Iniciativa irá promover pesquisas focadas no jornalismo econômico e cobertura de políticas públicas, colaborando com as melhores práticas jornalísticas no Brasil
Em 2021, o Insper inaugura o Centro Celso Pinto, que terá, entre seus objetivos, o de contribuir para o aperfeiçoamento da prática do jornalismo no país, em especial na cobertura de temas econômicos e de políticas públicas. O centro atuará por meio de pesquisa, geração de conhecimento, publicações e promoção de debates.
Com diferentes frentes de ação, o centro espera apoiar os melhores pesquisadores em jornalismo. O foco será em economia aplicada e com viés prático de promover a partir da experiência empírica melhores formas de atuar seguindo os princípios do jornalismo fundado em evidências, baseado em dados, e buscando a maior imparcialidade possível.
Carlos Eduardo Lins da Silva, livre-docente e doutor em Comunicação pela USP, mestre pela Michigan State University (como Fulbright scholar), Global fellow do Woodrow Wilson International Center for Scholars, onde fez estudos após o doutoramento, será o coordenador do Centro Celso Pinto. No jornalismo, trabalhou na Folha de S.Paulo, onde foi diretor-adjunto de redação, correspondente nos EUA e ombudsman, e no Valor Econômico, onde foi diretor-adjunto de redação. Foi ainda editor da revista “Política Externa” e âncora do programa Roda Viva, da TV Cultura de São Paulo.
Evento de Lançamento
Para marcar o lançamento do Centro, no dia 3/5, às 11h, será realizado evento online reunindo jornalistas com reconhecida experiência na cobertura de temas econômicos para o debate “Os desafios do jornalismo econômico nesta década“. No encontro, os especialistas vão trazer suas experiências trabalhando em grandes veículos brasileiros e discutir as perspectivas para sua atuação nos próximos anos. Clique aqui para se inscrever!
Entrevista
Na entrevista a seguir, Carlos aborda a sua trajetória acadêmica, explica os principais objetos de pesquisa buscados pelo novo centro, comenta a importância de Celso Pinto para o jornalismo econômico e fala sobre alguns projetos do grupo de estudos. Confira:
– Em sua trajetória, como surgiu a iniciativa de pesquisar comunicação e sua relação com temas econômicos e de políticas públicas?
Sou jornalista de profissão, mas, em 1975 ganhei uma bolsa de estudos para fazer um mestrado nos EUA e me apaixonei pela experiência acadêmica. Ao voltar fiz o meu doutorado e livre docência na Escola de Comunicação e Artes da USP, mas nunca deixei a profissão, durante todo esse período na academia eu também trabalhei em redações.
O jornalismo econômico não é minha especialidade. Segui esse caminho por que fui chamado pelo jornalista Celso Pinto para ser diretor-adjunto do Valor Econômico em 1999. Já havia trabalhado por diversos anos na Folha de S. Paulo, ocupando cargos de direção, ombudsman e correspondente internacional. Como correspondente, tive que cobrir muitos assuntos, entre eles pautas de economia, devido à forte relação financeira do Brasil com o governo americano e bancos internacionais. Isso me deu algum conhecimento na área de economia, mas nunca fui um especialista no tema.
– Como surgiu a ideia de discutir o jornalismo e a comunicação? O núcleo de jornalismo criado em 2018 no Insper influenciou o novo Centro?
O Núcleo de Jornalismo foi fundamental. Me integrei a esse grupo no início de 2019, dentro de um projeto de pós-graduação em tempo integral planejado pelo João Gabriel de Lima e pelo Irineu Gianesi. Mesmo com a possibilidade de bolsas generosas do Insper, não houve número de interessados por ser um curso integral, no qual as pessoas não poderiam trabalhar.
Quando estávamos tentando adequar nossas ambições acadêmicas à realidade, em dezembro de 2019, tivemos uma reunião, na qual surgiu a ideia de um centro de estudos de jornalismo econômico. Para mim, fazia muito sentido alocar esse centro no Insper, reconhecidamente uma das melhores escolas de economia da América Latina e centro de debate para diferentes visões de políticas econômicas.
Por tratar especificamente de jornalismo econômico e temas ligados às políticas públicas, o centro será uma instituição rara no mundo. Ao pesquisar outros exemplos semelhantes achei poucos correspondentes em outros países. Ao mesmo tempo, no panorama do jornalismo, a especialidade da economia se destaca, ao contrário da maior parte dos ramos, por estar crescendo nos últimos anos. Em 2020, vários títulos surgiram e outros, que já existiam, atraíram investidores para tornar seu negócio viável. Em grande parte, acho que isso se deve à mobilização muito grande de pessoas físicas para o mercado de valores.
– Por que a escolha do jornalista Celso Pinto?
O Celso foi, sem dúvida nenhuma, o jornalista de economia mais respeitado no Brasil no final do século passado e início deste século. Ele era muito respeitado pelos melhores economistas, que o liam e admiravam seu trabalho. Além disso, ele construiu o mais importante veículo sobre economia no Brasil, que é o Valor Econômico, e fez isso baseado nos princípios de jornalismo que ele seguia e praticava, que são de um jornalismo fundado em evidências, baseado em dados, sem partidarização política e paixão ideológica, buscando os cânones da maior imparcialidade possível.
Ao dar o nome do Celso ao centro, o Insper sinaliza à sociedade que é esse tipo de jornalismo em que a escola acredita e quer incentivar com seu ensino e aprendizado. O nome do Celso associa o centro e a escola às melhores práticas do jornalismo feito no Brasil.
– Qual a importância da pesquisa acadêmica para aperfeiçoar as práticas do jornalismo e colaborar com a melhora do debate público?
O Centro vai se concentrar na produção de conhecimento e pesquisa. A pesquisa é importante para qualquer área do conhecimento, inclusive para as humanidades, pois levanta elementos e dados que são mais imunes à ideologia. Para você melhorar a qualidade do trabalho que faz, é necessário ter conhecimento mais objetivo da realidade e quem proporciona esses elementos é a pesquisa, acima de tudo.
Eu sempre considerei o jornalismo como uma aplicação dos critérios e princípios da pesquisa acadêmica. Isso foi algo que eu defendi, por exemplo, no Projeto Folha, na década de 80, vendo a pauta jornalística quase como um projeto de pesquisa, um conjunto de hipóteses a serem testadas e verificadas no campo. O resultado do uso dessa metodologia é um produto mais aceitável do que um feito apenas a partir das ideias de uma pessoa.
Por isso, eu acho que pesquisa e jornalismo têm tudo a ver, e, para você melhorar a prática do jornalismo, é necessário fazer pesquisa. É importante ter medidores e índices para comparar a prática, para saber o número de matérias exclusivas, de erros factuais, de fontes usadas para escrever uma matéria, e assim por diante. Tentar verificar como é feito na realidade um jornal, para poder melhorá-lo e nos ajudar a sair do mero impressionismo.
– Quais os impactos o Insper pretende gerar com o novo Centro?
Isso vai depender de quanto seremos capazes de produzir em pesquisa. Por exemplo, algo que eu pretendo incentivar dentro do centro é organizar a história da Gazeta Mercantil, que foi o maior e melhor jornal de economia durante a maior parte do século XX. Essa história precisa ser recuperada, para podermos saber exatamente o que se fazia na Gazeta e de que maneira, por que ela foi tão bem-sucedida e porque ela fracassou ao final.
Outra análise que queremos fazer é entender como os jornalistas de economia brasileiros selecionam suas fontes ao escrever uma reportagem. Muitas vezes sentimos que as fontes se repetem demais, o que torna o debate público nos jornais algo repetitivo e previsível. Com uma boa pesquisa sobre esse tema, poderemos saber melhor como é feito o jornalismo e como ele pode melhorar daqui para frente.
Esses são alguns exemplos de pesquisas que esperamos fazer. Isso vai ter algum impacto na prática do jornalismo. Pensamos também em criar espécies de guias de bom jornalismo em subespecialidades, como, por exemplo, guias de cobertura no agronegócio, na bolsa de valores, na indústria automobilística, na tecnologia, entre outras áreas. Para isso é preciso conhecer o que é feito, ter uma leitura crítica das práticas, para fazer um produto útil aos jornalistas que cobrem esses temas.