Exportar produtos básicos não é ruim para o Brasil
A geração de valor em uma atividade produtiva não tem necessariamente a ver com o preço por tonelada do produto vendido O preço de uma tonelada de minério de ferro exportada pelo Brasil gira em torno de 150 dólares no mercado internacional. Enquanto isso, a versão mais barata do iPad custa 399 dólares nos Estados Unidos. Como o iPad pesa ao redor de 600 gramas, o valor equivalente por tonelada desse produto é nada menos que 565 mil dólares – quase 4 mil vezes o preço por tonelada de minério. Esse tipo de cálculo tem sido usado por membros do alto escalão do governo para justificar a ideia de que exportar produtos básicos, como o minério de ferro ou produtos agrícolas, é ruim. Melhor seria incentivar produtos de maior “valor agregado” como computadores, aviões ou carros. Entretanto, a geração de valor em uma atividade produtiva não tem necessariamente a ver com o preço por tonelada do produto vendido. Fosse assim, todos os empresários deveriam produzir anéis de ouro e colares de diamante. Em realidade, uma determinada atividade produtiva adiciona valor quando as vendas do produto acabado são maiores que o custo das matérias-primas e operações. Esse é o chamado valor da transformação industrial. Economistas usualmente dividem esse valor pelo total de pessoas empregadas no setor para obter a famosa medida de produtividade do trabalho: o quanto uma atividade adiciona valor para cada trabalhador. Segundo dados do IBGE, de 1996 a 2009, corrigindo pela inflação, o setor de extração de minerais metálicos adicionou um valor médio anual de 487 mil reais por trabalhador. E essa produtividade cresceu 4,28% ao ano. O setor de metalurgia, que seria, em tese, de maior “valor agregado”, adicionou bem menos valor: 246 mil reais por trabalhador, com um crescimento também menor de produtividade, de 0,68% ao ano. O setor de equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos, tido como de ainda maior “valor agregado”, exibiu uma produtividade de apenas 173 mil reais por trabalhador, declinante durante todo o período (queda de -3,68% ao ano). O computador e o aço valem muito mais por tonelada que o minério de ferro, mas adicionam muito menos valor por trabalhador do que esse último produto tido como básico. Assim, obrigar empresas como a Vale a “agregar valor” ao seu minério investindo em siderurgia no Brasil ou dar subsídios para empresas montarem iPads no Brasil são ações que podem, paradoxalmente, destruir valor. Por que isso ocorre? Os setores de extração mineral e produtos agrícolas se baseiam em áreas onde o Brasil tem vantagens naturais. Qualquer país pode investir em uma indústria de aço, mas poucos países têm disponibilidade de minério de…
Desindustrialização?
A participação da indústria de transformação no Produto Interno Bruto (PIB) tem declinado nos últimos anos, atingindo 15% em 2011. Esse fato tem levado vários analistas a afirmar que está em curso um processo de desindustrialização no país. O governo, hiperativo, tem tomado várias medidas para salvar a indústria, como desonerações fiscais e aumento de impostos dos produtos importados. Mas, será que a desindustrialização existe mesmo? Em caso positivo, será que as medidas recentes do governo podem realmente salvar a indústria brasileira? O processo que hoje chamamos de desindustrialização é conhecido na literatura econômica como mudança estrutural (“structural change”). Ele começa com o deslocamento dos trabalhadores da agricultura para a indústria e serviços, decorrente do crescimento da produtividade na agricultura. Isso ocorre porque, segundo Adam Smith “o desejo de alimentação é limitado em todos os homens pelo tamanho do seu estômago”. Depois disso, começa a transição dos trabalhadores da indústria para o setor de serviços, pois o número de geladeiras que uma família precisa é limitado, mas o número de vezes que ela pode viajar não. Esse processo tende ser reforçado pelo aumento da produtividade no setor industrial, que faz com que um número menor de trabalhadores seja necessário para atender a demanda por produtos e máquinas na indústria. Retração como sinal de sucesso. Assim, a participação do emprego na indústria de transformação nos EUA, que em 1965 era de 24%, passou para apenas 11% em 2005. No entanto, esse processo não levou à estagnação da economia americana, uma vez que a produtividade de seus trabalhadores aumentou continuamente, inclusive nos serviços. Assim, a participação da indústria no PIB americano tem permanecido estável nos últimos 50 anos. Da mesma forma, a participação do emprego na indústria tem declinado na grande maioria dos países do mundo, incluindo os latino-americanos, ao longo das últimas décadas. Curiosamente, a participação do emprego industrial no Brasil manteve-se estável nas últimas décadas, em cerca de 20%. Assim, o processo de mudança estrutural ocorrido na maioria dos outros países não tem ocorrido no Brasil, ao contrário dos que advogam a tese de desindustrialização. Mas, a participação da indústria no PIB tem declinado. Qual o segredo? O problema está na nossa produtividade industrial. Como mostra a figura ao lado, a produtividade do trabalho na indústria de transformação brasileira cresceu entre 1965 e 1980, mas declinou continuamente nos anos 80. E, após um breve aumento no início da década de 90 (provocado pela liberalização comercial), está estagnada desde então. Enquanto isso, a produtividade do trabalhador industrial americano vem aumentando continuamente desde 1965, o mesmo acontecendo com o coreano, que ultrapassou o brasileiro no início da década de 90. Isso afeta…
O piso salarial para professores
Em julho de 2008, o presidente Lula sancionou a lei que criou o piso salarial para os professores da rede pública. O valor desse piso atualmente é de R$ 1.451. Vários Estados e municípios alegam não ter condições de pagá-lo. Por isso, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) acaba de convocar uma greve nacional de professores, que está tendo adesão em vários Estados. Em que medida o piso salarial é a melhor forma de valorizar o professor brasileiro? Antes de tudo, é importante ressaltar que é fundamental valorizar a carreira de professor. Apesar de não ser condição suficiente para garantir o aprendizado, várias pesquisas mostram o impacto positivo que um bom professor pode ter na vida dos seus alunos. Além disto, nas sociedades em que o professor é mais valorizado, os melhores alunos do ensino médio escolhem essa carreira, o que cria um círculo virtuoso. Mas, será que o piso salarial com as regras atuais é a melhor maneira de conseguir valorizar o professor e aumentar a qualidade do ensino? Parece-me que não. Segundo as regras atuais do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), todos os Estados e municípios têm que gastar 25% de sua receita de impostos e transferências com educação. Além disso, 60% desse montante tem que ser gasto com a educação básica e, mais importante, 60% desses recursos têm que ser gastos com salários dos professores em exercício. Assim, os professores de cada Estado recebem (em tese) 9% das principais receitas dos Estados. Os recursos do Fundeb são distribuídos entre as redes municipais de cada estado de acordo com a proporção dos seus alunos no total. Quais as vantagens do Fundeb? A principal vantagem é que o aumento dos gastos com professores acompanha a expansão das receitas dos municípios e Estados. Assim, quando a arrecadação do Estado cresce, os professores ganham mais, ou mais professores são contratados, de acordo com as necessidades de cada rede. O valor do gasto mínimo por aluno, que deve ser seguido em todos os Estados e municípios, é determinado pelo governo federal, que complementa os gastos de cada ente federativo até que esse valor seja atingido, transferindo recursos para os estados e municípios mais pobres. Assim, se o valor determinado pelo governo federal for alto demais, ele próprio terá que arcar com o ônus de transferir mais recursos. De fato, o governo federal tem feito isso de forma crescente nos últimos anos, o que reduz a desigualdade nos gastos entre os Estados. Entretanto, desde 2008 foi instituído o piso salarial para os professores, que funciona em paralelo com a regra do Fundeb. O piso fixa o salário mínimo inicial…
Desenvolvimento infantil
Como sabemos, o Brasil ainda apresenta índices de pobreza e desigualdade muito elevados, incompatíveis com a sua renda per capita. Isso é ruim para a nossa sociedade e, além disso, tem consequências importantes para a violência e criminalidade. Mas, por que será que grande parte dos adultos nas famílias mais pobres tem tantas dificuldades para encontrar um trabalho fixo com remuneração adequada? Nos últimos anos, a sociedade brasileira entendeu que a raiz de muitos desses problemas está no fato de que os alunos aprendem muito pouco nas escolas públicas brasileiras. Nesse sentido, novas políticas educacionais têm sido implementadas nas redes municipais e estaduais para tentar melhorar a qualidade do ensino nas nossas escolas. A novidade é que novas pesquisas científicas têm mostrado que essas deficiências de aprendizado podem estar relacionadas com problemas sérios no desenvolvimento infantil dessas crianças que foram se acumulando ao longo do tempo. Segundo o Centro de Desenvolvimento Infantil da Universidade de Harvard, experiências de risco e situações de estresse prolongado no início da vida das crianças podem afetar o seu desenvolvimento futuro ao alterar a sua estrutura genética, provocando mudanças físicas e químicas no cérebro que irão perdurar para o resto da vida. Essas experiências de risco estão relacionadas com problemas nutricionais, mas também com problemas no convívio familiar e falta de estímulos adequados nos primeiros anos de vida. Interação entre genes e meio ambiente. Agora podemos entender melhor por que algumas medidas na área educacional tem tido tão pouco efeito no aprendizado das crianças. Introdução de computadores na sala de aula, aumento dos salários e da escolaridade dos professores, redução do tamanho da classe, todas essas políticas tem tido resultados muito decepcionantes até agora. Via de regra, elas não conseguem aumentar a qualidade do ensino ou, em alguns casos, beneficiam somente os alunos com pais mais educados ou os que estudam em escolas privadas. Na verdade, o que a ciência está sugerindo é que a dificuldade de melhorar o aprendizado das crianças mais pobres pode estar relacionada com problemas no seu desenvolvimento anterior, que podem ter alterado o seu nível de concentração e sua capacidade de reagir em face de situações adversas. Logo, uma parte significativa dos nossos problemas educacionais e, portanto, da pobreza, desigualdade e criminalidade poderiam ser evitados caso as políticas para o desenvolvimento infantil fossem mais eficazes. Se desenvolvermos uma série de políticas públicas eficientes para as nossas crianças, poderemos melhorar substancialmente a sua situação no prazo de uma geração. Quais os caminhos a serem seguidos? O primeiro problema, que precisa ser enfrentado com urgência, é o de saneamento básico. Uma parcela substancial dos brasileiros ainda vive em casas sem saneamento adequado.…
O ‘empoderamento desenvolvimentista’
Afora as peculiaridades do seu estilo, a presidente Dilma Rousseff não faz um governo diametralmente oposto ao de seu antecessor e é mesmo possível que aquilo que hoje demarca sua gestão fosse levado a cabo também por Lula, estivesse ele sob as mesmas circunstâncias. Bobagem imaginar cisões e distanciamentos entre criador e criatura. O fato é que, mesmo fazendo profissão de fé à ortodoxia, Lula desde sempre manteve certo dispositivo desenvolvimentista à espreita em seu governo. Primeiro, confinado ao BNDES, depois expandido ao Ipea e à Fazenda, esse setor aguardava a hora de entrar em campo. Dilma ampliou seu espectro reforçando os Ministérios da Ciência e Tecnologia e do Desenvolvimento – este, com Lula, foi muito mais o Ministério do Comércio Exterior. A visão desenvolvimentista é fenômeno recorrente no País e, a rigor, não constitui novidade no cenário nacional. Para sermos justos, lembremos que também Fernando Henrique Cardoso projetara seu momento desenvolvimentista. O superministério da produção de FHC só não foi levado a cabo pelas circunstâncias: a morte de Sérgio Motta, as sucessivas crises dos mercados emergentes, o escândalo dos grampos do BNDES e as desinteligências entre PSDB, PFL e PMDB em torno da composição do poder no segundo mandato. Assim, o desenvolvimentismo dilmista não é algo exatamente novo nem extraordinário. O que o reaviva neste momento, como já se disse, são as circunstâncias. A persistente crise financeira mundial nos países desenvolvidos arrefeceu a pressão externa, presente em FHC e Lula, para que fosse seguida a cartilha ortodoxa. Não menos importante, os mercados emergentes, que antes eram problema, tornaram-se solução – para usar uma frase de Lula. São hoje os heróis do crescimento num mundo combalido por desemprego e dívida. Sob constante assédio de empresas e investidores internacionais, o mundo emergente passa a ter mais espaço para políticas distanciadas da busca irrestrita de controle inflacionário e forte disciplina fiscal. Esse novo “empoderamento desenvolvimentista” emerge, no Brasil, com algumas características importantes. No âmbito da máquina pública, o impulso, que antes se localizava nas iniciativas de formar “campeões nacionais”, pelo BNDES, agora se espalha por meio de uma miríade de iniciativas articuladas pelos Ministérios da Fazenda, da Ciência e Tecnologia e do Desenvolvimento. Seus ministros querem cada vez mais mostrar serviço e, embora nem sempre atuem em uníssono, compartilham as mesmas críticas ao receituário ortodoxo, assim como parece ser o caso da própria presidente. Coincidência ou não, os cortes de juros pelo Banco Central vieram justamente num momento em que esse grupo se reforça. Quais seriam, então, as implicações desse processo? A tríade ministerial acima citada deve continuar ganhando mais espaço e tentando ampliar seu leque de propostas. O aumento do IPI…
Como salvar a indústria brasileira?
"A produtividade não é tudo, mas no longo prazo é quase tudo” Paul Krugman Os responsáveis pela política econômica do país têm declarado repetidas vezes que é necessário proteger a indústria brasileira da concorrência predatória de outros países, de forma a preservar o nosso mercado para a indústria brasileira. Com esse objetivo, várias medidas de isenção fiscal tem sido implementadas nos últimos meses. Mas, será que os programas de ajuda à indústria fazem sentido do ponto de vista da sociedade como um todo? Como os produtos estrangeiros conseguem chegar tão baratos ao mercado brasileiro? Enfim, conseguiremos salvar nossa indústria? Em primeiro lugar, é preciso ficar claro que o objetivo da política econômica não deve ser o de preservar o mercado interno brasileiro para as empresas nacionais, mas sim o de aumentar o bem-estar da população brasileira no longo prazo. A população brasileira é composta de empresários e trabalhadores da indústria, mas também de empresários e trabalhadores de outros setores e, principalmente, de milhões de consumidores. Devemos nos preocupar com todos eles. Mas, a queda na participação da indústria no mercado interno merece uma análise mais detalhada. Afinal, como podem os carros coreanos, por exemplo, chegar ao nosso mercado com qualidade tão superior aos produzidos aqui na mesma faixa de preço? Na verdade, a “invasão” de produtos industriais importados no nosso mercado doméstico reflete, em grande medida, o diferencial de produtividade entre o Brasil e os seus principais parceiros comerciais, que é acentuada no caso da indústria. Segundo a Conference Board (www.conference-board.org), a produtividade média do trabalhador brasileiro equivale a apenas 20% da produtividade do trabalhador americano. Isso significa que o trabalhador brasileiro demora cinco dias para produzir o mesmo que o trabalhador americano faz em um dia. Já o trabalhador coreano tem uma produtividade média três vezes maior que o brasileiro, ou seja, enquanto o brasileiro produz um automóvel, o coreano já produziu três. Isso explica, em parte, porque os carros coreanos são muito superiores aos produzidos aqui. Além disso, a situação está piorando ao longo do tempo. Enquanto a produtividade do trabalho nos principais países emergentes (Brics, México, Indonésia e Turquia) aumentou 6,1% por ano entre 2005 e 2010, no Brasil, ela aumentou apenas 2,1%. Na China a produtividade aumentou 9,8% e na Coreia 3,9%. Ou seja, além de termos uma produtividade bem menor do que nossos concorrentes diretos, estamos ficando cada vez mais para trás. No caso específico da indústria, a situação é ainda pior. Um estudo recente do Banco Interamericano de Desenvolvimento mostrou que a produtividade do trabalho na indústria brasileira está regredindo em termos relativos. Ela equivalia a 30% da americana em 1973 e declinou para…
Políticas Públicas: Uma Nova Agenda
Dezenas de novos programas públicos são lançados todos os anos em cada um dos nossos 5565 municípios e 27 Estados, além daqueles implementados pelo governo federal, que abrangem o Brasil como um todo. São programas de todos os tipos, que vão desde as transferências condicionais de renda (como o Bolsa-Família) até programas de bônus por desempenho para professores das redes públicas de ensino, passando pelas tornozeleiras eletrônicas para monitorar presos em liberdade provisória, gestão privada de serviços de saúde, políticas industriais e realização de grandes eventos esportivos. Via de regra, esses projetos são implementados, o tempo passa, um novo governo assume o poder, os projetos antigos são esquecidos e novos programas são anunciados com alarde. Enquanto isto, as famílias pobres, os professores da rede pública, os criminosos, doentes e empresários tentam compreender e se adaptar a cada nova medida, o que gera insegurança. Será que não há uma maneira melhor de desenhar e implementar políticas públicas em todos os níveis? No último dia 05 de setembro, o Insper promoveu seu primeiro Fórum de Políticas Públicas, trazendo convidados internacionais e especialistas nacionais que debateram as evidências científicas disponíveis em algumas áreas do conhecimento para ajudar a formular políticas públicas mais eficientes. O Fórum tratou de três temas muito relevantes para a atual conjuntura brasileira: educação, criminalidade e política fiscal em tempos de crise. No caso da educação, as evidências estão mostrando cada vez mais a importância das políticas públicas focadas no desenvolvimento infantil, ou seja, nos primeiros anos de vida da criança. É nesse período que são desenvolvidas as capacidades que permitirão à criança absorver os conteúdos que lhe serão transmitidos mais tarde pelos seus professores. Crianças que convivem com situações de estresse econômico ou emocional nos seus primeiros anos de vida terão problemas cada vez maiores no futuro. As que vivem em famílias desestruturadas, com adultos que pouco conversam, em que inexistem livros, predominam as discussões e até episódios de violência, tornar-se-ão inseguras, impacientes e nervosas, o que fará com que tenham muita dificuldade para ler, sentar na sala de aula, ouvir o professor a aprender novos conteúdos. Assim, logo nos primeiros anos da escola essas crianças ficarão defasadas com relação aos seus colegas, o que só reforçará sua falta de confiança e estímulo para aprender. Assim, é necessário enfatizar políticas educacionais que estimulem as crianças nos seus primeiros anos de vida, através de atividades esportivas e educativas, reforçando e valorizando a disciplina, auto-confiança e concentração, e protegendo-as de situações de estresse. As evidências científicas mais recentes mostram também que essas habilidades não cognitivas (motivação, perseverança, etc.) são muito importantes para o desempenho futuro na escola e no mercado de…
Faxinas não bastam
Imagens fáceis parecem ignorar a complexidade das circunstâncias: ora tudo se resume a “faxinas” no condomínio lulista, ora é o “marketing” voltado à classe média, ansiosa de moral e salivante de sangue dos políticos. Como se tudo se resumisse à disposição pessoal da presidente Dilma — ora “diarista justiceira”, ora obcecada por popularidade – as explicações têm a profundidade de uma moeda. Mas, nada é tão simples assim. Os conflitos em torno do governo são muito mais profundos: na verdade, se o analista se dispuser a juntar fragmentos e raciocinar como quem busca montar um quebra-cabeça de fatos, interesses e intenções, logo perceberá que há uma lógica sistêmica nos escândalos quase cotidianos despertados desde a desgraça do ex-ministro Antônio Palocci. Se Palocci caiu foi porque não reunia mais condições para ficar de pé. Mas seu expurgo foi efeito, não razão da crise. No desenho montado na construção do governo, o ex-ministro administraria os conflitos do governismo, tentaria evitar o colapso do bloco de poder construído por Lula, em 8 anos de governo. Missão impossível, diante da evolução dos fatos e das circunstâncias. O que assistimos — e que muitos reagem com assombro e indignação — não é matéria para análise conjuntural e nem para comentários rápidos. Certamente, não será este artigo que dará conta de sua complexidade; requer debate e discussão e o teste de validade de hipóteses e premissas. Mas, o fato é que o sistema político passa por uma grave e complexa crise estrutural: um modelo de governabilidade que colapsa e um sistema de poder, heterogêneo e contraditório, que perde unidade. Polianas defendem a qualidade (sic) do “presidencialismo de coalizão” nacional. Apontam o inegável progresso das últimas três décadas, mas não admitem que o modelo prende-se ao rosário do “é dando que se recebe”. Se já foi inevitável pagar seu preço, hoje, quando pequenas mudanças já não significam grandes transformações e o país encontra evidentes limites fiscais e de transparência, esta forma franciscana de conciliação política já não parece possível. O poder compartilhado entre Executivo e Legislativo reside na divisão de espaços, recursos e esquemas. O governo não compõe, compra. No princípio, os acordos eram duradouros e o apetite, de algum modo, moderado. Mas, “como já dizia [Jorge Benjor] Galileu da Galiléia, malandro que é malandro não bobeia”: os acordos tornaram-se efêmeros, a fome descambou em gula: uma voracidade de glutões. Individualmente, partidos e parlamentares passaram a exigir mais a cada votação: toda “enxadada” (projeto) tem, por obrigação, que resultar numa “minhoca” (recursos, espaços). Num processo com alternância de poder, débitos e créditos são zerados a cada eleição. O novo presidente desaloja antigos adversários, negocia novos aliados e…
Vale a pena cursar o ensino técnico?
Segundo os últimos dados disponíveis, há mais de 8 milhões de alunos cursando o ensino médio regular no Brasil. Dentre esses alunos, 175 mil (2% do total) estão em escolas em que o ensino profissional (técnico) é integrado ao ensino médio tradicional. Para além deles, há 860 mil alunos que estão tendo algum tipo de educação profissional, que pode ser concomitante ao ensino médio tradicional (35% deles) ou subsequente a ele. Assim, há hoje em dia cerca de 1 milhão de alunos matriculados em cursos de educação profissional no Brasil. As escolas privadas são responsáveis por metade dessas matrículas, as estaduais por 35% e as federais por 15%. A grande maioria das escolas privadas oferece cursos profissionais subsequentes ao ensino médio tradicional, para complementar a formação do aluno. Recentemente o governo federal lançou o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) com o objetivo de expandir o número de escolas técnicas federais em todo o país. Além disso, o governo está repassando recursos para que os estados expandam suas redes de educação profissional. Nesse contexto, o governo de São Paulo acaba de anunciar o Programa Rede Ensino Médio Técnico, que estabelecerá convênios com escolas particulares e unidades do Centro Paula Souza e do Instituto Federal de São Paulo para que alunos da rede pública estadual possam complementar sua educação formal com um ensino técnico ou profissional. Será que essas iniciativas estão indo na direção correta? Será que o jovem que conclui um curso técnico de nível médio tem uma remuneração maior no mercado de trabalho do que aquele que cursou somente o ensino médio tradicional? Os números indicam que sim. Um estudo concluído recentemente pela Fundação Itaú Social fez uma avaliação econômica muito interessante do ensino médio técnico ou profissional. Utilizando dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios (PNAD) do IBGE, o estudo mostra que os jovens que frequentaram cursos de ensino médio técnico ganham cerca de 12% a mais do que os que cursaram apenas o tradicional, mesmo após levarmos em conta outras características que diferenciam esses jovens. Quando consideramos apenas os alunos que ingressaram no mercado de trabalho diretamente após o ensino profissional (60% da amostra), o diferencial médio de salários chegou a 20%. Porém, quando consideramos aqueles que concluíram o ensino superior após o médio, o impacto do ensino técnico é negativo em 6%. Isto significa que o ensino profissional é muito mais eficaz em aumentar os salários dos jovens que estão interessados em atingir ocupações de nível médio no mercado de trabalho. Alunos que almejam fazer uma faculdade antes de começar a trabalhar não são (em média) beneficiados pelo ensino técnico. Dentre…
Divórcio no Brasil
Decisão de divórcio está diretamente relacionada aos ganhos e perdas econômicas, aponta estudo do Insper Estudo do Insper, elaborado a partir de dados coletados do Censo do IBGE de 1991, mapeou as características individuais da população brasileira que aumentam ou reduzem a propensão do individuo ao divórcio. Os resultados mostram que, além da expectativa de satisfação ou felicidade com relação ao futuro da união matrimonial, a decisão de divórcio está diretamente relacionada aos ganhos e perdas econômicas. O levantamento mostra ainda que para os homens a decisão da separação é baseada em fatores externos ao casamento e nas características da sua parceira. Já para a mulher, as características individuais têm um impacto maior quando ela opta pelo divórcio. Para Regina Madalozzo e Julio Monte, pesquisadores responsáveis pelo estudo, entender o que leva os indivíduos a se unirem e a se separarem é essencial para que a sociedade brasileira possa se preparar para enfrentar os efeitos econômicos e sociais resultantes do divórcio. “O crescente número de divórcios e separações e as profundas mudanças sociais e conceituais nos valores das famílias impactam diretamente no bem estar e na satisfação do individuo e da sociedade como um todo. Diversas pesquisas mostram que aumento do fim dos matrimônios alavanca muitos problemas sociais como a criminalidade, a queda do desempenho acadêmico, a queda da produtividade, a instabilidade emocional entre outros”, explica Regina. No levantamento foram considerados fatores como renda, idade, raça, religião, escolaridade, moradia. Os resultados mostram, por exemplo, que a probabilidade de divórcio diminui a medida em de aumenta a idade ao contrair a primeira união, que as diferenças raças possuem probabilidades de divórcio diferentes devido às condições culturais e sociais distintas. Mostra também que indivíduos que não possuem nenhum tipo de religião se separam mais e que, quanto maior a escolaridade, maior a probabilidade de divórcio. A localização da moradia também influencia, sendo que aqueles que habitam nas zonas rurais são menos propensos ao divórcio. Para o estudo, foram consideradas as pessoas com idades entra 35 e 55 anos, uma vez que o número de casamentos com maior duração sofre uma queda considerável ao incluirmos pessoas mais jovens que ainda não foram expostas a períodos mais longos de casamento. O estudo mostra que a idade ao casar do individuo divorciado é 6,17% menor do que aquele que continua casado. Ou seja, quanto mais jovem, maior a chance de divórcio, como já comprovaram outros estudos sobre o tema. Quando separados por gênero, a mulher divorciada permanece com esse estado civil por um período 35,14% maior que o dos homens, o que pode ser atribuído ao fato de que ela fica com a guarda do…
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