Área alagada na região do Cebolão, na zona oeste de São Paulo
A cidade de São Paulo gasta, em média, cerca de metade do que é planejado no Orçamento para combater enchentes como as que a castigaram no início deste ano. De 2009 a 2019, as despesas efetuadas com ações para reduzir as cheias atingiram em média 48% do projeto aprovado.
Nesse período, ficaram no papel projetos de canalização de córregos, planos de elaboração de projetos de ampliação de redes de galerias de águas pluviais e obras de contenção de muros, conforme dados da prestação de contas do Orçamento paulistano.
Todos esses dados estão disponíveis para consulta no site da prefeitura e revelam o que as gestões têm priorizado nos últimos anos.
“Às vezes, a sociedade civil pressiona na Câmara para que a prefeitura se comprometa com um investimento, mas não acompanha as escolhas orçamentárias feitas a partir daí”, afirma Mariana Almeida, professora do curso de planejamento e acompanhamento de orçamento público no Insper.
Mesmo aprovada, a previsão orçamentária deve ser considerada somente como um ponto de partida. “Muitas escolhas serão feitas no dia a dia e determinam se um investimento vai mesmo sair ou não. E, quando o caminho parece indicar que a escolha foi por não fazê-lo, isso pode ser observado por meio do acompanhamento dos dados públicos”, acrescenta a professora.
Essa informações constam do Orçamento municipal, que reúne as estimativas de receitas, a exemplo da arrecadação com impostos, e de despesas, como o pagamento de salários de servidores e da execução de obras. O projeto é definido todo ano pelo Executivo em conversas com a Câmara e sua execução é atualizada no site da prefeitura.
Execução significa pôr em prática o que foi discutido e, consequentemente, gastar o dinheiro. Porém, antes de decidir se vai desembolsá-lo ou não, a prefeitura avalia os recursos que terá. Além disso, parte do Orçamento já nasce com fatias comprometidas com despesas obrigatórias, como os gastos mínimos com saúde e educação e o pagamento de salários para funcionários que prestam o serviço no dia a dia, de aposentadorias e de precatórios
“O Executivo acompanha esse cenário para determinar quanto deve liberar das despesas não-obrigatórias. E boa parte dos investimentos acaba ficando no final dessa fila”, diz Mariana.
No caso das medidas de combate a enchentes na cidade de São Paulo, por exemplo, raros são os anos da última década em que a execução de investimento se aproximou do valor total orçado.

Ponto de alagamento na avenida Marquês de São Vicente, na zona oeste paulistana
“Como o modelo orçamentário brasileiro é autorizativo, e não impositivo, é legítimo que a taxa fique abaixo de 100%, o que reflete a avaliação de risco fiscal que é feita ao longo do ano”, acrescenta Mariana.
Essa característica, entretanto, não exclui a necessidade de avanços para construir modelos de previsão que resultem em orçamentos “mais realistas”. Para elaborá-los, um caminho possível seria a adoção de metodologias de planejamento que aproximem escolhas públicas da realidade das pessoas. Cidades como Montreal, Paris, Madri e Londres contam com iniciativas que incoporaram técnicas de distribuição mais racional para a resolução de problemas.
“Mas se a sociedade não fizer a sua parte, compreendendo a linguagem e os ritos orçamentários para acompanhar as decisões que são tomadas pelo poder público ao longo do ano, dificilmente uma metodologia inovadora desse tipo irá surgir”, afirma Mariana. “Só assim as escolhas irão acontecer segundo as prioridades sociais e as inovações poderão surgir.”
Como acessar os dados
As informações sobre o Orçamento municipal de São Paulo são disponibilizadas pela prefeitura no site dela. Em cada previsão de despesa, há uma breve descrição a respeito do que se trata, a secretaria à qual está atrelada e possível fonte de recursos.
Outros governos, como o paulista e o federal, também as divulgam. As do estado de São Paulo podem ser acessadas no site da Secretaria da Fazenda e Planejamento, que apresenta relatórios resumidos da execução orçamentária. As da União ficam no painel do Orçamento federal, do Ministério da Economia, Planejamento, Desenvolvimento e Gestão.
No site da Secretaria do Tesouro Nacional ou no do Tesouro Transparente é possível acompanhar os principais relatórios sobre o Orçamento da União. Já no Siconfi (Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro) há a execução orçamentária de anos anteriores de todos os estados e municípios.