Em um universo de 110 mil decisões judiciais, é possível obter tendências e insights confiáveis sobre como os juízes estão analisando as mais diferentes demandas que chegam à Justiça. Para isso, é preciso que a tecnologia forneça os dados de forma simples e ágil aos advogados, que poderão interpretá-los a fim de tomar a melhor decisão possível para seus clientes. Essa é a lógica que tem motivado os alunos de Direito do Insper, em parceria com o escritório Demarest, a criar um programa ou software que auxilie o escritório na busca e análise de decisões judiciais envolvendo indenizações por danos materiais e/ou morais. Os milhares de processos foram separados pelo próprio Insper para que os alunos da disciplina de Prática Jurídica, lecionada no segundo ano, pudessem utilizar essa amostra para desenvolver a solução.
“Muitos escritórios têm o desafio de lidar com o chamado contencioso de massa, que envolve número elevado de processos, como é o caso das demandas ligadas ao Direito do Consumidor”, contextualiza o professor Ivar Hartmann. “Pretendemos que os alunos criem um software que vai receber ou ler dezenas de milhares de sentenças, filtrando onde há condenação ao pagamento de danos materiais e/ou morais. A partir daí, o desafio é trazer, por exemplo, os valores envolvidos nesses processos, produzindo estatística a partir deles que seja relevante para os advogados”, completa. Os alunos estão programando o software em linguagem Python, utilizando técnicas de processamento de linguagem natural, contando com o suporte dos professores de Ciência de Dados aplicada ao Direito do Insper. Há quem esteja usando inclusive a inteligência artificial generativa como parte dos seus programas, facilitando assim a filtragem e extração dos dados almejados.
Antes que os alunos partissem para o desenvolvimento do programa, o Demarest deu duas aulas para eles, explicando questões básicas sobre Direito Processual, incluindo as competências da Justiça, e sobre indenizações por danos materiais e/ou morais, como onde tramitam normalmente esses processos judiciais. “Também abordamos quais tipos de filtros e de análises poderiam ser mais úteis não só para o Demarest como para nossos potenciais clientes e para as empresas de forma geral para as quais os alunos trabalharão no futuro. Além disso, fizemos reuniões individuais com cada um dos grupos, que demonstraram bastante interesse em discutir seus projetos”, diz Luana Falkenburger, advogada sênior do Demarest.
Na avaliação da professora Maria Carolina Foss, essa possibilidade de realizar atividades práticas desde o primeiro ano do curso é muito relevante para o aprendizado. “Os alunos têm rapidamente a oportunidade de entregar tarefas a partir de desafios reais e atuais da profissão por meio de interação com nossos parceiros de mercado e do trabalho em equipe. A clínica é uma disciplina obrigatória e realizada por alunos do segundo, quarto e sexto semestres”, afirma. Como o curso de Direito do Insper exige dedicação integral, essa disciplina aproxima os alunos da realidade da prática jurídica, mas de uma forma que permita a eles uma experiência de qualidade que vai muito além de um estágio para fazer atividades repetitivas ou burocráticas. Nas clínicas, os professores escolhem casos reais para que sejam solucionados em parceria com escritório, empresas, órgão público ou terceiro setor.
Há inclusive uma premiação em dinheiro que será oferecida pelo Demarest para os dois grupos primeiros colocados: R$ 10 mil para o vencedor e R$ 5 mil para o segundo lugar. O objetivo é trazer mais um estímulo para os alunos, servindo como uma recompensa pelo trabalho que está sendo realizado. As bancas de avaliação das entregas foram realizadas no dia 11 de dezembro.
Nos últimos anos, como em outras áreas, o Direito tem sido transformado pela tecnologia, o que envolve não somente a digitalização da Justiça como também a automatização de diversas tarefas do dia a dia. A ascensão da IA generativa aplicada aos bancos de dados dos escritórios e da própria Justiça traz novas possibilidades para os advogados.
“Precisamos estar atentos a esse universo porque parte relevante do trabalho do advogado é passar segurança para o cliente sobre suas chances de sucesso ou de derrota nos processos judiciais, bem como ser capaz de orientar o cliente com relação às melhores e mais modernas estratégias de contencioso. Para isso, a partir da tecnologia, temos cada vez mais de obter dados baseados nas decisões da Justiça. Nesse contexto, descobrimos, por exemplo, como os tribunais enxergam as principais questões postas aos nossos clientes, permitindo-nos usar a tecnologia para aprimorar e enriquecer o escopo da nossa assessoria”, diz Luana. Segundo a advogada, para quem trabalha com Direito Consultivo, ou seja, com contratos, transações e memorandos, é igualmente relevante contar com ferramentas e visões analíticas para fornecer a melhor recomendação possível para o cliente, com vistas a prevenir litígios e viabilizar os melhores resultados para os nossos clientes, nos casos em que os litígios forem inevitáveis.
Para o professor Ivar, o objetivo da disciplina de clínica é fazer com que os alunos, depois de formados, possam ser protagonistas em sua atuação, e não coadjuvantes, em um mercado cada vez mais centrado na tecnologia. “O uso desses recursos para resolver problemas jurídicos dará a eles uma vantagem competitiva em relação aos outros profissionais”, finaliza.