Aparência do candidato interfere em sua votação, conclui estudo sobre o Brasil
Quando um candidato se expõe na propaganda de TV no Brasil, os traços característicos de sua aparência pesam na quantidade de votos que receberá. Essa relação é mais acentuada para candidatas mulheres, cujas chances de ser eleitas se elevam à medida que seu rosto contenha mais traços masculinos, revelando um viés de gênero implícito na forma como os eleitores selecionam as feições dos candidatos. Quanto menos informação sobre o candidato o eleitor tiver, mais ele tenderá a recorrer à aparência para decidir o voto. Em sua tese de doutorado no Insper, Felipe Wajskop França chegou a essas conclusões vasculhando mais de 1,5 milhão de fotos de candidatos a vereador, prefeito, deputado estadual e deputado federal, que disputaram pleitos de 2004 a 2018. Seu objetivo foi investigar, munido dos resultados das votações brasileiras, a hipótese recorrente na literatura especializada de que traços físicos ajudam a prever resultados eleitorais. Técnicas da computação permitem extrair de uma imagem bidimensional, como as dos postulantes a cargos políticos armazenadas na Justiça Eleitoral, dezenas de pontos identificadores das características faciais — nariz, olhos, orelhas, boca etc. — de cada pessoa e mapeá-los num esquema cartesiano de três dimensões. Com as relações entre esses pontos, e valendo-se da literatura de psicologia social, Felipe construiu quatro medidas de aparência: simetria, tipicidade (estar próximo das características médias da sua região), juventude (aparentar ser mais jovem) e dimorfismo sexual. Na literatura, as primeiras três estão associadas a atratividade e a competência. Os traços masculinos se associam a dominância, e os femininos, a honestidade. Candidatos e candidatas ao cargo de vereador, o posto com mais postulantes, em média têm feições mais masculinas nas regiões Sul e Sudeste e mais femininas no Nordeste. Há mais homogeneidade de rostos no Sul, já no Norte ocorre mais diversificação. Políticos concorrendo por siglas de direita têm traços mais masculinos que os de esquerda. Candidatos não brancos aparentam ser mais jovens do que os brancos. Quem concorre em municípios menores e mais pobres tende a ter feição mais homogênea. A análise econométrica permitiu ao pesquisador confrontar os resultados das eleições com as variáveis que exprimem a aparência dos candidatos para verificar se traços associados a atratividade, dominância (masculinidade) ou honestidade (feminilidade) rendem mais votos. Por esse mecanismo, chamado de heurística, o eleitor utilizaria atalhos que substituem a avaliação mais detida e informada para decidir em quem votar. A fim de focalizar a investigação em situações em que o eleitor é exposto à imagem do candidato, o trabalho de Felipe França identificou as localidades em que há estações de TV e, portanto, a obrigação legal de veiculação da propaganda eleitoral dos candidatos locais. O principal resultado…
Programa eleva habilidades socioemocionais em áreas menos violentas
A capacidade de distinguir e nomear emoções e a de pensar antes de reagir foram impulsionadas em crianças do Rio de Janeiro após as escolas em que estudam administrarem um programa para fomentar suas habilidades socioemocionais. Esse efeito, entretanto, só foi detectado em unidades situadas em regiões menos violentas do município. A literatura especializada tem confirmado a hipótese de que a aquisição de habilidades não cognitivas, ou socioemocionais, pelas crianças também contribui para melhores resultados em sua trajetória escolar e profissional ao longo da vida. A Base Nacional Comum Curricular, de 2017, reconhece esse fato ao elencar valores como empatia, cooperação e autoconhecimento entre as competências gerais da educação básica. A pesquisadora do Insper Cristine Pinto, com Dana McCoy e Emily Hanno, da Universidade Harvard, e Vladimir Ponczek, Gabriela Fonseca e Natália Marchi, da Fundação Getulio Vargas, avaliaram o impacto de um programa, chamado Compasso, que, durante um ano letivo, procurou instruir alunos de escolas públicas do Rio de Janeiro sobre aspectos importantes das habilidades socioemocionais. Quarenta e cinco pares de escolas do ensino fundamental, cada par contendo duas com características sociodemográficas semelhantes, participaram do experimento. Por sorteio, uma de cada par aplicou o programa de habilidades socioemocionais, enquanto a outra manteve o currículo tradicional, servindo de base de comparação para o estudo. As atividades do programa, ocorridas nas turmas do terceiro e do quinto anos, objetivaram aprimorar habilidades como o reconhecimento de emoções pela expressão facial, a identificação de reações em situações conflitivas, a capacidade de resposta diligente a estímulos súbitos e a memorização de informações que acabaram de ser ouvidas. A pesquisa não encontrou efeito detectável de incremento de habilidades socioemocionais, na comparação com as unidades que não receberam o Programa Compasso, no conjunto total das escolas estudadas. Ao selecionar um subgrupo de escolas que ficavam em áreas com incidência de homicídios relativamente menor, porém, a análise verificou impacto positivo em duas habilidades: a de reconhecer adequadamente emoções e a de reagir controladamente a situações surpreendentes. LEIA O ESTUDO: Um Compasso Para Aprender: A Randomized Trial of a Social-Emotional Learning Program in Homicide-Affected Communities in Brazil
Fundeb carece de mecanismos para incentivar o aprendizado dos alunos
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), mecanismo que redistribui recursos entre a União e os estados brasileiros, ampliaria suas possibilidades de impacto se centrasse mais o foco no emprego eficiente das verbas para o desempenho escolar e se permitisse aos gestores mais flexibilidade e autonomia para alcançar seus objetivos educacionais. Sucedânea do Fundef, instituído em 1996 para o ensino fundamental (6 a 14 anos), a emenda constitucional que dez anos depois criou o Fundeb para abranger também a etapa infantil (4 a 5 anos) e a média (15 a 17 anos) redistribui uma parcela da arrecadação de União, estados e municípios para 27 fundos estaduais (distrital no caso do Distrito Federal) a fim de reduzir disparidades do gasto público por aluno no Brasil. Cálculos dos pesquisadores do Insper Ricardo Paes de Barros e Laura Muller Machado mostram que o mecanismo reduz em mais de 40% a desigualdade no gasto por estudante no país — aproximando-o da distribuição equitativa — comparado ao que ocorreria na sua ausência. No entanto, em capítulo do livro “Para Não Esquecer: Políticas Públicas que Empobrecem o Brasil”, os autores notam que equilibrar o montante das verbas não tem sido suficiente para reduzir igualmente a disparidade no aprendizado dos alunos entre as redes e escolas. Partilhar também as práticas mais eficientes no gasto, com vistas ao desempenho dos alunos, deveria nortear ajustes nessa política pública, argumentam. O Fundeb poderia estimular a utilização mais eficaz dos recursos, na avaliação dos autores, se premiasse escolas que melhorassem o desempenho dos seus alunos em exames padronizados, o que a reforma de 2020 fez parcialmente ao canalizar uma parcela extra da União sob esses parâmetros. No entanto, o montante com essa destinação é muito pequeno. Outro ajuste recomendado seria abrir mão da exigência de que os recursos arrecadados num ano sejam gastos no mesmo ano. Receitas tributárias flutuam com os ciclos econômicos, já as despesas com o sistema de ensino tendem a ser estáveis. O dinheiro economizado num ano de bonança poderia ser guardado para uso num período de dificuldade, ajudando a amortecer as oscilações e facilitando o planejamento plurianual. A flexibilização de amarras contábeis para os desembolsos — por exemplo, 70% da verba hoje precisa ser gasta com profissionais da educação; entidades privadas de ensino fundamental urbano estão proibidas de receber dinheiro do Fundeb — também elevaria a capacidade dos gestores de atingir os objetivos escolares, na avaliação da dupla de pesquisadores. Ricardo Paes de Barros e Laura Muller Machado propõem, em suma, que seja dada maior autonomia e assistência técnica para os gestores e que a cobrança…
Capital humano pode atenuar desincentivo à eficiência no setor público
O conjunto de fatores que, nas organizações públicas, inibe a adoção de práticas administrativas mais eficientes pode ser parcialmente compensado por uma qualificação maior do seu corpo de profissionais. Essa associação entre capital humano e moderação do desincentivo à boa gestão foi encontrada num estudo com escolas brasileiras de ensino médio. Os pesquisadores do Insper Sérgio Lazzarini e Sandro Cabral, com Thomaz Teodorovicz (Harvard) e Leandro Nardi (HEC Paris), trabalharam com dados do Censo Escolar e do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) dos anos de 2007 e 2008 para investigar três hipóteses acerca da qualidade da gestão num universo de 13.939 escolas, sendo 11.058 públicas. Em primeiro lugar, o estudo confirmou pela análise econométrica que escolas públicas, à diferença das privadas, estão associadas à menor propensão a adotar práticas superiores de gestão interna e também de engajamento com o público externo diretamente afetado pelas atividades escolares, como os pais e a comunidade local. Variáveis para exprimir práticas gerenciais e padrões de engajamento foram elaboradas a partir das respostas dos estudantes no questionário do Enem sobre suas percepções acerca de como funcionam aspectos do cotidiano escolar, como planejamento, organização de horários e turmas, solução de conflitos, promoção de feiras, palestras e excursões e capacidade de avaliar o aprendizado. A segunda hipótese confirmada pelos pesquisadores foi a de que o acesso a professores e gestores mais bem instruídos, bem como a mais e melhores recursos tecnológicos, está relacionado à adoção de práticas superiores de gestão interna e de engajamento externo em todo o universo de escolas investigado. A qualificação dos profissionais foi apurada com base na proporção de professores com diploma universitário na escola, e a dotação tecnológica das unidades foi aferida pelo número de computadores dividido pelo número de funcionários, informações dos censos escolares. A terceira e última hipótese avaliada no estudo foi a seguinte: considerando apenas o conjunto das escolas públicas, se a maior dotação de capital humano e de recursos tecnológicos se associa a uma tendência reduzida à não adoção das práticas superiores de gestão e engajamento. A resposta encontrada na análise foi positiva apenas para o caso dos recursos humanos — a infraestrutura tecnológica não se relacionou com menor propensão a dispensar boas práticas. As principais conclusões de Lazzarini, Cabral, Teodorovicz e Nardi resistiram a testes suplementares, feitos por exemplo para comparar escolas cujos alunos detêm características socioeconômicas semelhantes, sugerindo haver um caminho para a melhoria das práticas gerenciais nas escolas públicas mesmo levando em conta a falta de incentivos diretos — como distinções salariais e liberdade de contratar — constitutiva desse modelo de organização. Exercícios dos autores e uma série de outros estudos coincidem em…
Doações de itens de higiene e limpeza poderiam ter reduzido covid em comunidades do Rio de Janeiro
Doações coordenadas por organizações civis em comunidades pobres do Rio de Janeiro mitigaram os efeitos da pandemia da covid-19. O impacto na saúde teria sido maior provavelmente com mais oferta de itens de higiene e limpeza. Se o foco da iniciativa fosse elevar a disponibilidade de alimentos nas casas, a opção por doações de vouchers, por meio dos quais as famílias arbitram o que comprar com o recurso, teria maior impacto. As conclusões constam de simulações efetivadas por Adriana Leiras, Luiza Alves Cunha e Bianca B. P. Antunes, da PUC-RJ, Paula Santos Ceryno, da UFRJ, e Vinícius Picanço Rodrigues, do Insper, associando dados epidemiológicos, informações de itens doados e pesquisas sobre o comportamento das pessoas e de organizações do terceiro setor em 143 favelas da capital fluminense entre o final de maio e meados de junho de 2020. Por diversos mecanismos, a abrupta restrição à atividade que se seguiu como resposta à pandemia afetou a saúde das comunidades mais vulneráveis. O estrangulamento da renda e do acesso a alimentos induz as pessoas a flexibilizarem comportamentos mais rígidos de resguardo e distanciamento domiciliar, recomendados para reduzir as infecções pelo coronavírus, na tentativa de obter os itens de primeira necessidade. As condições de vida nessas regiões na base da pirâmide social, com maior proximidade entre pessoas e menor disponibilidade de saneamento e condições para higienização, catalisam as infecções. O modo específico como são organizadas as doações para contra-arrestar os efeitos negativos da pandemia também implica maior ou menor risco de contágio. Se os beneficiários precisarem se deslocar até um centro de distribuição, por exemplo, a chance de contrair o patógeno se eleva. Isso também ocorre se o conjunto de bens doados, a relação entre alimentos e produtos de higiene, estiver desequilibrado. Para lidar com essa complexidade, os pesquisadores recorreram a um modelo que simula e computa interações positivas e negativas para o contágio da covid-19 e para a disponibilidade de alimentos entre as variáveis identificadas em campo. O método permite estimar o que ocorreu concretamente e o que ocorreria se alguns parâmetros — como a participação relativa entre alimentos e produtos de higiene ou entre doações de vouchers e de itens — tivessem sido outros. As doações de itens para essas comunidades foram altamente concentradas em alimentos (97%) e pouco em produtos de limpeza (3%). O exercício dos pesquisadores estima que, se houvesse equilíbrio entre as duas modalidades de doação, a quantidade de pessoas infectadas nos primeiros 210 dias da epidemia teria sido 5% menor do que com as quantidades efetivamente doadas. O resultado indica que, se o foco das doações fosse reduzir o contágio, mais produtos de higiene deveriam…
Formar médicos em regiões desprovidas reduziria disparidades no Brasil
No Brasil, como em outros países desenvolvidos e em desenvolvimento, a escassez de médicos em algumas regiões é resultado de desigualdades na distribuição geográfica desses profissionais: se em determinadas áreas a oferta de médicos é abundante, em outras é insuficiente para cobrir as necessidades da população. Dados do Conselho Federal de Medicina de 2018 mostram que o número de médicos por mil habitantes está acima de 10 em algumas capitais e regiões metropolitanas — taxa muito superior à observada na maioria dos países desenvolvidos —, mas não passa de 2,1 no interior. Por outro lado, há ampla evidência na literatura econômica mostrando que a falta de profissionais qualificados nas áreas rurais e menos desenvolvidas constitui importante barreira para a melhoria da saúde da população. Não se sabe exatamente, entretanto, se políticas de incentivo financeiro são capazes de aumentar a proporção de médicos em áreas desassistidas. Para responder a essa pergunta, é necessário entender os fatores — inclusive diferenças salariais — que determinam a oferta de médicos em cada região do país e como os médicos reagem a alterações nesses fatores. Em estudo recentemente aceito para publicação, Francisco Costa (University of Delaware), Letícia Nunes (Insper) e Fabio Miessi (BI Norwegian Business School e Insper) simulam os efeitos de diferentes políticas públicas sobre a distribuição geográfica de médicos no Brasil. Para o estudo, foram coletadas informações sobre o universo de médicos generalistas formados no Brasil entre 2001 e 2013. Os autores observaram características individuais de 49.989 médicos — idade, gênero, local de nascimento, faculdade onde estudou —, o local onde esses médicos escolheram para trabalhar logo após o término da faculdade e atributos desses locais — salário médio real, medidas de qualidade da infraestrutura de saúde e das amenidades locais (qualidade das escolas, da segurança, do transporte público etc.). Com essas informações, o estudo analisou como as características dos médicos e das regiões afetam onde esses profissionais escolhem trabalhar. Os resultados indicam que os principais fatores por trás da escolha dos médicos são proximidade do local onde eles nasceram ou estudaram. Maiores salários e uma melhor infraestrutura de saúde e das amenidades locais também importam, mas em uma escala consideravelmente menor do que estar próximo ao local de nascimento ou graduação. Além disso, as preferências são heterogêneas de acordo com a qualidade e o prestígio da faculdade de medicina na qual os médicos se formaram. Aqueles que se formaram em melhores escolas valorizam mais as amenidades locais, são mais inelásticos aos salários, obtêm menor valor para retornar à sua região de nascimento e são os mais inclinados a permanecer no local de graduação. Em seguida, usando simulações, foi avaliado o efeito de…
Delegacia da mulher está associada a redução de homicídios femininos
A presença de uma delegacia de polícia especializada em atender mulheres está ligada a uma melhora relativa nos indicadores de homicídio feminino no município após a implantação da Lei Maria da Penha, de 2006, que reforçou as proteções dessa população contra violências. Essas unidades policiais demonstraram menor eficácia na preservação da integridade de mulheres cuja cor da pele é identificada como preta ou parda. A fim de avaliar a cogitação de que organismos públicos especializados na defesa e na promoção de direitos de segmentos vulneráveis fazem diferença na prática, os pesquisadores Paulo Arvate (FGV), Sandro Cabral (Insper), Anita M. McGahan (Universidade de Toronto) e Paulo Ricardo Reis (UFRJ) aproveitaram-se da introdução no Brasil da Lei Maria da Penha, promulgada em 7 de agosto de 2006. O dispositivo legal ampliou as proteções contra a violência doméstica e familiar que vitima mulheres no país. Introduziu mecanismos seja para prevenir essas ocorrências, como o reforço de medidas protetivas contra agressores, seja para coibi-las, como a obrigação de o setor público prestar atendimento especializado às agredidas. Um desses mecanismos promovidos pela lei de 2006, as delegacias da mulher vinham sendo implantadas em alguns municípios, por iniciativas estaduais, desde a década de 1980. Com base na literatura especializada, os pesquisadores formularam a hipótese de que o efeito da nova lei seria mais pronunciado nas cidades que já dispunham de uma delegacia da mulher, na comparação com outras desprovidas do órgão policial. Com dados anuais de homicídios por localidade obtidos no Datasus (plataforma do Ministério da Saúde) e informações sobre a presença de delegacias da mulher nessas cidades, oriundas da pesquisa Munic do IBGE, o quarteto de pesquisadores pôde analisar o que aconteceu alguns anos depois da promulgação da Lei Maria da Penha nesses dois grupos de municípios brasileiros com a taxa de assassinatos de mulheres. Se, antes do advento da legislação, as taxas de homicídio feminino entre cidades com e sem delegacia da mulher não diferiam, elas passaram a divergir nas verificações feitas seis anos e doze anos após a implantação da lei. Os assassinatos de mulheres nas cidades sem a delegacia especializada cresceram no período, o que não ocorreu nas municipalidades que contavam com esse tipo de unidade policial. Ao detalhar o efeito da redução de homicídios, os pesquisadores constataram, no entanto, que ele ficou concentrado nas mulheres brancas, em detrimento das identificadas como pretas e pardas. Essa disparidade foi menor em cidades com elevada taxa de instrução formal da população e nas regiões metropolitanas, que contam com melhor infraestrutura de comunicação e transportes. De posse desses resultados, os pesquisadores sugerem que as delegacias especializadas em atendimento de mulheres poderiam ampliar os seus efeitos…
Vitória de prefeita eleva a participação de eleitoras adolescentes no pleito seguinte
Quando uma mulher se elege prefeita, a fatia de eleitoras adolescentes do município no pleito seguinte aumenta. Mas, quando a candidata é derrotada por um homem, o efeito é o contrário: cai a proporção de meninas aptas a votar de 16 e 17 anos, faixa etária em que o registro eleitoral é facultativo no Brasil. Ao avaliar os ciclos eleitorais de 1996 a 2012, os pesquisadores Sergio Firpo, do Insper, Paulo Arvate e Renan Pieri, ambos da FGV, observaram um efeito estatisticamente significativo, embora de proporção relativamente pequena, de triunfos e derrotas de mulheres em pleitos municipais sobre o engajamento da fatia mais jovem do eleitorado. A hipótese é a de que uma candidata vitoriosa influi, pelo exemplo, positivamente na participação política das mulheres daquela localidade, e vice-versa em caso de insucesso. As regras brasileiras, que permitem mas não obrigam o registro de adolescentes de 16 e 17 anos — à diferença da norma mandatória para adultos até os 70 —, conferiram aos pesquisadores um ambiente similar ao de um experimento para testarem sua cogitação. A análise de saída restringiu-se aos municípios com menos de 200 mil eleitores (onde não ocorre segundo turno para definir o prefeito) em que os dois primeiros colocados eram de gêneros diferentes. Também se circunscreveu aos casos em que a margem de vitória ou derrota da candidatura feminina se aproximou de zero. Nessas situações, o que diferencia triunfo de insucesso são menos os atributos dos competidores e mais fatores incidentais — o que as aproxima dos sorteios feitos em experimentos controlados. Nesse espectro da avaliação, a evolução da fatia de meninas de 16 e 17 anos registradas para votar dois anos depois que uma candidata a prefeita havia sido eleita ou derrotada revela uma descontinuidade quando a margem do resultado tende a zero. Dá um salto pequeno para cima em caso de vitória e outro, quase simétrico, para baixo após derrota. A magnitude do efeito foi estimada entre 1,1 e 1,6 ponto percentual — para mais após vitória, para menos após derrota — na proporção de meninas inscritas para votar, sendo ligeiramente maior em cidades com participação de vereadoras acima da média. Exercícios suplementares sugerem que adolescentes mais velhas, em idade de votar quando uma candidata é vitoriosa ou derrotada, transmitem para irmãs mais novas o estímulo favorável ou contrário ao engajamento, que se concretizará no registro eleitoral dois anos depois. Também indicam que acesso a informação — seja em programas para orientar adolescentes sobre eleições, seja por conexão facilitada à internet — conta favoravelmente na decisão de meninas de 16 e 17 anos de registrar-se para votar. Leia o estudo Can women's performance…
Renda com a exportação agrícola impulsionou a alfabetização no Brasil
Entre o final do século XIX e meados do XX, as localidades mais beneficiadas pela alta no preço dos principais bens agrícolas exportados pelo Brasil apresentaram menor analfabetismo. Essa relação, mais intensa antes da abolição da escravidão e da fundação da República, operacionalizou-se pela atração da população branca imigrante, com afastamento da preta e parda, e pela expansão de indústria e serviços sobre a agricultura. Ao analisarem dados coletados entre os censos de 1872 e 1960, os pesquisadores do Insper Naercio Menezes Filho, Bruno Proença e Bruno Komatsu, com seu colega da USP Leandro Anazawa, apuraram quais foram os impactos no letramento da população dos choques positivos de renda propiciados pelas elevações nos preços das mercadorias agrícolas mais exportadas pelo Brasil: café, cana de açúcar, algodão, tabaco e cacau. Quando uma comunidade é contemplada com ganhos extraordinários, advindos da valorização dos bens que produz e comercializa, pode utilizar esses recursos para elevar a instrução da população, seja porque as famílias disporão de mais renda e inclinação para investir na formação dos filhos, seja porque os governos, mais bem aquinhoados de receitas tributárias, acabarão levados a expandir os serviços de educação pública. A fim de testar essa hipótese, os pesquisadores desenvolveram uma variável para captar apenas os efeitos dos choques de preços de exportações. Batizada de vantagem comparativa de preços internacionais (CAIP, na sigla em inglês), ela leva em conta a interação entre os potenciais de produtividade devidos a condições geográficas favoráveis, inerentes a cada uma das 482 localidades e cada um dos principais produtos de exportação, e a variação dos preços internacionais desses produtos, avaliados ao longo do período de 88 anos. O estudo econométrico indicou que a elevação de um desvio padrão no CAIP – variação relevante do indicador de sensibilidade ao preço internacional — reduz em até 14 pontos percentuais a fatia de analfabetos numa localidade. Esse efeito foi maior em 1872, antes da abolição da escravidão e do advento da República, que em 1960, após tais mudanças. A análise dos pesquisadores também circunscreveu alguns mecanismos pelos quais o bônus na renda de exportações pode ter impulsionado o avanço da população instruída. Nas regiões beneficiadas pelo choque de preços das exportações, foi menor a proporção de pretos e pardos na população. A atração de imigrantes brancos para essas áreas, com maior grau de instrução e inclinados a demandar educação pública dos governos, e o deslocamento da população não branca são hipóteses que podem explicar o fenômeno. Além disso, detectaram-se graus superiores de diversificação setorial, com maior participação de indústria e serviços e menor da agricultura, nas localidades beneficiadas pela valorização de suas commodities. A expansão dessas atividades…
Prefeitas superam prefeitos em proteção à vida na pandemia
Municípios brasileiros governados por mulheres registraram melhores resultados na crise sanitária do coronavírus do que localidades lideradas por homens em situação comparável. O fato de ter uma prefeita no Executivo relaciona-se com menos hospitalizações e mortes por covid-19 e com maior adoção de medidas protetivas. Nas eleições para prefeituras de 2016, um conjunto de 1.222 municípios brasileiros apresentou ou uma mulher e um homem ou um homem e uma mulher nas duas primeiras colocações. Os pesquisadores Raphael Bruce, do Insper, Alexsandros Cavgias, da Universidade de Barcelona, e Luis Meloni e Mário Remígio, da USP, tomaram esse universo para avaliar se a liderança feminina fez diferença na pandemia. Selecionando, entre todas essas disputas, aquelas em que a diferença entre o primeiro e o segundo colocado foi relativamente estreita, a análise comparou candidatos que aos olhos do eleitor tinham características parecidas. A vitória e a derrota nessas situações funcionam quase como um sorteio nos experimentos feitos em condições controladas. Esse evento quase incidental de uma mulher, e não um homem, ter sido eleita levou a resultados palpavelmente diferentes no enfrentamento da epidemia no último ano do mandato desses governantes. Nas cidades comandadas por mulheres houve 47 menos hospitalizações a cada grupo de 100 mil habitantes, na comparação com as lideradas por homens. Sob as prefeitas, a taxa de mortes também foi menor: 26 a menos por 100 mil. Esses indicadores representam quedas de 30% e 44% nas taxas de hospitalizações e mortes, respectivamente, na comparação com as cidades governadas por prefeitos que venceram a segunda colocada por pequena margem em 2016. Reduções em volume similar também se verificaram para internações e mortes por síndrome respiratória aguda grave (SRAG), uma maneira de contornar possíveis subnotificações da covid-19. Ao investigar os mecanismos pelos quais as prefeitas podem ter protegido melhor a saúde da população, a pesquisa verificou ter havido incremento na adoção de medidas sanitárias de cautela, não farmacêuticas, nas cidades comandadas por mulheres. Na comparação desses municípios com os governados por homens, além de as ações protetivas terem se dado em maior número, sobressaíram o uso obrigatório de máscaras, os vetos a aglomerações, os bloqueios sanitários e as restrições ao transporte coletivo. Outro achado dos pesquisadores foi a conexão entre os resultados melhores das prefeitas na crise sanitária e a preferência eleitoral pelo presidente Jair Bolsonaro demonstrada nas eleições de 2018. A redução de hospitalizações e mortes foi mais forte nas cidades que votaram no então candidato do PSL acima da mediana nacional. LEIA O ESTUDO: Under Pressure: Women's Leadership During the COVID-19 Crisis
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