Em um projeto financiado pela parceria com o Becker Friedman Institute for Economics (BFI), da Universidade de Chicago, a professora Giuliana Isabella, do Insper, desenvolve uma pesquisa com o intuito de investigar o impacto da inteligência artificial (IA) no comportamento do consumidor e na inclusão digital. O estudo, realizado em colaboração com o professor Adam Duhachek, da Universidade de Illinois Chicago (UIC), busca compreender as complexas barreiras culturais e sociais que influenciam a adoção da IA no contexto brasileiro.
O projeto tem como objetivo principal analisar como diferentes públicos percebem e interagem com a IA em situações de consumo. A pesquisa dedica especial atenção à compreensão de como consumidores em comunidades economicamente vulneráveis lidam com essas tecnologias e quais desafios enfrentam devido ao analfabetismo digital. Uma das questões centrais é investigar a existência de desconfiança em relação à IA e como isso afeta a aceitação de sistemas automatizados, como assistentes virtuais e ferramentas de recomendação digital.
“As pessoas das comunidades têm um certo medo da IA, pois a veem como um robô frio, muito inteligente, mas pouco confiável”, explica Giuliana Isabella. A pesquisadora enfatiza também “o receio generalizado de que a tecnologia substitua empregos e de que as pessoas percam o controle sobre as informações geradas por esses sistemas”.
Na primeira fase do estudo, a equipe conduziu 34 entrevistas exploratórias detalhadas com moradores da favela de Paraisópolis, em São Paulo. Durante as conversas, os participantes foram questionados sobre sua compreensão da IA, seu nível de confiança na tecnologia e sua disposição para utilizá-la em diferentes contextos, como consultas médicas online e serviços de consultas a informações de interesse público (como prevenção a dengue). Os resultados preliminares revelaram que muitas pessoas associam a IA a sistemas impessoais, havendo uma desconfiança significativa, principalmente em situações em que a interação humana é tradicionalmente valorizada.
A próxima etapa da pesquisa envolverá um estudo comparativo entre grupos de diferentes estratos socioeconômicos. O objetivo é compreender se a percepção da IA varia de acordo com o nível educacional e a renda dos participantes. Para isso, será realizado um estudo experimental, no qual os participantes interagirão com sistemas de IA de diferentes formas — uma abordagem mais humanizada e outra mais robotizada – para avaliar qual gera maior aceitação e confiança.
O estudo liderado pela professora Giuliana busca fornecer insights valiosos para empresas e instituições sobre como tornar a inteligência artificial mais acessível e inclusiva aos consumidores mais vulneráveis. A pesquisa pretende demonstrar quais adaptações podem ser implementadas para reduzir as barreiras culturais e digitais, garantindo que a IA beneficie a sociedade brasileira de forma mais ampla e equitativa.
Além disso, os resultados poderão servir como base para o desenvolvimento de políticas públicas e programas de capacitação, contribuindo para a redução das desigualdades no acesso à tecnologia. Ao compreender como diferentes públicos percebem e interagem com a IA, o estudo poderá auxiliar na criação de estratégias mais eficazes para promover a inclusão digital e aumentar a confiança na inteligência artificial no Brasil. “Nosso objetivo final é garantir que a tecnologia se torne uma verdadeira aliada da população, e não mais uma barreira”, afirma a professora Giuliana.
A partir dos resultados do estudo, uma das ideias é implementar um projeto-piloto para capacitar manicures e cabeleireiros autônomos de Paraisópolis no uso da IA para aprimorar sua comunicação e estratégias de marketing digital. “Queremos ensinar essas pessoas a utilizar a IA de forma prática e efetiva, ajudando-as a melhorar seu desempenho financeiro e a otimizar a comunicação com seus clientes”, destaca a professora do Insper.
A pesquisa busca uma colaboração mais ampla, a parceria entre o Insper e o BFI para esse projeto deve terminar entre julho e agosto de 2025, mas Giuliana entende que a colaboração vai além desse início. Estabelecida em maio de 2023, essa parceria estratégica tem como objetivo produzir análises aprofundadas sobre questões econômicas cruciais para o Brasil, além de formar uma nova geração de pesquisadores qualificados. Como parte do acordo, o BFI e o Insper promovem pesquisas de ponta, conferências e workshops, além de manter um programa de intercâmbio que permite que jovens pesquisadores brasileiros trabalhem diretamente com professores da Universidade de Chicago.