A professora Daniela Assofra indica a leitura de três livros recentes de autores brasileiros que percorrem diferentes áreas de conhecimento
Mestra em Estudos Culturais pela Universidade de São Paulo (USP), com graduação em Sociologia e Política pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), Daniela Assofra é doutoranda na Unicamp, onde pesquisa as relações entre movimentos sociais e tecnologias contemporâneas. Ela tem interesse por questões multidisciplinares das ciências humanas e das exatas. Não surpreende que, ao atender ao pedido da InsperCultura para recomendar livros de interesse geral, ela tenha sugerido três obras recentes que navegam por cultura, ciência e tecnologia.
“Eu optei por três autores nacionais, com livros lançados em 2021 e que examinam alguns processos particulares e recentes da ciência e da tecnologia no Brasil”, diz Daniela, que leciona a disciplina Ética, Computação e Sociedade no curso de Ciência da Computação do Insper. “Vale lembrar que os três livros tocam de alguma forma o contexto da pandemia e já sinalizam as possíveis influências disso em nossa vida cultural, científica e tecnológica.”
O primeiro livro indicado por ela é O Dia em que Voltamos de Marte: Uma história da ciência e do poder com pistas para um novo presente, da matemática, filósofa e historiadora Tatiana Roque, professora titular do Instituto de Matemática da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ela é autora também de História da Matemática: Uma visão crítica, desfazendo mitos, que foi um dos vencedores do Prêmio Jabuti 2013.
Outro livro indicado pela professora Daniela é Tecnologia do Oprimido: Desigualdade e o mundano digital nas favelas do Brasil, do cientista da computação e antropólogo capixaba David Nemer, atualmente professor da Universidade da Virginia, nos Estados Unidos, no Departamento de Estudos de Mídias e no programa de Estudos Latino-Americanos.
Por fim, Daniela sugere a leitura também de Políticas da Imagem: Vigilância e resistência na dadosfera, de Giselle Beiguelman, professora livre-docente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. Também artista, Giselle é pioneira no campo da arte digital e no uso da internet e de redes móveis para intervenções artísticas, com diversas obras premiadas que integram acervos de museus no Brasil e no exterior.
A seguir, a professora Daniela comenta por que vale a pena ler os três livros sugeridos:
Tatiana Roque (Editora Crítica, 368 págs.)
“Este livro é ótimo, pois consegue traçar um panorama histórico da ciência de forma profunda e com uma linguagem acessível. A autora circula com maestria pela história, pela filosofia e pela cultura pop explicando para variados públicos a mentalidade de diferentes épocas da ciência até chegarmos às particularidades brasileiras. Além disso, nos convida a pensar a cuidar do futuro agindo no presente (palavras que dão nome ao capítulo 32) de forma muito realista ao olharmos o imbróglio político científico em que vivemos.”
David Nemer (Editora Milfontes, 298 págs.)
“Assim como na sugestão anterior, o autor circula por várias áreas do conhecimento
para trazer densidade e variedade de olhar. Nemer fez um trabalho de campo em favelas do Espírito Santo para compreender a relação das pessoas com a tecnologia cotidiana (ou mundana, como ele chama). Analisa a tecnologia se desenvolvendo e sendo apropriada pelas pessoas na perspectiva de Paulo Freire, como o título do livro sugere.
Me encantou muito a leitura sobre o uso dos telecentros, que foram e são equipamento públicos fundamentais na vida das periferias e ajudaram a democratizar o acesso à internet por parte das populações que não tinham condições de comprar computadores. Além disso, o uso das lan houses como espaço de sociabilidade de acesso à internet também é um ponto alto do livro.
Este livro ajuda muito a pensar como nos apropriamos da tecnologia e como os acessos a ela nos são concedidos. A internet 5G começou a funcionar em São Paulo, por exemplo, mas sabemos que ela ainda é restrita. Depende de muitas coisas e a pergunta que fica é: quando ela estará acessível a todos no Brasil? Sem ingenuidade, sabemos a resposta, não?”
Giselle Beiguelman (Ubu Editora, 224 págs.)
“Ler sobre tecnologia sob a perspectiva de uma artista/urbanista nos dá a chance de enxergar pontos que podem passar batidos, mas que são importantes no uso e na concepção das tecnologias. Exemplo disso é a tecnologia da vigilância. A captação de nossos dados é constante e está disposta nas cidades não só por meio de câmeras, mas também de exposições de arte, de propagandas interativas e outras manifestações culturais. Em prol da vigilância, nós aceitamos e naturalizamos ess captação de informações subjetivas. Vale mencionar que cada capítulo deste livro tem um QR Code para a leitura.”