O blockchain, ou cadeia de blocos, tem movimentado o mercado nos últimos anos e já é considerado uma das grandes invenções do século XXI, sendo comparado ao lançamento dos computadores para uso pessoal e da internet nos anos 1990. O seu potencial de uso e revolução nas transações é tão expressivo, que foi listado pela Gartner, consultoria líder mundial em pesquisa e aconselhamento em tecnologia, como uma das dez principais tendências tecnológicas para 2018. Outros estudos da consultoria apontam que o valor de negócios agregados pelo blockchain chegará a mais de US$ 176 bilhões em 2025 e ultrapassará os US$ 3,1 trilhões até 2030.
A cadeia de blocos é uma estrutura tecnológica que atua no sistema de registros. A validação das informações é realizada em etapas, pelos blocos, e seu controle é descentralizado, uma vez que fica dividido em vários computadores pelo mundo. Isto torna o sistema mais seguro e menos propenso a ataques cibernéticos. Trocando em miúdos, é uma nova forma de banco de dados, que vem atender a nova dinâmica criada nas transações na era digital.
Para reforçar esse potencial, um estudo do World Economic Forum estima que, até 2027, 10% do PIB global já estará em blockchain. A estrutura nasceu junto com os bitcoins, uma moeda virtual criada em 2009, que atua como dinheiro, só que válido apenas no mundo on-line.
Também não tem sua emissão controlada pelo Banco Central de nenhum país, é produzido por diversos computadores ao redor do mundo e tem como principal objetivo simplificar os pagamentos no meio virtual, dispensando a necessidade de intermediários, como bancos ou instituições financeiras.
Muito mais que moeda digital
“Blockchain pode ser estendida para outras inúmeras aplicações e estruturas que não são moedas digitais. O triple de estruturação (da cadeia de blocos) é uma estrutura descentralizada, de validação e de consenso”, explica Alan de Genaro, managing partner na Riscométrica, uma boutique de consultoria em Modelos de Risco e Finanças, e professor do Departamento de Economia da FEA/USP, em sua apresentação no seminário “Blockchain e disrupturas potenciais”, organizado pelo Centro de Finanças do Insper, no dia 16 de novembro.
O modelo se destaca por reunir em um único sistema a solução para cinco grandes problemas atuais:
– confiança, pois as informações validadas pelos blocos não podem ser mudadas, reduzindo o risco de fraude;
– desburocratização, com redução de custos e ganho de agilidade;
– descentralização, as informações ficam distribuídas em diversos computadores, diminuindo fraudes e ciberataques;
– segurança, com a utilização de criptografia e outros recursos tecnológicos para garantir a confidencialidade das informações;
– transparência, já que permite que as transações sejam rastreadas e o histórico consultado.
Esses avanços estão mudando a forma de se pensar as transações, tanto de ativos quanto de informações. De olho neste potencial, especialistas de diversos setores do mundo todo estão estudando e projetando novos usos para a tecnologia. No entanto, é preciso se pensar também uma legislação para isso, uma vez que o que há hoje não está adequado para essa mudança tecnológica onde as fronteiras físicas já não mais existem.
“Em relação à regulamentação jurídica, muda absolutamente tudo. Não sei nem se o que a gente tem hoje de sistema civil se aplicaria. Como isso vai funcionar na prática precisa ser pensado”, destaca Rodrigo de Campos Vieira, especialista jurídico e sócio da área de Mercado de Capitais e Regulação Bancária da Tozzini Freire Advogados em sua fala no mesmo seminário do Insper.
A discussão está mais avançada em outros países, como a Suécia, que usa o sistema para transações imobiliárias, o que não seria possível ainda no Brasil, devido a sua estruturação jurídica.
Esses novos usos para a tecnologia do blockchain podem impactar governos, instituições financeiras e empresas dos mais diversos setores. Sendo assim, é necessário que a legislação acompanhe essa revolução, antes de a ferramenta ser utilizada em escala global.
Na prática
Muitas empresas já estão testando a tecnologia, principalmente aquelas que precisam de registros ou certificações para seus processos. Entre os usos já conhecidos fora do mercado financeiro destacam-se a área de gerenciamento da cadeia de suprimentos, rastreamento de ciclo de vida do produto de forma segura, registro de propriedades de terras, contratos digitais inteligentes, de patentes, de créditos de carbono, além de históricos e diplomas por universidades.
Outra aplicação permitida pelo blockchain são os contratos inteligentes, ou os chamados contratos autoexecutáveis, que são regidos apenas por códigos. Permitem que pessoas acordem entre si transações de bens e valores associados à cadeia de blocos. E seriam automaticamente executadas assim que as condições contratuais estabelecidas fossem cumpridas.
Isso faz com que surja uma nova dinâmica nas transações, que dispensa a necessidade de confiança, no sistema jurídico ou na outra parte, para relações contratuais. Os contratos inteligentes serão utilizados em mais de 25% das organizações globais até 2022, segundo o Gartner.
“Essa revolução tecnológica deve ser chamada no futuro de revolução da confiança. Como não se tem mais o papel de um validador, com a troca de valores de uma pessoa para a outra sem ter que passar por um intermediário, o mundo fica descentralizado. Assim, pode-se tirar as burocracias dos processos, em um mundo mais simplificado, e com mais inclusão”, conclui Vieira.