de formalização da mão de obra no campo.   E quanto às mulheres? Em 2022, elas representavam 31% da força de trabalho no agronegócio, uma participação pequena se comparada ao conjunto da população. Isso é algo também que é histórico. Na agroindústria, essa participação feminina é maior, mas o campo é tradicionalmente um setor com participação masculina muito mais elevada. Sem entrar no mérito se está correto ou não, o próprio tipo de atividade executada contribuiu para que o trabalho no campo ficasse mais concentrado em homens. Nos últimos anos, a participação feminina no mercado de trabalho no agro tem se mantido nessa taxa de 30%. Às vezes oscila um pouco para cima, um pouco para baixo, mas sem sofrer grandes variações. Há preocupações em relação ao futuro, de que o avanço da mecanização no campo pode reduzir ainda mais essa participação feminina. Cabe lembrar que as mulheres tendem a pensar mais do que os homens no núcleo familiar e, por isso, buscam mais o emprego urbano. Então, quando pensamos no futuro e na nova revolução em curso no campo, existe, sim, essa preocupação de que a mão de obra possa se tornar ainda mais masculina. Outro ponto é que as mulheres que trabalham no agronegócio, em geral, ganham menos do que os homens, mesmo quando exercem a mesma atividade. Nesse aspecto, o agronegócio reproduz o que acontece no mercado de trabalho como um todo, uma discriminação salarial que não deveria mais existir.  "}]