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Falta de conhecimento de tecnologia dos gestores pode sair caro

A adoção de uma solução inadequada em um negócio gera impactos negativos no curto prazo e exige gastos adicionais que não garantem os resultados esperados

A adoção de uma solução inadequada em um negócio gera impactos negativos no curto prazo e exige gastos adicionais que não garantem os resultados esperados

  

 Graziela Tonin

 

Tecnologias mudam a todo instante e isso é inevitável. É impossível estar 100% atualizado sobre as mudanças, mas isso não é desculpa para manter-se alienado em relação àquilo que pode ter um grande impacto no negócio de sua empresa.

Se você é um gestor, é de suma importância entender e saber como alinhar decisões de negócio e tecnologia. É crucial ter um suporte técnico na área para as decisões mais complexas.

Quantas notícias você leu na última semana, envolvendo a área de tecnologia, com potencial de impacto negativo nos negócios?

 

A corrida dos ratos da tecnologia

Um negócio que não faça uso de tecnologia é cada vez mais raro. Não parece razoável pensar em aumento de escala, ganho de produtividade, redução de custos e ampliação de mercados sem usar as poderosas ferramentas tecnológicas.

Por outro lado, há uma corrida insana para divulgar que seu negócio utiliza tecnologia nas mais variadas frentes. Ou que seu fundo fez um investimento importante em negócios que fazem o uso da mais moderna tecnologia.

Essa corrida tem gerado cotidianamente desperdícios milionários em investimento, bem como um impacto negativo no fluxo de caixa dos negócios.

Com frequência, ouço que tecnologia é cara, que mão de obra de tecnologia também, e que, na falta de soluções ideais, uma solução qualquer é melhor do que nada. Ouço dizer que um colaborador com algum conhecimento é melhor do que nenhum e que uma startup precisa ter como um dos pilares essenciais do negócio o uso de tecnologia.

Tudo isso faz muito sentido, mas é preciso analisar as entrelinhas.

A regra é que toda solução “mais ou menos” irá gerar impactos de curto prazo que exigirão mais investimentos e, não necessariamente, irá gerar mais retorno. Essa linha é bem tênue e exige mais do que o entendimento do negócio e do mercado e uma estratégia — exige algum entendimento de tecnologia.

Quantas empresas você conhece que tomou uma decisão errada na área de tecnologia e se arrastou por anos em investimentos para realizar ajustes e adequações de um sistema ineficiente que não trouxe o retorno esperado para o negócio? E que, depois de muitos anos sem solução, acabou sendo descontinuado?

Quantas manchetes de investimento em startups usavam as palavras “inteligência artificial” e “ciência de dados” ou algum outro termo da “moda”? Quantas dessas startups têm, de fato, essas tecnologias já implementadas? E quantas fizeram isso de forma que fará uma diferença positiva no resultado do negócio?

Essa corrida parece nunca ter fim. Em geral, o fim chega quando se esgota a capacidade de investimento, ou quando se contrata uma nova solução à custa de mais investimentos. Pobre do negócio que, mais uma vez ávido por um milagre, precisa esperar por uma nova implantação, mas com isso “queima” seu caixa e sofre outros efeitos negativos.

 

O “milagre” vende

O problema é que o “milagre” vende, e o “desconhecido” que promete fazer o “milagre” também. Vejamos alguns exemplos:

  • Aportes milionários em startups de inteligência artificial: com frequência, vejo aportes milionários em startups que usam inteligência artificial, analiso o negócio e me pergunto quem respaldou tal decisão. A área de inteligência artificial é gigante. Então, em geral, é bem raro o uso de inteligência artificial de forma ampla, ainda mais em um MVP (mínimo produto viável) ou na fase ainda inicial de um produto, modelo de negócio. Além de ser uma área ampla, é complexa, formada por diferentes técnicas, que precisam ser aplicadas em modelos, que terão de ser desenvolvidos e treinados (isso em linhas gerais). E então, talvez, teríamos um sistema que utiliza uma determinada técnica em determinado modelo, o que pode auxiliar em certa área do negócio, bem mais específico, restrito e questionável.

Vou me ater ao questionável: nem sempre determinada técnica de inteligência artificial aplicada a certo modelo e conjunto de dados irá trazer uma resposta ou indicadores plausíveis para aquele negócio. Nem vou falar aqui sobre a parte dos dados, que precisam ser tratados e padronizados (Para isso, sugiro olhar o curso de Pós-Graduação em Data Science e Decisão do Insper), para que seja possível utilizá-los de uma forma eficiente. Em suma, esses dados precisam existir para que algum modelo seja aplicado e seu resultado tenha relevância.

  • Soluções inadequadas: é fato que decisões precisam ser tomadas rapidamente, para adaptações do negócio de forma ágil, mas qual o custo do rápido, ágil e mais bem-feito do que o bem-feito? Investir muito tempo para pensar, planejar e avaliar a viabilidade de uma solução não parece ser sustentável; investir algum tempo é crucial. Na grande maioria das vezes, nem se sabe qual é o problema, suas características, o resultado esperado e que irá agregar valor ao usuário final. Isso é um requisito para entender como resolver o problema e definir a solução mais adequada. Justamente por ter um custo alto, esse primeiro passo, anterior à aquisição e ao uso da tecnologia, deve ser executado. E ter o suporte de um especialista evitaria alguns danos.
  • “Preso” a um sistema e uma solução: é comum também o caso de empresas que usam uma solução por anos e se tornam reféns do sistema — e, consequentemente, das suas taxas e custos. Isso sem falar no custo adicional para ter prioridade em alguma adequação ou ajuste crucial para o seu negócio. Esse caso é consideravelmente simples de resolver no momento da tomada de decisão, mas bem caro e, muitas vezes, inviável após a adoção do sistema.
  • Desenvolve “tudo” na empresa: também é comum ver muitos líderes que, levando em conta apenas variáveis como custo, optem por fazer a própria solução, em vez de utilizar uma que está disponível no mercado. Porém, dependendo da área da solução necessitada, da área de atuação do negócio, da complexidade de desenvolvimento, da especificidade tecnológica necessária (linguagem, framework, armazenamento etc.), do tempo e custo de desenvolvimento, somados ao custo de manutenção e evolução, comumente essa é uma escolha errada.

Ela traz impactos em variáveis como tempo de mercado à espera da solução, custo de manutenção e, depois da evolução, muitas vezes é preciso realocar pessoas de áreas core para esse projeto. O líder não precisa ser uma pessoa de tecnologia, mas deve ter suficiente noção da área para fazer bons questionamentos. Deve também ter suporte técnico adequado para mitigar o risco de tal decisão.

Outras áreas importantes, como segurança, qualidade, práticas de engenharia de software e padrões, comumente ignoradas na construção de um software e primordiais para sua evolução e perenidade, não serão abordadas neste artigo, mas também impactam e devem ser consideradas em cada decisão da liderança.

 

Não existe solução ideal

Todas as soluções disponíveis no mercado foram moldadas para um modelo de negócio. Logo, elas não terão a versão ideal para a sua empresa. Por mais adaptável que seja, e por mais que o time de vendas daquela solução garanta que isso será possível, sempre exigirá uma adaptação no negócio, seja no processo, seja em treinamentos e na forma de trabalho da equipe. Nem sempre isso é ruim, mas haverá um impacto que precisa ser claro e mensurado antes da decisão de aportes financeiros naquela solução.

A evolução e a continuidade do projeto precisam estar bem claras e alinhadas antes da escolha da solução.

 

Quatro opções para reduzir os riscos

De forma simples, é possível eliminar o desperdício com investimentos embasados em escolhas equivocadas. Eis algumas sugestões:

  • Equipe adequada: ter pelo menos uma pessoa na própria equipe para emitir uma análise ou opinião. Devido à escassez de mão de obra no mercado, é preciso cautela. Atualmente, todo mundo se diz “especialista”, mas lembre-se: as áreas que englobam a computação são primordialmente técnicas. Se a pessoa não tiver formação técnica, talvez seu conhecimento seja superficial. Caso não consiga manter um profissional dedicado ao tema, consultores são uma opção para evitar perdas significativas.
  • Conselheiros de tecnologia: os negócios que ainda não foram disruptados, cedo ou tarde, o serão. E, cada vez mais, a tecnologia será uma das principais ferramentas para essa adaptação e evolução dos modelos de negócio nas mais variadas áreas. Logo, será cada vez mais indispensável ter em uma cadeira do conselho alguém que saiba sobre tecnologia e como aplicá-la ao seu negócio.
  • Rede de contato: nem sempre é possível manter bons profissionais na equipe. Mas é possível ter, em sua rede de relacionamento, pessoas que entendam de tecnologia, as quais você possa consultar em momentos de tomada de decisão estratégica e de aportes significativos.
  • Especialização na área: você não precisa ser um especialista técnico, mas também não pode ser enganado por qualquer pessoa, empresa ou charlatão que tentar lhe vender uma “solução milagrosa” para os problemas do seu negócio. E parte da gestão de risco começa com o seu envolvimento no tema.

 Graziela Tonin

 * Graziela Tonin é doutora em Ciência da Computação pela Universidade de São Paulo, na área de Engenharia de Software, Dívida Técnica e Metodologias Ágeis. Ela vai lecionar a disciplina Projeto Ágil e Programação Eficaz no curso de Ciência da Computação do Insper.

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