Esse modelo pode ajudar as organizações a encontrar novas maneiras de resolver problemas urgentes e, ao mesmo tempo, construir colaborações de longo prazo
Rodrigo Amantea*
A ideia de inovação aberta não é nova. Para ficar em um só exemplo, no século 17, as principais potências marítimas da Europa iniciaram uma competição em busca de um instrumento capaz de medir com precisão a longitude no alto-mar, com o objetivo de aumentar a segurança das viagens de longa distância. As mentes mais brilhantes da época, como o italiano Galileu Galilei e o holandês Christiaan Huygens, tentaram encontrar uma solução para o problema. Mas foi só no século seguinte, em 1761, que um relojoeiro autodidata inglês, chamado John Harrison, conseguiu inventar um cronômetro capaz de calcular a longitude no mar com eficiência. Por seu feito, Harrison fez jus a um prêmio de 20 mil libras oferecido pelo Parlamento inglês.
Modernamente, diversas empresas promovem challenges e hackathons para atrair ideias inovadoras de fora que possam ajudar a resolver diferentes problemas reais das organizações. São exemplos de práticas de inovação aberta, um termo cunhado pelo americano Henry Chesbrough em um livro seminal publicado em 2003, Open Innovation: The new imperative for creating and profiting from technology.
Para Chesbrough, atualmente professor da Universidade da Califórnia em Berkeley, no ambiente rico em informações de hoje, as empresas não podem mais se dar ao luxo de depender exclusivamente de suas próprias ideias para avançar nos negócios. O modelo tradicional de inovação, fechado a contribuições externas, está dando lugar a uma abordagem descentralizada e colaborativa de inovação, para aproveitar os diferentes recursos humanos e tecnológicos disponíveis fora da empresa.
A inovação aberta tem o potencial de ampliar o espaço para a criação de valor, seja por meio de novos parceiros com habilidades complementares, seja desbloqueando o potencial oculto de parceiros existentes. Esse modelo pode ajudar as organizações a encontrar novas maneiras de resolver problemas urgentes e, ao mesmo tempo, construir colaborações de longo prazo que podem ser o futuro das organizações.
Há várias formas possíveis de inovação aberta, e uma das mais importantes é a colaboração entre corporações e startups. A conexão de uma corporação com o ecossistema de startups pode encurtar os ciclos de inovação, explorando tecnologia, aprimorando modelos de negócios existentes e inventando novos com mais rapidez e eficácia.
Novos entrantes têm mais liberdade para desenvolver soluções verdadeiramente disruptivas e, dessa forma, as corporações podem colaborar com startups e criar valor não só em seu core business, mas também na expansão para adjacência ou para mercados completamente novos. Como a inovação interna é muitas vezes dificultada pela proteção dos negócios geradores de caixa (cash cows), a colaboração ou aquisição de uma startup também pode facilitar a interrupção necessária do próprio modelo de negócios, que é difícil de alcançar com uma inovação que vem de dentro.
É interessante também pensar nas startups como potenciais fornecedores de soluções para as corporações, com menos custos indiretos e maior capacidade de inovação, se comparados a fornecedores tradicionais. Além disso, as startups tendem a inovar mais perto das necessidades dos clientes: como não são tão orientadas para o processo padrão, podem adaptar e personalizar soluções mais facilmente focadas nos clientes e usuários.
Na perspectiva das startups há também ganhos ao trabalhar com corporações, como receitas, histórico para vendas futuras, acesso a clientes e canais de vendas, e até internacionalização. Entretanto, há desafios a superar, como ciclo de vendas muito longo ou até mesmo a difícil navegação nas corporações para encontrar os interlocutores mais adequados. Esses desafios, se não forem bem endereçados, podem gerar atrasos e até mesmo fazer com que a startup fique presa a um cliente só.
Trabalhar com startups pode trazer de volta para as corporações a abertura à inovação e o intraempreendedorismo — uma forma de encontrar talentos inovadores dentro de um negócio estabelecido. A ideia aqui é identificar os funcionários com mentalidade de startup e dar-lhes o suporte, a orientação e os recursos necessários para que criem novos produtos, serviços e soluções. O intraempreendedorismo mostra que as empresas nem sempre precisam olhar para fora do negócio para inovar. Às vezes, os recursos podem estar disponíveis internamente.
Seja como for, em um ambiente de negócios em rápida mudança, é importante promover ativamente uma cultura de inovação que acomode a experimentação e a tolerância a falhas no caminho para novas soluções. O desafio será promover o engajamento e eliminar silos para dar lugar à colaboração.
Não existe uma receita pronta para adotar a inovação aberta. Ela pode ser implementada tanto por meio de parceria quanto por meio de ecossistemas de inovação. Qualquer que seja a estratégia utilizada, a organização deve incorporar em seu DNA a ideia de que compartilhar informações e experiências é essencial para promover um ambiente colaborativo que fomente a criatividade e a circulação de novas ideias.
(*) Rodrigo Amantea é doutor em Administração de Empresas pela FGV-EAESP com foco e estratégia e inovação. Desenvolve pesquisas na área de inovação, intraempreendedorismo, desenho organizacional e marcas corporativas. Possui vasta experiência em inovação na gestão de produtos, serviços e marcas, em empresas de tecnologia e de serviços de grande porte. Coordenador Acadêmico de Educação Executiva e do Hub de Inovação do Insper.